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Balneário Camboriú
Dalton Delfini Maziero
Dalton Delfini Maziero
Historiador, escritor, especialista em arqueologia e explorador. Pesquisador das culturas pré-colombianas e história da pirataria marítima.
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A GRANDE MURALHA DE LA CUMBRE

Existem algumas muralhas famosas, mundo afora, que entraram para história como divisores de civilizações. Podemos citar, como exemplos, a Grande Muralha da China, com mais de 21 mil quilômetros, construída em parte pelo imperador Qin Shi Huang entre 220 e 206 aC, para impedir o avanço de povos bárbaros como os Mongóis, mas também como forma de controlar os tributos imperiais; a Muralha de Adriano, com 118 quilômetros, construída pelos romanos entre 122 e 126 d.C. na atual Escócia, para protegê-los dos avanços de tribos bárbara como Pictos e Caledônios; e o mais recente Muro de Berlim, com 66 quilômetros de extensão, construído em 1961 para separar a Berlim capitalista da socialista. 

Contudo, uma antiga muralha na América do Sul (norte do Peru), pertencente aos antigos povos pré-colombianos, é quase desconhecida de todos nós. Seu nome: a Muralha La Cumbre. Da mesma forma que muitas das antigas muralhas erguidas em outras partes do mundo, pensou-se inicialmente que esta também tratou de impedir uma invasão de um determinado povo sobre o outro. 

Erguida em pleno deserto, esta construção se estende por 10 quilômetros de extensão e possui uma altura média de 2,5 metros, com sua base ligeiramente mais espessa e, muitas vezes, revestida por pedras. Escavações arqueológicas indicam sua construção em etapas, entre os séculos XII e XV, pertencente ao povo Chimú. Como eles participaram de constantes guerras territoriais com os Incas, acreditou-se por muito tempo que a muralha fosse uma forma de conter as investidas incaicas.

O povo Chimú ocupou toda faixa litorânea do norte peruano entre os séculos X e XV, criando uma civilização extremamente sofisticada, herdando traços de seus antecessores Mochicas, e tornando-se hábeis arquitetos, metalúrgicos, ceramistas e artesãos. Sua capital, Chan Chan (Patrimônio Cultural da Antiguidade pela UNESCO), é considerada ainda hoje uma das maiores cidades de barro (adobe) do mundo, com cerca de 15km² e 50 mil habitantes divididos em diversas cidadelas.

Recentes pesquisas, contudo, apontam para uma nova função da muralha La Cumbre. O arqueólogo peruano Gabriel Prieto Bulméster (Projeto Arqueológico de Huanchaco/Universidade da Flórida) acredita que a muralha foi criada como parte de uma longa observação e experiência climática com relação aos efeitos provocados pelo fenômeno El Niño. Ela, na verdade, foi erguida para conter inundações catastróficas que assolavam as antigas civilizações pré-colombianas entre 1100 e 1450 d.C. Parte de suas pesquisas apontam a descoberta de camadas de sedimento oriundas de inundações apenas de um lado da muralha, como uma contenção. A datação destes sedimentos coincide com rituais de sacrifícios envolvendo dezenas de crianças, lhamas e guerreiros, descobertos em 2019. Foi possível determinar a ocorrência de doze camadas de sedimentos distintos, ou seja, doze eventos climáticos de alta magnitude.

A contenção das chuvas causadas pelo El Niño tinha, como objetivo principal, preservar as terras agrícolas e os elaborados canais que traziam água para a cidade de Chan Chan e arredores desérticos. Ou seja, a construção podia funcionar como uma barragem artificial.

Ainda hoje, os efeitos do El Niño alteram as condições climáticas do mundo todo, em especial da América do Sul. Da mesma forma que os Chimús, outros povos como Paracas, Nasca, Mochicas e Lima também desenvolveram seus métodos para prever e conter os impactos climáticos. A muralha La Cumbre torna-se, assim, mais um testemunho de como os pré-colombianos estudavam e manejavam o meio ambiente que os cercava.

Dalton Delfini Maziero é historiador, escritor, especialista em arqueologia e explorador. Pesquisador dos povos pré-colombianos e história da pirataria marítima. Visite a Página do Escritor (https://clubedeautores.com.br/livros/autores/dalton-delfini-maziero)
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