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Balneário Camboriú
Dalton Delfini Maziero
Dalton Delfini Maziero
Historiador, escritor, especialista em arqueologia e explorador. Pesquisador das culturas pré-colombianas e história da pirataria marítima.
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OS MONÓLITOS DO LAGO TITICACA

Quando contornei a pé o Lago Titicaca num percurso de 1300 km em busca de vestígios arqueológicos, já tinha relacionado uma série de sítios antigos obrigatórios para meu estudo. Tiwanaku, Pucara, Sillustani, Chiripa e Iskanwaya eram alguns destes lugares enigmáticos que qualquer pesquisador inclui em um roteiro regional nos altiplanos do Titicaca, situado na fronteira entre Peru e Bolívia à 4 mil metros de altitude.

Contudo, a complexibilidade cultural da região surpreende os exploradores com um número incontável de vestígios que se espalham pelas montanhas, vales, vulcões, ilhas e alagadiços. Em especial, os chamados Monólitos, esculturas feitas em um único bloco de pedra, com representações de entidades estilizadas. São como “agulhas” saindo da terra. Alguns tombados, outros inclinados ou quebrados, que mexem com a imaginação de quem os contempla.

Consultando os relatos de antigos exploradores e viajantes, temos a certeza que eles figuravam às centenas – talvez milhares – ao redor de todo o Titicaca. Esta arte lítica tão tradicional dos antigos povos pré-colombianos ainda não foi devidamente estudada. Podemos nos perguntar se elas serviam para identificar uma comunidade, uma família; ou talvez reverenciar um antepassado importante. Seriam essas rochas esculpidas, objetos de adoração? Fariam os antigos nativos, oferendas sofisticadas aos seus pés?

Em minha longa trajetória a pé, a primeira localidade que me chamou a atenção sobre os monólitos foi o povoado de Taraco. Os aymaras me informaram que muitas estátuas são encontradas durante o processo de aragem dos campos, e que muitas peças são vendidas aos turistas que passam pela região. As estátuas vão desde 50 cm até 7 metros de comprimento, segundo os mesmos. Diante da depredação que ocorria a décadas, as autoridades fundaram o Museo Lítico de Taraco, onde reuniram diversas estátuas que estavam espalhadas por praças e nas imediações da cidade. Muitas das imagens representam pessoas em atitude de saudação, peixes, cobras, lagartos, rãs e imagens abstratas.

Na margem norte do Titicaca, os aymaras me indicaram também a Península de Huata, próxima ao povoado de Conima. O lugar provavelmente foi, no passado, um espaço de peregrinação. Os aymaras me disseram que existiam ali dezenas de monólitos espalhados pela península, dentro de espaços cercados em pedra. Também me aconselharam a levar folhas de coca e algo mais para fazer um “pago” às entidades de Huata, que poderiam não gostar de me ver caminhando por lá sozinho. Eu fiz o pago – conforme orientação dos aymaras – às duas únicas estátuas que encontrei em meio ao mato. Não eram grandes, cerca de meio metro cada. Uma representando uma pessoa e outra que parecia uma colunata retangular. 

Contudo, de todos os locais que observei estas singulares estátuas, sem dúvida as existentes nas proximidades de Yunguio e do vulcão Khapía são as em maior quantidade e bastante impressionantes. Quando cheguei no povoado, os funcionários da Prefeitura me indicaram falar com o Srº Julio Torres, que era o historiador oficial da cidade e quem conhecia os vestígios arqueológicos da região, graças ao seu instinto de investigador. A felicidade em ver um gringo interessado na arqueologia regional o levou a me convencer a realizarmos uma caminhada no dia seguinte, partindo às 4hs00 da madrugada em direção ao topo do vulcão Khapía. Ele tinha uma teoria que havia uma pedreira pré-colombiana de onde o povo Tiwanaku retirada suas pedras para o famoso centro urbano de mesmo nome, que floresceu entre 500 e 1000 d.C. Além do Khapía, caminhamos também pela Municipalidad de Unicachi e Kaninsaya, onde existiam inúmeros monólitos espalhados pela paisagem.

Um dos mais significativos é o monólito Pajana San Isidro, também conhecido como Mohocachi. Esta estátua representa um homem com as mãos cruzadas no peito. Ela tem cerca de 1,5 metro e imagens da cultura Chiripa em seu corpo, como o desenho de um sol. Infelizmente parte de sua cabeça está quebrada. Este monumento resiste bravamente ao tempo e a depredação causada por viajantes mal intencionados. Também em Kaninsaya, uma outra estátua se destaca na paisagem. Com 4 metros de altura, esta agulha de pedra inclinada ainda sobrevive aos terremotos. Chamado monólito Jurana, esta estátua já esteve coberta de desenhos, mas hoje apenas uma serpente ziguezagueando sua lateral é visível. Ele foi encontrado pelo dono do terreno durante uma plantação e erguido por ele. Segundo uma tradição aymara, os monólitos do Titicaca existiam em pares, masculinos e femininos. Infelizmente, poucos pares podem ser vistos hoje; e na verdade é até surpreendente que estes exemplares tenham sobrevivido a tanta depredação, que começou com a presença dos exploradores espanhóis no século XVI.

É verdade que muitas destas singulares estátuas ainda se encontram à céu aberto, mas também é certo que um número muito grande delas ainda está debaixo da terra, aguardando serem desenterradas e descobertas. Desta forma, iniciativas como os Museus Líticos que podem ser encontrados em Taraco e Pucara são fundamentais para a preservação e estudo desta particularidade arqueológica do Lago Titicaca. 

Dalton Delfini Maziero é historiador, escritor, especialista em arqueologia e explorador. Pesquisador dos povos pré-colombianos e história da pirataria marítima. Visite a Página do Escritor.
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