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Enéas Athanázio
Enéas Athanázio
Promotor de Justiça (aposentado), advogado e escritor. Tem 60 livros publicados em variados gêneros literários. É detentor de vários prêmios e pertence a diversas entidades culturais. Assina colunas no Jornal Página 3, na revista Blumenau em Cadernos e no site Coojornal - Revista Rio Total.
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As investigações do velho Leite

Embora pouco conhecido, o escritor Luiz Lopes Coelho (1911/1975) foi o pioneiro da literatura policial no Brasil. Paulista, chefe de um próspero escritório de advocacia, reconhecido “gourmet” e apreciador de vinhos, cultivava a boemia e uma permanente alegria de viver, tanto que conquistou grande círculo de amigos, desde figuras do cenário político, como escritores, poetas e até porteiros e garçons dos bares que frequentava. Exerceu vários cargos, sempre na área cultural, mas jamais ocupou qualquer função pública. Sou um bacharel que precisa trabalhar para que o escritor produza – dizia ele. Contrariando a opinião generalizada dos críticos que afirmavam ser impossível a ficção policial em países subdesenvolvidos, tratou de criar personagens, inventar histórias e escrever novelas que logo conquistaram os leitores. Quando o comparavam a Agatha Christie, dizia, entre risos, que não ficava bem. Preferia, isso sim, ser considerado o Georges Simenon Nativo. Ao falecer, deixou três livros publicados, todos contendo contos do gênero policial. Rubem Braga, seu grande amigo, dizia que os livros de Lopes Coelho “eram bons de ler, mas o melhor não era o escrito, era o falado. Era um homem de uma graça, de uma inteligência e de uma generosidade extraordinárias.”

Para comemorar o centenário de nascimento do escritor, a Confraria dos Bibliófilos do Brasil (CBB), com sede em Brasília, publicou uma coletânea de contos escolhidos de sua autoria. Em tamanho grande e refinada elaboração, com sobrecapa e ilustrações, o livro recebeu o título de “Crime mais que perfeito e outros contos de Luiz Lopes Coelho”, integrado às já conhecidas Edições da Confraria. O prefácio é de autoria de Isabel Lopes Coelho, filha do autor, e as ilustrações especiais foram executadas por Mozart Couto, artista plástico de renome e portador de notável currículo. Além do conto-título, a coletânea traz ainda “Um candelabro apaga uma vida”, “A morte no envelope”, “Ninguém morre duas vezes”, “O homem que matava quadros”, “Não pôde o mais fez o menos”, “A ideia de matar Tia Belina” e “E o delegado assassinou o assunto.” Alguns desses contos são por demais conhecidos e os apreciadores do gênero com certeza os leram.

 Lopes Coelho escrevia bem e foi muito criativo. Suas histórias são sempre cheias de suspense e aguçam a curiosidade do leitor. Seu mais importante personagem, presente em todos os contos deste livro, é o delegado Leite, titular da Delegacia de Homicídios, e que o autor designa como “o velho Leite.” Parece-me, no entanto, que não fosse assim tão velho, uma vez que estava sempre com uma amiga e revelava admirável condição física. Creio que o termo velho fosse usado num sentido afetivo, aquele que muitas vezes se consolida entre o criador e sua criatura. Mas o delegado-investigador, a par de aguda inteligência, possui um faro policial incomum e dos mínimos indícios extrai conclusões sempre acertadas. E nisso lembra muito o Maigret, de Simenon, que tantas vezes parece mais adivinhar que descobrir, guiado em diferentes ocasiões apenas pela intuição. Senhor de vastos conhecimentos na área criminalística e de grande experiência profissional, o velho Leite desvenda os mistérios com tranquilidade e calma, sem grandes afobações. Prefere, às vezes, aplicar no infrator uma severa lição de moral que levá-lo à cadeia, talvez prevendo que logo ele voltará às ruas, como é de praxe no Brasil. Em outra ocasião, para generalizada surpresa, deixa de investigar uma situação suspeita e repleta de curiosas coincidências, cujo resultado por certo o levaria a desvendar mais um crime. Depois de trocar ideias com sua Marília e de examinar os fatos em todos as minúcias, enquanto se embala numa rede, parece ceder aos reclamos da mulher de que sempre a deixava sozinha, e assim conclui o último conto, que é também a última página do livro: “Está bem, Marília de Dirceu, está bem. Mas, se qualquer dia tiver uma folga, vou ver isso de perto. Agora, desisto.”

E o delegado assassinou o assunto.   (Contatos com a CBB: Caixa Postal 8 6 3 1 – CEP 70302-970 – DF).

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