Raul Tartarotti*
Recebi sua carta filho, e confesso que fiquei estarrecido com suas palavras, descrevendo a dor e o drama vividos na Terra.
Estou atento a tudo que tem se passado nesse lugar que criei e vejo, diariamente, minha obra vir ao meu encontro, o homem.
Imaginei que grandes tormentas pudessem irromper, maremotos imensos, invasões de loucos e a peste. Mas talvez somente o conjunto delas fosse tão fatal como está sendo, e nunca uma sozinha.
Essas pestes já dizimaram muitos de seus irmãos em outros tempos e, diferentemente dessa vez, nunca o homem teve tantos recursos à sua disposição para a cura e isolamento.
Vejo com tristeza os teimosos que se agrupam em qualquer lugar, por vezes inebriados se isolam da humanidade, a qual também fazem parte.
Lamento profundamente, e sangro em meus olhos, ao ver esses filhos, todos frutos do meu esforço, romperem com a empatia e a solidariedade ao próximo.
Os criei para serem livres, produtivos e se reproduzirem. Mas o que vejo é ganância, sofrer e ardor, com muito pouco amor pra oferecer ao próximo.
Creio que minhas preces não ajudaram, pois chegaram até hoje nessa difícil condição de vida.
Não aprovo tal situação que se encontram os homens. Confesso-te, meu filho, que uma tristeza ímpar assola meus pensamentos, e minha mente se confunde com tristeza e piedade, por todos que a mim vêm agora, depois de um dolorido final.
Peço-te, que me ajude na tentativa de proteger os homens de bem, e convencer os cegos que insistem no caminho do egoísmo e da tirania.
Não sei se sozinho poderei ajudar a todos, necessito de nobres criaturas como tu, teus amigos e familiares, para essa nova empreitada que se abate sobre a terra.
Não tenho outro lar, nem mesmo outro tempo para oferecer a esse povo.
Será necessário resolvermos o que se apresenta, e assim sonhar com um futuro melhor.
Quero que saibas que pensei muito sobre seu pedido de anulação desse último ano. E cheguei à conclusão simples que para todos homens de bem sempre está reservada a vida eterna comigo, mas se desejares mais um ano, no final de tua vida, junto com os teus, te concedo com amor, a ti e a quem mais desejares incluir.
Também desejo que sejam teus melhores dias, junto a eles, e permaneça desejando e fazendo o bem ao próximo, teu irmão.
Minhas preces continuarão na busca da harmonia e da paz na terra a todos, espero que valha a pena teu mais um ano com eles, já tão sofridos e desesperançosos.
Desejo assim que você distribua seus pensamentos bem-aventurados, para que então tenha valido a pena ficar mais um tempo nessa Terra.
Sigo com meu olhar protetor, à espera de que o homem faça seu melhor a cada sempre, mesmo encontrando tantos sem bondade, e insistente desejo de fazer o mal.
Minhas preces nunca desistirão das criaturas que dei vida, e um caminho para seguir com toda liberdade, para ser o que quisessem. Seja feliz e faça o mesmo a quem não o sabe ainda.
“Não tenham medo dos que matam o corpo, mas não podem matar a alma. Antes, tenham medo daquele que pode destruir tanto a alma como o corpo no inferno”.
Mateus 10:28.
*Raul Tartarotti é engenheiro biomédico e cronista.