- Publicidade -
27.5 C
Balneário Camboriú
Enéas Athanázio
Enéas Athanázio
Promotor de Justiça (aposentado), advogado e escritor. Tem 60 livros publicados em variados gêneros literários. É detentor de vários prêmios e pertence a diversas entidades culturais. Assina colunas no Jornal Página 3, na revista Blumenau em Cadernos e no site Coojornal - Revista Rio Total.
- Publicidade -
- Publicidade -

AS SURPRESAS DE PEDRO ROGÉRIO

O escritor mineiro Pedro Rogério Couto Moreira é sempre surpreendente na publicação de suas obras. Fruto de sua imensa criatividade, cada livro que dá a público aborda um tema novo e inesperado, fato que explica, em parte, o seu sucesso. Tive ocasião de comentar nesta coluna algumas de suas obras cuja leitura me proporcionou momentos de agradável convívio com a boa literatura.

Em seu mais recente trabalho, que acabo de receber e ler com interesse, ele desvenda um bocado da vida e da obra de Eduardo Frieiro, escritor mineiro famoso e autor de obras inesquecíveis que muito enriquecem as letras nacionais. Trata-se de “Eduardo Frieiro – _Pelo buraco da fechadura”, publicado como separata da Revista da Academia Mineira de Letras, embora seja bastante volumoso (Thesaurus Editora – 2022). Para minha surpresa, o volume me é dedicado, entre outras pessoas, o que muito me honra.

Autor de diários, que alguém rotulou de servidão cotidiana, Frieiro confessou ter destruído os cadernos com a primeira versão de suas anotações, atitude deveras lamentável porque se perdeu curioso depoimento sobre uma fase da vida em Belo Horizonte e no Brasil feito por um homem inteligente e perspicaz. Ainda bem que, mais tarde, ele retomou o hábito das notas em um “Novo Diário” de que se valeu Pedro Rogério para embasar este novo trabalho. Como o autor alerta, penetrou apenas um pouco do que nele se contém, assim como quem espia pelo buraco da fechadura a intimidade de alguém. No entanto, aquilo que ele captou já é mais que suficiente para revelar um homem antenado nas coisas de seu tempo, em especial na vida literária e política, e de língua afiada, além de sincero nos seus julgamentos,   

Frieiro não perdoava os vaidosos e exibicionistas. Muitos escritores, políticos e pessoas de outras áreas mereceram suas críticas, quase sempre irônicas e bem-humoradas e, às vezes, impiedosas. Ele não poupava nem a si próprio e em diversas oportunidades se submetia a uma espécie de autojulgamento. Por outro lado, cultivava o silêncio e falava pouco no convívio com outras pessoas e até nas reuniões da Academia Mineira de Letras, à qual pertencia. Mesmo em momentos em que se esperava sua manifestação ele permanecia em silêncio. Como profissionais da palavra, escritores em geral são dados a expor o verbo, inclusive em ocasiões nada oportunas. É interessante notar que Pedro Rogério enriqueceu as informações sobre as pessoas referidas por Frieiro, anotando dados sobre suas atividades, profissões, obras e tudo mais. Trabalho minucioso e exaustivo, mas importante para o leitor.

Dentre os autores comentados nos Diários estão Godofredo Rangel e Monteiro Lobato. Eis o que escreveu Pedro Rogério: “7 de agosto de 1943 – Frieiro comenta a tradução do inglês, da História da Filosofia, de Will Durant. Desanca os dois tradutores, Godofredo Rangel, que um ano depois seria seu colega na Academia Mineira de Letras, e o admirado paulista Monteiro Lobato: “Rangel tem nome de tradutor consciencioso. Mas o trabalho feito por grosso, como é forçosamente o dele, não pode sair grande coisa. É apenas passável. O de Lobato, nem isso. É um galicista tremendo.”

Acrescenta o autor: “Godofredo Rangel (1884/1951) foi promotor de Justiça, juiz de Direito, tradutor e escritor (Vida Ociosa, aplaudido nacionalmente, e outros livros). Era o mais íntimo amigo de Monteiro Lobato, que publicou a correspondência dos dois no livro A Barca de Gleyre.”

Rangel complementava os ganhos da magistratura com as traduções. Informa Camila Russo, em tese recente, que traduziu quase 100 livros, o que, segundo os críticos, teria prejudicado sua obra de criação. Isso pode ter acontecido quanto à quantidade, mas jamais quanto à qualidade, porque Rangel era meticuloso na confecção de suas obras.

Quanto ao galicismo de Lobato, é possível. Na época a influência da França era imensa no país e muitos até a consideravam a segunda pátria. Lobato tinha veneração por Camilo Castelo Branco, autor português que lia e relia, comentando nas cartas a Rangel. Há quem encontre a influência dele nos escritos lobatianos. O trabalho de Pedro Rogério é delicioso. Revela muito do meio literário e de seus bastidores.

- Publicidade -
- Publicidade -
- Publicidade -
- Publicidade -