Dizia Érico Veríssimo que a mestra vida é capaz de engendrar situações que superam a mais descabelada das ficções. E o povo, na sua inata sabedoria, afirma que a pessoa morre e não vê tudo. Pois eu já vivi bem mais do que esperava e continuo me espantando com certas coisas que acontecem e que sou forçado a testemunhar, muitas vezes contra a vontade.
Lá nos Estados Unidos, por inacreditável que seja, o trêfego Donald Trump ensaiou um golpe de estado para não deixar o poder, erguendo a sempre esfarrapada bandeira dos perdedores de que houve fraude nas eleições. Incentivou seus seguidores a invadirem o Congresso para impedir a confirmação do resultado da votação. Houve muita confusão, pancadaria, prisões e feridos. Muitos processos tramitam na Justiça e o golpe fracassou. Trump não tinha experiência no métier e esqueceu de algo essencial: consultar os golpistas sul-americanos, inclusive brasileiros, que são inimigos das franquias democráticas e exímios em desferir golpes contra as instituições. Para sorte nossa e do mundo esse esquecimento foi fatal.
Aqui entre nós ocorreu algo ainda mais incrível que não sei se foi surreal ou fantástico. Cerca de oitocentos índios, armados de arcos e flechas, tentaram invadir as dependências da Câmara dos Deputados e impedir que uma comissão apreciasse um projeto de lei que eles consideram prejudicial aos seus interesses. Também houve muita confusão, correria, confronto com a segurança e feridos por … flechadas! Como no caso de Trump, faltou experiência aos indígenas. Jovens na maioria, não viram os faroestes americanos, em especial os estrelados por John Wayne, em que os apaches ensinavam como se defender dos invasores. Deveriam ter atacado a cavalo, conduzindo flechas incendiárias e galopando em torno do prédio aos gritos de uh! uh! uh! Estou certo de que o indigitado projeto seria retirado de pauta. Os livros de aventuras de Karl May, muito lidos em outros tempos, também forneceriam valiosas lições.
E a vacinação contra a Covid? É uma confusão incrível, um desacerto inacreditável. Nem os Trapalhões fariam melhor. Enquanto o presidente da República atrapalha, desautoriza e infunde dúvidas nas pessoas que ainda acreditam nele. E os brasileiros vão morrendo a mais de dois mil por dia e já enterramos mais de meio milhão de pessoas. É triste, é trágico. Ficará na história como uma das páginas mais negras. Mais espantoso ainda é que numerosas pessoas não querem se vacinar ou não comparecem para a segunda dose. Um conhecido diz que é recomendação do bispo da recatada Igreja dos 4 Bicos. É caso de cadeia (indução em erro para descumprir a lei).
Ao tempo em que escrevo, prossegue a caçada ao suposto assassino em série, Lázaro. Mais de trezentos policiais, apetrechados com helicópteros, drones, parafernália eletrônica, cães farejadores e armamento pesado não conseguem localizar um homem sozinho e a pé. Imagino que ele já esteja bem longe, numa grande cidade, onde é mais fácil se esconder. Mesmo porque ele sabe que se for encontrado será fatalmente morto, ainda que sem processo, sem contraditório, sem defesa e sem provas. São dezoito dias de buscas infrutíferas. Talvez os policiais devessem pedir uma ajudinha ao comissário Maigret. Estou certo de que sem armas ou violência, ele logo desvendaria o mistério. É pena, porém, que Maigret seja um personagem da ficção de Georges Simenon. E Lázaro, não será também uma ficção? (*)(**)
Fatos assim são um prato cheio para a imprensa internacional.
Tudo isso me traz à lembrança um louco manso que perambulava pelas ruas de Porto União. Sempre com os bolsos cheios de bananas que ia comendo e jogando as cascas em qualquer lugar, até mesmo na igreja. Generoso, encontrando algum conhecido, oferecia:
- Quer banana? Está bem madurinha.
Deparando com um grupo de pessoas que conversavam, aproximava-se em silêncio e ficava ouvindo. Quando comentavam algum caso fora do comum, ele balançava a cabeça e murmurava: - O mais certo sou eu! O mais certo sou eu!
(*) Como eu previa, Lázaro foi trucidado.