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Balneário Camboriú

“SOB UM CÉU AZUL PURO INTENSO”, por Fahena Porto Horbatiuk

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  1. Introdução

 Este artigo, além de apresentar o escritor Enéas Athanázio, pretende apreciar, com precisão, sua obra literária, que o consagra como representante da Literatura Regional Catarinense, especialmente, por meio dos seus contos.

De toda a obra athanaziana se depreende o amor à terra natal, um humor suave como brisa, o cuidado em resgatar, enquanto é tempo, por ter bem gravada na memória e no coração, a linguagem; os usos e costumes dos antepassados, tropeiros, fazendeiros, imigrantes e caboclos; a belíssima e exuberante natureza verde, sob um céu muito limpo e azul. E o ar extremamente gelado no inverno.

Chama a atenção a integração entre os contos, em que alguns personagens se repetem, tornando-se, como a natureza, familiares ao leitor, e mais bem conhecidos a cada contexto natural e social.

Enéas é filho de Campos Novos, localidade do planalto norte-catarinense, passagem dos tropeiros valorosos, paranaenses, gaúchos, paulistas, no início, e, posteriormente, seus aguerridos colonizadores, cresceu sob o signo do amor à terra, por sua encantadora natureza, com vales, montes, planícies, lagoas, campinas e florestas… Campos Novos foi elevado a Município a 30 de março de 1881, tendo sido desmembrado do Município de Curitibanos, e sua instalação como novo município deu-se a 18 de outubro de 1882 (Blasi, 1994).

 Tão bela localidade acolheu como filhos, também, homens de garra que por lá estiveram, como foi o caso do avô do escritor Enéas Athanázio, que provindo do Líbano deu exemplo de trabalho, chegando a ter um grande comércio e belas propriedades.

A região foi crescendo com valores como o do trabalho e da dedicação, como fizeram os antepassados. Com certeza, quando Francisco Athanázio (avô do autor Enéas) colocara seu filho José para fazer o curso de Medicina, tinha como objetivo oferecer a Campos Novos um atendimento médico menos precário. Como relata Blasi (1994): “Não havia hospital e os consultórios não possuíam quase nenhum dos pré-requisitos necessários ao atendimento dos mais simples casos de cirurgia”.

Desse mesmo espírito aberto à vida, com perseverança, provêm outros renomados profissionais, pesquisadores e literatos. Entre estes, Enéas Athanázio. 

Dessa forma, o leitor terá a satisfação de usufruir um pouco dessa riqueza artístico-cultural e, naturalmente, buscar conhecê-la melhor

  1. O berço iluminado

2.1 O avô Francisco (“Seu” Chico)

Comecemos pelo casal Francisco Athanázio e Bernardina Fontes Athanázio. Seu “Chico” era libanês, de Beirute, e se dizia de origem grega. Nasceu em 1860 e chegara ao Brasil e 1877 (17 anos de idade). Viveu algum tempo em Lages, em Curitibanos, fixando-se em Campos Novos, onde casou-se em 1898. Prosperou com uma loja de tecidos, um casarão de madeira, portas e janelas abertas. Tiveram o filho José, depois Maria e Anita. Perderam um menino, em acidente horrível (Athanázio, 2009, p.5,6)

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2.2 O pai José

Conta Enéas (2009) que José era o primeiro filho de Francisco e Bernardina. Olhos muito azuis, cabelos loiros, inteligente. Aos oito anos, fora levado a estudar num internato, em São Leopoldo, no Rio Grande do Sul. Muitos pais levavam seus filhos até lá, em lombo de burro, e só iam buscá-los, nas férias. Para os estudantes era uma aventura. Depois de oito anos de estudo, em São Leopoldo, estudou no Colégio Catarinense, em Florianópolis. Em 1916, vai a Porto Alegre, preparar-se para a pretendida Faculdade de Medicina, na qual ingressa em 1917, (Faculdade de Medicina do Rio Grande do Sul), cursa por três anos, transferindo-se depois para o Rio de Janeiro, onde concluiu o curso em 1922, no ano de centenário da Independência do Brasil.

Faz ainda um doutorado, é aprovado com distinção e louvor da exigente banca.

A partir de 1924, passa a atuar como médico em Campos Novos. Manda fazer sua residência num local bem alto, com paredes de pedra e ferro (como vira na Gávea-RJ) e varanda em frente. Ali viverá e clinicará. Esse local veio a ser a atual Fundação Hospitalar Dr. José Athanázio, assim nomeada em sua homenagem, fundada a 2 de janeiro de 1976. Sua dedicação e generosidade são sempre lembradas. Se necessário, além da receita a verba para comprar os remédios, além das viagens a cavalo, no começo, e no seu Ford, depois, aos lugares distantes em que atendia os pacientes. 

Naquele tempo, ele não tinha instalações e pessoal formado, para realizar grandes cirurgias. E era com tristeza que mandava alguns pacientes para outra cidade.

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Conhece Irma Vieira, filha dos fazendeiros Policarpo Alves Vieira (Seu Lica) e Olívia Alves Vieira. Ficam noivos em 1932 e casam-se em maio de 1934. O casamento durou três anos, tendo Irma ficado viúva, com o filho pequenino.

José Athanázio tinha bons amigos, pessoas cultas, e frequentes conversas entre eles, mas seu amigo mais próximo, Tio Tino, que participava de seus hobbies, na feitura de móveis ou caminhadas, ou na lida em seu pomar. Tinha um cão de estimação, o Fumanchu (Athanázio, 2009).

Juventino Lemos (Tio Tino) fora tropeiro, trabalhara com o célebre comerciante de mulas, Nabor Mesquita, de Passo Fundo, e formavam tropas.

  1. A mãe Irma Vieira

Irma Vieira frequentava festas e bailes, foi num desses bailes que José se encantara por ela. Estudara em Colégio de Irmãs, tanto em Porto União (SC) quanto no Rio Grande do Sul, tendo aprendido pintura e noções básicas de música. Ensinara pintura em tela e em porcelana para muitas gerações de moças e rapazes, na sua própria casa (Macedo, 2016).

José Athanázio casa-se em maio de 1934, mas, desde 1936, começa a ter problemas de saúde. No começo de 1937 sua saúde começa a piorar, vindo a falecer em março desse ano, deixando seu filhinho, de apenas dois anos, sem pai, e Irma, viúva (Athanázio, 2009).

 Algum tempo após o falecimento de seu esposo, Irma casa-se, em segunda núpcias, com João Codagnone, na época, funcionário da Companhia Lumber. Moravam em Calmon SC. Mais tarde foram residir em Porto União-SC. Conta Enéas que seu padrasto, João Codagnone, era filho de Nicola, que conforme diziam, era proprietário de um terreno no centro de Porto União, onde construíra o Cine Odeon (Athanázio, 2024).

Mas quando a família foi morar em Porto União, o cinema já era de outra pessoa. João trabalhou lá como empregado antes de ingressar na Lumber, em Calmon. Muitos anos depois trabalhou também como funcionário do Cine Luz e no Cine Ópera. O casal teve o filho Humberto e a filha Zeni, meio-irmãos de Enéas, segundo Eneida (Athanázio, Eneida, 2023). Conheci Irma em União, como nossa vizinha, em cuja residência um grupo de pessoas das casas próximas se encontravam para fazer novenas e rezar o terço. Irma era membro do Apostolado da Oração, tendo feito parte da Diretoria.

Sempre gentil, nas paredes as telas, as mesas com seus crochês ou bordados, as porcelanas pintadas no balcão e armário… café saboroso e algum bolo sempre nos esperavam. Muitas vezes fui até a biblioteca e abri seus livros, a maioria do filho Enéas e alguma literatura de cordel, inclusive uma obra em homenagem ao Enéas, do trovador Rodolfo Coelho Cavalcante (1986, p. 2), o qual me oferecera. 

Seu pai José Athanázio

Foi médico da região

Que em prol da medicina

 Deu todo o seu coração,

Era o seu nome querido

Por todos reconhecido

Como verdadeiro irmão.

*

Chamada Irma Vieira 

A sua progenitora, 

Alma sensível, educada,

Desde jovem encantadora, 

Se dedicava à cultura 

Das Artes, pela Pintura,

De maneira sonhadora.

No total, são 32 estrofes, em oito páginas, tendo na capa azul-claro a foto do autor Enéas e dados da obra, e na contracapa, a foto do trovador e seus dados.

Certa vez, comentei que ela possuía várias bengalas bonitas, então, ela doou-me uma, dizendo: “Pode precisar um dia…”. Guardo com carinho. 

2.4 O Autor Enéas Athanázio

Enéas Athanázio nasceu em Campos Novos, no planalto catarinense, dia 28 de março de 1935, filho de José Athanázio e Irma Vieira. 

Assim ele descreve sua terra, que naquele tempo chamava ‘São João Batista dos Campos Novos’, hoje Campos Novos: 

Terra de gente destemida, cercada pelo tapete verde dos campos infinitos, varrida por ventos que correm soltos nas coxilhas e coberta por um céu azul sem nuvem. Trilha de aventureiros e desbravadores que buscavam os árduos caminhos do sul. Terra onde tudo é largo e sem fronteiras, incentivando o amor a liberdade (Taveira, 2021, p.10).

Viveu lá, como criança, até seus oito anos de idade, e mais nove anos, após formar-se em Direito.

Como criança, conforme relata o autor, em entrevista a J.C. Taveira (2021, p.10), corria “trepava e árvores, comia frutas, tomava leite de cabra e tremia de medo de tempestades”.

Às vezes a família ia de Ford à fazenda dos avós, o Fundo Grande, longe, próximo ao Rio Grande do Sul, enfrentando estradas ruins, só carreiros. Na casa dos avós estava bem: andar a cavalo, ver carnear animais, lavar roupa no rio e “brincar livre, até ficar tisnado de sol e com os pés craquentos da terra vermelha” (Taveira, 2021, p.19).  

Depois que a mãe se casara outra vez, foi com ela morar em Calmon (em 1945), onde o padrasto era funcionário da Lumber, empresa que, com sua atuação de expulsão dos donos das terras, retirada da madeira, provocara a revolta dos moradores da região. Nesse local, Enéas ouvia as histórias sobre os rebeldes chamados de jagunços. Chegou a frequentar por alguns meses a escola em Calmon, mas logo foi enviado para o internato São José. Estudara durante o curso primário e secundário, em Porto União (interno a partir dos 10 anos), no colégio São José, depois, em Curitiba e Florianópolis, onde cursou Direito pela UFSC.  “[…] Faz tanto tempo que parece um sonho. Ou foi mesmo?”, comenta. (Athanázio,2024)

Relatou-me Enéas (2024) que advogou em Campos Novos e ali foi vereador. Uma vez Promotor, residiu em várias cidades: Anita Garibaldi, Capinzal, Canoinhas, Rio do Sul e Blumenau, onde estabeleceu-se até se aposentar. Em seguida morou em Florianópolis, por 3 anos, e finalmente, fixou-se em Balneário Camboriú. Nesses locais onde vivera, também lecionava em colégios e faculdades e escrevia para jornais e revistas.

Foi vice-presidente da OAB Blumenau e presidente do Conselho de Cultura, nessa cidade.

Aposentado, vive como escritor (ler, escrever, viajar, participar de eventos literários), criou o “Jornal do Enéas”, que teve circulação por 10 anos, e muito bem aceito, recebendo até prêmios. Também mantém uma coluna no “Jornal Página 3” (Balneário Camboriú-SC) há mais de 20 anos (1997). Seu objetivo, além do gosto pelo exercício da escrita, era divulgar autores de valor e suas obras, missão que retoma com seus artigos nas obras “Sobre Livros”.

Em Blumenau manteve artigos na Revista “Blumenau em Cadernos”, por longos anos, desde 1979, sobre assuntos de História, como O Contestado, e indica autores de obras que esclarecem a história do Estado. Criou, em 1993, a Editora Minarete/SC, visando facilitar a publicação de suas obras e a de escritores interessados.

No final da entrevista a Guilherme Queiroz de Macedo (2016, p. 29), afirma o escritor o que já é de conhecimento de todos: “Bem ou mal, no entanto, creio que tracei um painel completo dos Campos Gerais, como ninguém havia feito e jamais fará porque não conheço nenhum escritor com a vivência que eu tive na região, como advogado, Promotor de Justiça, vereador e professor, em contato diário com o meio e o povo.”

Seu processo de criação é todo mental: “a ideia surge, baila um pouco na cabeça e desaparece. Quando é boa ela volta e já vem acrescida de pormenores” (Taveira, 2001, p. 17).

Desse modo, quando a história está pensada, escreve: “Só a escrevo quando está bem madura” (Athanázio, 2024). Nesse instante em que sente que a história pode vir a lume, começa a produzi-la.

Nunca usou pseudônimos. E ele mesmo quem diz: “Apareço sempre com a cara e a coragem” (Athanázio, 2024). E acrescenta que, em Campos Novos, criara uma coluna, chamada “Atráz do Toco”, em que assinava Visconde de Massaroka e escrevia mal, para despistar, era uma forma de, usando humor, criticar coisas que aconteciam.

Texto

Descrição gerada automaticamente

Essa coluna era escrita em “O Jornal”, que pertencia a Antônio Chedik Filho, coletor Federal. A coleção, segundo o autor, foi doada ao Arquivo Histórico de Blumenau (Athanázio, 2024).

2.5 A família do autor

Casou-se com Jandira, também nascida em Campos Novos, onde residiu e estudou até a idade adulta.

Segundo Enéas (2024), quando jovem, Jandira gostava muito de jogar vôlei e de teatro, tendo participado de várias peças teatrais. E acrescenta: 

Tem sido companheira exemplar; incentivou-me sempre nas carreiras do Ministério Público e das letras. Vibra com os bons acontecimentos da vida literária e sempre viajou comigo, com a melhor disposição, mesmo para os ínvios lugares e os grotões. Continua linda e elegante, pelo menos aos meus olhos (Athanázio, 2024)

São seus filhos: Márcia, José, Eneida, Patrícia (casada com Christian). Os netos são: Lívia (casada com Cláudio), Bruno Henrique (casado com Silmara), Vivian, Isabela e Ana Clara. Os bisnetos são Sofia e Pedro.

O lazer preferido de Enéas, além de viajar, é ler ou escrever. 

O meu pai sempre amou viajar com minha mãe pelo interior do país todo. Eles viajavam muito. Conhecem praticamente o país inteiro. Escrever nem precisa falar. Continua sendo uma das grandes razões de vida dele. Aliás, ele faz com muito encanto e imaginação. Eu chegaria a dizer, que antes mesmo de ele ser um Promotor de Justiça, sempre foi e vai ser um Escritor (Athanázio, Eneida, 2023).

O pai sempre conversava com a família, “principalmente nos momentos de lazer”, e contava aos filhos partes de seus contos e, também inventava muitos outros, naqueles mesmos momentos, conta Eneida, uma das filhas. Diz ela que tanto o pai quanto a mãe incentivavam muito a estudar, para que todos tivessem sua “carreira”. 

Eles fizeram questão de nos matricular nas melhores escolas da época”. Igualmente cuidavam de nossa saúde com muito zelo, “principalmente quando eu tive alguns problemas de saúde bastante sérios na infância, eles nunca pouparam dinheiro e esforços para que eu obtivesse a cura (Athanázio, Eneida, 2023).

Enéas relata ter conhecido 

todos os parentes do lado paterno, exceto o avô Francisco e a avó Bernardina. Conheci a tia Maria, casada com João Rupp, e Anita, casada com Sálvio Guilhon Gonzaga. […] Conheço todos os primos e primas de ambos os lados, paterno e materno. Rose-Marie, filha de tia Maria, e Terezinha, filha de tia Anita, estão sempre em contato. Rose reside em Curitiba, e Terezinha casou-se com um Daux, e tem um antiquário em Florianópolis (Athanázio, 2024).

2.6 Enéas, o escritor

Foto: Acervo do Autor. Acadêmico de Direito.

Érico Veríssimo, Jorge Amado, José Lins do Rego, Graciliano Ramos, entre outros, deram visibilidade a seu Estado, por meio da Literatura. Enéas Athanázio, com sua obra literária, coloca Campos Novos, sua terra, e toda a região, bem como Santa Catarina, no cenário nacional.

Começou escrevendo textos para os jornais, “O trem da vida era corrido. Escrevi muito para jornais e rádio, artigos e crônicas esparsos, sem muito compromisso” (Macedo, 2016, p.26).

Nessa mesma entrevista a Macedo (2016, p.26-27), Enéas conta ter criado com Edson Ubaldo um jornal “Notícias e Letras” (um sucesso). Em outro periódico, “O Jornal”, de Campos Novos, criara a coluna “Atráz do Toco”, assinada como Visconde de Massaroka. “Nela eu lançava notas bulindo com as pessoas, algumas se divertiam, outras ficavam enraivecida.”

Daí em diante, sempre escreveu para jornais, das localidades onde trabalhou. Em Balneário Camboriú, criou o “Jornal do Enéas”, com duração de dez anos. Ainda escreve no Jornal Página 3 desde 1997.

 Benedito Luz e Silva, em “O Ensaísta Enéas Athanázio” (1987,p.8) afirma: “O equilíbrio é a qualidade melhor de Enéas Athanázio como ensaísta, sabendo ele ater-se ao essencial do autor e da obra analisada.” 

O autor escreve para: “A Ilha” e “Escritores Brasileiros”, editadas por Luiz Carlos Amorim (Florianópolis); “Jornal Página 3”, todas as semanas (Balneário Camboriú); “Blumenau em Cadernos”, todas as edições; “Jornal Linguagem Viva”, editado por Rosani Abou Adal, com frequência (São Paulo); Jornal e blog “O Boêmio”, editados por Eduardo Waack, com frequência (Matão – SO); “Blog do Filemon Martins”, com frequência (São Paulo); “Revista Rio Total”, blog editado por Irene Serra, todas as edições (Rio de Janeiro); Blog “Cultura.e”, editado por Thiago Macedo (João Pessoa – PB) e outros.

Devido ao intenso apelo literário, nos anos 80, Enéas Athanázio aceitou o convite de Joaquim Inojosa para frequentar os Sabadoyles e conviver com grandes escritores do modernismo brasileiro, no Rio de Janeiro, onde participava de encontros promovidos por Plínio Doyle, bibliófilo, advogado, e pesquisador de preciosidades literárias (raridades), que recolhia em sua vasta biblioteca de 25.000 volumes. Esses encontros ficaram conhecidos como Sabadoyles. Não havia roteiro estabelecido: os presentes ficavam à vontade, conversando, lendo, procurando informações. Muitos iam para encontrar outros que lá estariam (Athanázio, 2024; Oliveira, 1989). 

Foi Raul Bopp quem criou o termo “Sabadoyle”, por sua vez, Joaquim Inojosa criou o termo “Os Decadentes”, para referir-se aos aniversariantes que completavam décadas de seu nascimento. Eram alegres almoços oferecidos a eles, conta Doyle, em entrevista a Maria do Carmo Gaspar de Oliveira, do Jornal das Letras, de maio de 1989, ocasião em que esse jornal completava 40 anos, graças aos esforços de Elísio Conde (Oliveira, 1989)..

Entres os sabadoyleanos, podemos citar: Plínio Doyle (o anfitrião), Carlos Drummond de Andrade, Afonso Arinos de Melo Franco, Cyro dos Anjos, Homero Homem, Joaquim Inojosa, José Mindlin, Pedro Nova, Raul Bopp, Sílvio Meira, Wilson Martins, Lygia Fagundes Telles, Rachel de Queiroz, e muitos outros (Athanázio, 2024). 

Em “História de uma confraria literária, o Sabadoyle” (Senna, 1985), sob a rubrica “A despedida de Pedro Nava”, encontra-se a ata em que consta a presença de um ilustre Promotor Público de Blumenau, Enéas Athanázio – jornalista e escritor de renome, no conto, no ensaio e na crítica literária, colaborador do Jornal do Comércio […]” Era a ata de 1984.

Conta Enéas: “Na época de Blumenau eu embarcava no ônibus de Itapemirim das 19h de sexta-feira, até São Paulo, e lá, num expresso da Única, até o Rio. Chegava lá mais morto que vivo, descansava umas duas horas e partia para o Sabadoyle” (Athanázio, 2024)

Esse fato basta para comprovar o quanto Enéas valoriza o mundo dos intelectuais. Imenso esforço por imensa causa. Com muita razão, o cordelista famoso, Hildemar de Araújo Costa (1991), poeta e trovador, baiano, produz “O A.B.C. do Escritor Enéas Athanázio”, uma estrofe sobre o autor iniciando com cada letra do alfabeto. A seguir, apenas duas: 

Beletrista cuja pena

 Faz progresso singular

 Seus livros hoje comprovam

 Talento espetacular

 Escrevendo ficção

 Tem forte imaginação

 Fazendo o leitor pasmar.

Caprichoso no que faz

Buscando sempre o perfeito

Ele separa os seus temas

E sem ter falha ou defeito

Produz a composição

Que vai pra publicação,

Depois, o livro está feito (1991, p.3).

  1. A literatura de Enéas: Infância e Adolescência 

Vida Confinada (1997), Solidão Solidão (1995) e Rosilho Velho (1994) abrangem histórias em que o narrador é criança ou adolescente. São obras que revelam a realidade sublimada pela arte tão simples e bela (como o é a criança), mesmo na memória das vivências mais plenas de subjetividade e fantasia. Pode-se entrever nesses contos a figura do autor, ora crítico e humorista, ora aventureiro e feliz, ora solitário, mas sempre observador. 

3.1 Vida Confinada – Autoficção – 1997

Vida Confinada, obra em que realidade e ficção concorrem entre si dando corpo a um texto fabuloso, pelo olhar perscrutador do adolescente interno no colégio. Este livro é parte muito importante para melhor conhecer o autor.

O relato do prédio, das instalações, a falta constante de água, o tipo dos sanitários, a alimentação, sempre em coletivo, sob comando, a sensação de sufoco pela falta de liberdade e as pequenas/grandes malandragens que eram feitas, mas encobertas pelo silêncio dos autores, tudo perpassado pelo humor zombeteiro e irreverente dos estudantes, uma válvula de escape: apelidos, termos empregados, perfis de mestres, linguagem coloquial sem restrições… O conjunto é um espetáculo literário digno de espaço. São onze capítulos, em que o título anuncia a trama. O último capítulo, denominado “A porta” termina com o personagem Janary esforçando-se para ser aprovado, contando os dias restantes dos estudos: “Nem podia acreditar que chegava a hora de cruzar, pela última vez, rumo à liberdade, a porta de imbuia maciça que dividia o mundo. Nessa hora, prometia-se, não olharia para trás” (Athanázio, 1997, p.66).

Como Janary é personagem que transita em vários contos, de diferentes obras do autor; perguntei-lhe se seria uma projeção sua, mas ele afirma: “Janary Messias representa a visão que eu tinha dos advogados da região, na época. Corajoso, arrojado meio aventureiro. […]. Somos muito diferentes, em muitos pontos” (Athanázio, 2024).

3.2 Solidão, Solidão – Dois causos de piás – 1995

Em Solidão, Solidão, no conto “O piá da Iris” o narrador é um adolescente de colégio interno, isolado dos grupos de colegas, que, com espírito aventureiro e curioso, navega remando pelo Iguaçu, rio que banha as Cidades Gêmeas, Porto União e União da Vitória, buscando descobrir todos seus recantos e encantos, e, nesse vaivém, conhece Iris, com que passa a ter certa vida amorosa; daí ela se torna sua companhia no sobe-e-desce do rio. 

Em “A Carteira” o narrador já é um jovem adulto, e, por acaso, senta-se ao seu lado, num ônibus, o ex-colega Djalma que estudava no internado, pagando seus estudos com trabalho pesado diário.

Djalma conta-lhe que ganhara do avô uma carteira que ficava vazia, no fundo da gaveta, no colégio. Daí ele teve um sonho, em que o avô lhe dissera que colocasse a carteira no bolso da camisa e, se tivesse fé, encontraria ali, sempre alguns trocados para dolés ou doces. Misteriosamente assim foi, até que, já um pouco mais crescido, recebera do avô um kit de barbear. Desse dia em diante a carteira voltou a estar vazia. 

Nesse caso, o leitor há de imaginar como esses tostões iam parar na carteira, e como o sonho seria um recado.

3.3 Rosilho Velho – 1994

Passada a infância, o narrador relembra, sentado em um banco da antiga estação ferroviária, sua terra. De um lado, os restos de uma madeireira destruída; atrás ruas com suas casas velhas alinhadas; do outro lado, os morros que na infância lhe pareciam maiores e cheios de mistérios e de animais selvagens. 

Em frente, sim, a estradinha de terra vermelha, cercada pela campina seca com as geadas do inverno. Essa estradinha ligava sua vila a um povoado próximo, em que morava seu amigo Téo. Era uma senda quieta em que ele ouvia pássaros e vozes dos animais da mata. 

Lembra como frequentava aquele caminhozinho, desde cedo, levando seus livros e revistas para trocar com o amigo. Ia assobiando, cantando, discursando para ouvir o eco e afastar o medo. 

Por vezes, montava um velho cavalo, o Rosilho, muito seu amigo, que o levava, aos bufos, e depois de solto ficava por lá, como que o esperando para a volta. “A estradinha que ficou para sempre na minha lembrança como o caminho livre do sonho e da fantasia.” (p.07)

Em “Por Causa do Buçal” também conta sua experiência de andar muito a pé na escuridão noturna e com chuva, pois havia montado outro cavalo, que tirara o buçal, perdera os arreios e o deixara a pé. Vencendo todos os medos e caminhando firme, embora exausto para chegar à casa. “Aquela noite, ainda que tivesse a mesma duração das demais, foi para mim a mais longa de toda a juventude e dela saí o homem que eu imaginava que já era” (p.15).

Em “Recordações de um cavalo velho”, o narrador e protagonista é o cavalo, com sua história. Esse conto é a culminância da obra, que flutua na ternura e na singeleza. 

São tantos gestos de carinho com que sua “dona” e seu “doninho” o tratavam e que ele, com esforço, retribuía. Ao final Rosilho imagina: 

Um dia destes, quando menos esperar, toparei com esta estrada e começarei a caminhada. Bem devagar e sem pressa, como meu fôlego curto permitir, pois em algum ponto destas coxilhas há de existir a estrada larga, plana e fácil de seguir, que me levará até elas. (A égua sua mãe e a coronela já falecida, sua dona) (p.45).

  1. O coração no campo 

A partir de 1973, as obras se voltam para vida em São Simão e arredores. Conforme Dutra (2024), “São Simão antigamente era uma vila mais habitada, com capela, salão e escola. Hoje tem menos população, é uma vila, não consta na relação dos distritos […] agora o acesso é asfaltado, não muito distante do centro da cidade de Campos Novos, no planalto norte-catarinense”. Graças a essas obras, a natureza, a cultura, os costumes, a linguagem do povo lá residente nos tempos da colonização foram preservados, e a Literatura Catarinense se projetou para todo o país e o exterior. 

4.1 Peão Negro – 1973

Em Peão Negro, os locais e personagens dos contos se relacionam, dando à obra plena verossimilhança. Também a linguagem da época em que os fatos teriam ocorrido, no início da colonização da região; personagens semelhantes no poderio das fazendas, com seus títulos de Coronel ou Major, adquiridos por certo valor, mas representativos de sua capacidade de produzir e enriquecer. O costume de tomar chimarrão (matear), de fumar palheiro; a paixão político-partidária e por cavalhadas (carreiras), querelas com os padres, sobre os santos de sua capela, e muitas bravatas… 

Todos os contos dessa obra ocorrem em São Simão e arredores.

Como a política era apaixonante para os coronéis, as consequências foram, às vezes, desastrosas: um se suicida com greve de fome; e outro tem alucinação desesperadora de que houvesse matado o vencedor concorrente, de forma inexplicável. A segunda paixão, as cavalhadas, em dias de festa, resultando em conflito, tiro e mortes.

Os contextos geográfico e social vão-se mesclando com tal precisão, no decurso das narrativas, que a obra termina sendo percebida como um todo: cada conto vai desdobrando a vida em São Simão e região; nos seus diversos aspectos. Não se trata de uma novela, mas de um todo integrado pelo ambiente, linguagem, tipo dos personagens e pelo tema das histórias, que vão colorindo a obra, como se o leitor observasse as várias faces de um decaedro de cristal, iluminado por Athanázio.

Segundo Cláudio Dutra (2023):

até mesmo o conto que dá título ao volume, ‘Peão Negro’ – que relata a jornada de aventuras e desventuras de um mulato nascido e criado numa fazenda do interior de São Simão, transcorre numa conjuntura em que o jogo do poder político regional certamente trafega pelas mãos (e pela algibeira) do coronel fazendeiro. Esse é o enfoque temático – ou com ele contribui – em sete dos dez contos que integram o volume: ‘São Simão’, ‘Eleição na Roça’, ‘Pito Aceso’, ‘O Peão Negro’, ‘O Documento’, ‘O Comício’ e ‘Homicídio qualificado’.” Segue Dutra comentando que em “Homicídio qualificado” é possível “flagrar nele um flerte, tímido, mas nítido, com a literatura fantástica.

Segundo conta o autor, fica a

quatro léguas ao sul de São Simão, em meio aos campos sem fim […] (p.31) e tem o nome devido a uma exclamação “do velho coronel Mila, irritado ante o acontecido (briga e mortes, durante uma carreira de cavalos), bêbado como uma cabra, lançara uma expressão histórica e definitiva, constituindo apodo, e injúria, rancor e desprezo […] – ~Êta lugar miserável, tu não vales mais do que um pito aceso! (Athanázio, 1973, p.36).

A Professora Enedy Padilha da Rosa (da Rosa, 2023) narra três versões para a origem do nome Pito Aceso, comunidade, hoje, do Distrito da Encruzilhada, pertencente a Campos Novos, a 23 km da cidade.

Conta Enedy (2023) que, segundo Andrezza Antunes, dessa comunidade, o nome vinha do fato de que um membro da localidade dava alguns tiros e apagava os lampiões a tiro, durante os bailes, dizendo: “- Dancem, porque meu pito está aceso.”

Daí proviria o nome.

Outras pessoas contam a versão de que havia uma casa de madeira, em que morava um rapaz leproso (Osório), que teria esquecido o pito aceso, na cama onde dormira, e o fogo destruíra a casa. (No entanto, teria sido um fogo criminoso, para tirar o doente dali).

Outra história, era a que o tropeiro Luís Rodrigues Padilha relata: seu pai falava dos Farrapos e que lutara em Curitibanos, não fora preso e fora para Campos Novos, passando por outros atalhos, chegando à comunidade de Pito Aceso. Parou ele e um companheiro num casebre local. Seu pai tinha deixado o cavalo amarrado. O pai desencilhou o animal e acendeu um pito antes de soltá-lo. Um raio veio e atingiu o cavalo, ele ficou salvo, o que atribuía a sua fé em São Sebastião. E prometeu um dia mandar uma imagem de São Sebastião para defender aquele lugar. Ele fora morto ainda no retorno daquela revolução, mas um companheiro levara a imagem de São Sebastião. 

Luís Rodrigues Padilha faleceu na década de 70, mas contou ao neto, que agora está com uns 80 anos de idade.

4.2 O Azul da Montanha – 1976

Essa obra leva o nome do último conto, em que um andarilho percorre a região, não trabalha, só aceita varrer terreiros, galpões e, se falam em trabalho, ele some, em surdina. Come, aceita uma roupa melhor, pergunta de todos… 

Nesse livro, todos os contos têm uma frase popular ou trovinha, que dá o tom emocional e temático de cada conto. Em O Azul da Montanha, o dito popular é: “O sol é o poncho do pobre.”

Era conhecido como Caleco, filho de Sinhá Vitoca, senhora idosa que fazia bacheiros com perfeição “Ninguém sabia por onde andava. Aceito como peça da paisagem, desaparecia e surgia nos lugares mais distantes e nos momentos mais inesperados, sem causar surpresa.”(p.92) 

E o narrador conclui: “Os negros cabelos esvoaçavam ao vento, o passo seguro e decidido, foi o único homem realmente livre que conheci. Sua liberdade só tinha limite no inatingível azul da montanha.” (p.93)

Luís da Câmara Cascudo saúda o autor pela obra: “O derradeiro conto é uma perfeição sugestiva de figura sem história. Caleco ficou-me indelével. Viverá nos ‘gerais catarinenses’, como nas caatingas nordestinas. SC ganhou um grande escritor brasileiro”. (Cascudo,1976, na contracapa de ‘Meu Chão”). Diz Enéas: “o folclorista Câmara Cascudo, de Natal, era apaixonado pelo Caleco, meu personagem, o único homem realmente livre” (Athanázio, 2023).

Caleco representa leveza, empatia e bondade. Além do seu misterioso modo de pensar, porque era muito quieto, sem discussões ou relato de aventuras.

Nessa obra destaco ainda “A Ponte do Figueira”.

O fazendeiro Crescêncio Figueira não aceitava que passasse uma ponte sobre o Lageado do Leão, rio que cruzava uma antiga e abandonada estradinha, em suas terras. Quando um prefeito resolveu fazer a ponte, colocou os materiais no local próximo, e o fazendeiro mandou jogar tudo num grotão, no meio do mato. Depois contratou jagunços e bandidos para impedirem o trabalho. O prefeito convocou policiais e realizou a obra. Na luta entre jagunços e policiais, os jagunços morreram e o fazendeiro também.

E a ponte, embora tivesse um nome pomposo, por ironia, era tratada pelo nome do teimoso:  a Ponte do Figueira. 

“No outro dia o corpanzil do fazendeiro, crivado de balas, foi encontrado sobre as pedras do lageado” (p.27).

4.3 Meu Chão – 1977

Meu Chão, publicado em 1977, traz histórias curtas, de muito suspense, em que o homem do sertão crê em fantasmas, ama, sofre, participa de festas, onde, por vezes, há tiroteio e mortes. 

Em “Ô de casa”, o interessante é que o início e o final são semelhantes. O personagem sonha com uma amiga de infância, e, daí, crê ser uma intuição de que se casaria com ela. E pôs-se a caminho. “Era ela”. Assim é a narrativa: “Quando essa ideia estralou com a violência de um tiro, pulou nos pelegos em que se deitava […]”. (p.7)

Ao final, quando vê a jovem do modo como sonhara, vestida de noiva e feliz, deduz que perdera a viagem e a chance de casar-se com ela. 

E termina de forma paralela ao início: “Quando a conclusão estralou, com a violência de um tiro, deu um pulo nos pelegos que montava. Era ela.”(p.12)

A linguagem, a trama e o cenário dão ao conto um ethos de urgência, de obstáculos e até de insucesso. 

Os contos “Estefano” e “Enjeitados” trazem o mesmo personagem, Estefano, com uma trama em que o menino sonâmbulo do tempo de internato surge, como homem feito, mais tarde, no caminho, desfigurado pela doença, num local ermo em que ficavam os doentes.

Até que, de repente, pude avistar uma delas. Encarava-me. Num choque, notei nítido o aleijão, as faces corroídas pela doença deformante, os olhos injetados de sangue. Pele ressequida e rachada. A memória, sacudida com violência despertou das cinzas a lembrança das conversas ouvidas na infância, com horror e assombro. Eu estava em São Pedro dos Pobres, onde se enjeitavam os mortos-vivos. […] Plantado à margem do caminho, sujo, não sei por que a figura grotesca me pareceu familiar. Foi um susto quando ele gritou […]: – ‘É perigoso! Vá-se embora!’ […] Ele correu para uma das choças, as banhas sacolejando frouxas, quando os pés balofos e branquicentos tocavam o chão de pó. Eram ainda os mesmos gestos e a mesma corrida do polaquinho gordo e sonâmbulo do internato. Estefano. (p.43)

Também o personagem Janary Messias ocorre em contos de outras obras suas. Dessa forma a verossimilhança vai-se estabelecendo. No conto “Plano Perfeito”, pode-se perceber a descrição humanizada do local onde os fatos ocorriam.

 As noites eram frias e a pequena cidade ficava deserta ao anoitecer, todos se recolhendo para perto dos aquecedores e fogões a lenha, transidos e tiritantes. Eram raros botequins fumarentos, envergando ponchos e capas, poucas pessoas se encorajaram a uma prosa mais longa e o consumo de pinga aumentava dia a dia. Janary mantinha os hábitos de sempre, embora contando com ansiedade os dias que faltavam (iria executar um desafeto). Nesse conto, no último parágrafo, Janary sofre acidente no retorno, após o crime. Mesmo que pudesse não poderia explicar como o carro deixou o leito negro, desceu pela ribanceira e rodopiou pelas pedras que se estendiam até o lajeado que corria lá embaixo. Não estava no plano. (76)

Embora os personagens sejam simples, humildes ou não, não são estereotipados, eles surpreendem o leitor e o levam a reflexões além livro, leitura da vida. 

A vida vai acontecendo e os fatos se cruzam, as mudanças ocorrem: o peão forte e batalhador torna-se um pobre andarilho; Estefano, o sonâmbulo do internato, vem a viver segregado e desfigurado pela doença; pessoas capazes e gestos insanos e inesperados, como o Figueira, na luta contra uma ponte em seu terreno, ou como Nhô Pré que, num gesto de desespero, decide chamar os bugreiros, para matar ou afastar os indígenas que ameaçavam sua propriedade, depois muda-se, arrependido do que fez… E assim por diante. 

Edson Ubaldo, em “Jornal de SC”, Blumenau, afirma: 

O Peão Negro’, de 1973, revela o escritor. ‘O Azul da Montanha’, de 1976, provou sua maturidade. E quando digo provou é porque já nascera maduro. ‘Meu Chão’, de 1977, consolida-o como o mais representativo escritor do Planalto Catarinense. […] A mão privilegiada de Enéas Athanázio transforma em passageiros boquiabertos e estupefatos de paisagens, gentes nunca dantes reveladas” (Ubaldo, 1986. Na contracapa de Tapete Verde).

O conto “Bicharia Assustada” refere-se a uma visão dantesca do inferno, em que o personagem, Manequinho escondido no mato após caçada de tatu à noite, assiste, num tablado, a uma sequência de danças, ao toque de um exímio gaiteiro, mas, ao final, percebe que a bota do músico estava se transformando em um casco bipartido, e que da cadeira pendia um rabo enorme, e chifres na testa. Olha para os dançarinos, todos estão pálidos, têm rabos e chifres. 

Sente profunda tristeza e corre assustado pelo mato, bem como seu cãozinho. E dali em diante fica gago, e com a mania de olhar para os pés e passar a mão na testa. 

É um conto diferente no conjunto, mas que faz sentido, quando as pessoas têm crenças em assombrações, em almas penadas e em outros fatos inexplicáveis. Essa é uma das vertentes dos contos do Enéas, como em “Homicídio Qualificado” (caso de alucinação), ou em “O companheiro”, “O Mistério do carrão abandonado em frente ao cemitério”, (Erva-Mãe), O destino da “Primavera” (a fazenda ficou mal-assombrada).

4.4 Tapete Verde – 1983

De início, “Tapete Verde” merece destaque por expressões e sintaxe do passado e da região, onde as relações humanas acontecem. “Emmanuel Fortunato, que o povo encurtou para Mané Fortuna, tinha um bolicho na saída do campo. Era ali que ele com o brilho dos dentes de ouro, sorria e proseava enquanto servia os fregueses” (p.9).

“Cavalos velhos e cansados, com as ancas e o facão salientes na magreza, a pelagem rala tatuada de cicatrizes dos pisoteios antigos e novos”(p.9), eram os matungos. 

Toda a narrativa e descrição interagem na criação de um cenário com seu personagem principal, descrito como: “caboclo cheio de triques, era de fala afetada, metido a falar difícil.” (Athanázio, 1977) 

O conto todo segue numa linguagem interiorana da época e do local, incluindo os costumes de então, com gaiteiro e suas rancheiras, e “o liso da branquinha passava de mão em mão”.(p.9) 

Essa história tem um final triste, com a morte de um dos cavalos nos trilhos do trem; o que Mané Fortuna sempre lamentava.

Nereu Correa (1983, em Tapete Verde, p.77) assim se posiciona sobre a linguagem: “Enéas Athanázio é um escritor que recria o dialeto regional ao nível de linguagem literária, sem insistir nos exageros do léxico nativo ou no excesso de estilização.” (Athanázio, p.77)

Os contos: “Os Quatro Degraus, Encontro na encruzilhada, Olhos Azuis e Barreira Vencida” têm, em todos, o drama do desencontro, da decepção, da saudade e desejo do advogado Janary: rever sua amada de vinte anos antes.

Orientado por um amigo velho, alcoviteiro, seguindo seus conselhos, foi ao encontro por ele indicado. 

A originalidade desses contos é que os dois contos “Olhos Azuis” ou “Barreiras Vencidas” têm finais à escolha do leitor, que naturalmente, vai querer ler os dois, e ficar, em seu íntimo, com o que achar mais compatível com sua visão de mundo. 

Como surpresa, em “Olhos Azuis” fica a sutil sugestão de que a jovem é filha do personagem com sua ex-namorada. 

O conto que dá nome à obra, “Tapete Verde”, também é de caráter romântico, porém de um amor que se vai esvaziando, com o crescimento do personagem como profissional e como político. Até que a jovem desiste:

 Ali, naquele instante, (ela) sentiu que o perdera, sentiu o peso esmagador da perda irreparável. Com lágrimas rolando pelas faces endurecidas pelo amargor da derrota sem remédio, ela se fixou na resolução definitiva. Sem Janary não valeria a pena viver. Sem ele seria como alma penada que vagasse sem rumo pela vastidão triste daquele campo que se estendia como um tapete verde (p.66).

Todos os contos são interessantes, escolhi alguns apenas para não extrapolar os comentários da obra.

4.5 Sete Causos Nanicos – 1985

A obra “Sete Causos Nanicos” (Ed. Sanfona), publicada em 1985, está incluída em “Tempo Frio” (1988), junto a outras crônicas, igualmente humorísticas. 

Como afirma A. Cantoni (2024), e eu endosso: “O humorismo revela o lado sério das coisas tolas e o lado tolo das coisas sérias.”

4.6 Erva-Mãe – 1986

Abre esta obra, “Erva Mãe”, o conto: “Ubirajara não veio à aula”.

O conto em primeira pessoa narra uma cena de sala de aula, a partir do momento em que Janary percebera faltar um colega, a sua frente, deixando-o mais visível à professora que lhe parecia muito austera: “Senti o olhar pesado se fixando em mim, áspero, hostil”. A voz fanhosa veio através do vão: ‘-Janary, vá ao quadro’.”(p.9)

No recreio comentavam que Ubirajara estava com uma doença grave no sangue. O Padre do Colégio levara-o para tratamento urgente na Capital.

Janary ficou triste, recreio sem graça, noite mal dormida. Imaginava o trem, no ritmo de sempre e o menino pálido e com febre gemendo deitado no banco do vagão. Começa a rezar “Pai nosso…” E sentia cada vez mais a ausência do colega.

Esse conto é bastante sintético e demonstra a intensa preocupação de Janary com o colega que estava faltando às aulas, tanto que repete as mesmas falas muitas vezes: “Os dias passam lentos, úmidos e chuvosos. Ubirajara não vem à aula. Falta alguém a minha frente. O vão continua me aproximando da megera. Cada dia mais feia, mais velha” […].(p.10)

Ubirajara não vem à aula

Os dias passam

E passam. 

Falta uma cabeça na fila da frente. 

O vão continua aberto

-Janary, vá ao quadro!

No recreio a notícia correu: 

O padre voltou.

Mas Ubirajara nunca mais veio à aula. (p.10)

A angústia do narrador a martelar em seus pensamentos. O tempo deixa de ser cronológico, totalmente afetado pelo emocional, para ser psicológico, o tempo interior. 

Um conto transpassado de emoção, comovente, a partir de um personagem criança que vive o drama do colega doente. Não consegue dormir: “Os olhos pesam, o silêncio é grande, todos dormem. Parece que nem ligaram.” (p.10)

O texto muito conciso, a habilidade na passagem do discurso direto, ao indireto, e ao indireto livre (pensamento) é marcante. “O recreio não teve graça. Recostei-me pelos cantos, quieto” (discurso direto); “Era por isso que ele parecia tão pálido? Era por isso que mostrava pernas tão brancas nos banhos do alagado?” (discurso indireto livre).

As últimas doze linhas soam como um poema moderno, o ritmo denota a trágica sensação e a atmosfera de tristeza. 

Quanto a essa trama, conta o autor, “Ubirajara, o colega de classe, era filho de um fotógrafo de Porto União e um dia deixara de frequentar a escola. Diziam que havia falecido, mas nunca se soube ao certo. O resto da história é pura imaginação” (Athanázio, 16/10/2023).

Esse conto faz lembrar o conto de Guimarães Rosa: “A terceira margem do rio”, em que o pai entra num barco e vai de um lado ao outro sem descer nas margens. E o filho narrador lamenta: “O rio. O rio. O rio. O rio pondo perpétuo”.

Em Erva-Mãe, conto que dá nome à obra, o personagem depois de uns dez anos ausente do local conhecido, pleno de florestas ao lado da estradinha, e de ervateiras em profusão, verifica, com desencanto: “que as matas desapareceram, devoradas na voragem impiedosa das serras sofisticadas e das inclementes serrarias e as ervateiras eram escassas.” (p.25)

Chegando à cidade, mais uma decepção: “Havia lá, à margem de uma rua central, a chamada erva-mãe, a erveira mater de que, na crença popular, todas as demais descendiam […] Pois ela também não existe, derrubada pelo tempo implacável e removida em nome do progresso.” (p.25)

 E percebe, mais adiante na estrada, outra ervateira tentando sobreviver, como símbolo da resistência. 

4.7 Tempo Frio – 1988

Essa obra destaca-se pelo humor, com várias nuances, mas com predominância das trapalhadas que fazem rir. “Uma questão de listas”, um trocadilho. 

O juiz afirmara que tudo estava bem, tudo estava certo. “A única coisa a lamentar é que tenhamos na defesa um advogado vestido de zebra.” (p.29) Ao final o advogado repete: “Tudo está bem, tudo está certo. A única coisa a lamentar é que tenhamos na presidência uma zebra vestida de juiz.”(p.29)

Em outro caso o escrivão pergunta ao delegado se pistola se escreve com um ou dois eles. E o delegado pergunta ao criminoso se a pistola do crime tinha um ou dois canos, e como era de dois canos, diz ao escrivão: “- Escreve com dois eles.” (p.46)

Certa vez juiz, promotor e advogado aguardavam impacientes uma testemunha, para iniciar a sessão.

Até que entra um “caboclão, molambento e desajeitado” que dizia não saber nada do crime. 

Até que, após várias perguntas, o juiz faz a pergunta decisiva: “- Então, o que o senhor veio fazer aqui? – Eu só vim buscar meu título de eleitor”(p.50)

Também muito interessante o humor doloroso na crônica “Sexta-feira 13”, que o povo tem como dia de azar. O relato trata do anúncio, numa sexta feira 13, do Ato Institucional n 5 que entrava em vigor. 

“Baixava sobre o país a noite da ditadura, a mais terrível que ele já conheceu. Iam começar as prisões, cassações, banimentos, confiscos, censura, iam iniciar as torturas e as punições por ‘delitos de opinião’” (p.70).

Sexta-feira 13 e Tempo Frio são a falta do humor: a angústia, o sofrimento, a escuridão.

A crônica “Tempo Frio” é, mais uma vez, referência ao clima do inverno dos Campos Gerais, em que vento e geada impedem de sair de casa e de apreciar a natureza. 

O personagem narrador chega a contar os passos, de tanto desespero. Caminha em volta da casa, vai para a rua, para a praça, tudo quieto e muito frio. Já contou os passos em cada direção e sabe de cor. “Estou gelado, o bafo sai pesado da minha boca, confusão na cabeça. Começo a voltar para casa. Não tem outro jeito. Triste, quase desesperado, um desespero quieto como as noites do lugar” (p.98).

4.8 São Roque da Ventania – Novela – 1993

Priano (Cipriano) filho da fazendeira viúva, tem de trabalhar duro e sonha conhecer outros lugares, além do seu. Vai às compras no povoado próximo, ganha uma cerveja, e vem voltando no seu fordeco F100, quando percebe, no alto do telhado de uma casa, uma moça loira, de blusa com mangas curtas e shorts, pernas muito brancas, sempre sorridente, falando com alguém dentro de casa. Quando ela volta para dentro, ele liga o carro e segue. “A figura da moça se recortava nítida contra o encarnado do céu, revelando todas as curvas de um corpo atlético. Priano teve um baque no coração, ficou meio sem fôlego. Nunca tinha visto moça tão bonita, nem sabia que pudesse existir” (p.09).

A novela São Roque da Ventania é ambientada, em parte na cidade, na capital, onde o protagonista Théo deveria estudar, mas tornara-se boêmio: apreciando cerveja, belos trajes e mulheres; outra parte no interior, em que vive a família dos alemães Herr Heidrich, e a filha Trudi, com sua empresa, e, logo adiante, a fazendeira Siá Carola e seu filho Priano.

O tema da obra é a paradoxal questão do amar e ser ou não correspondido, de onde advêm por vezes tristezas, e, por vezes, novas oportunidades de ser feliz com outra pessoa (aconteceu com Trudi), após dolorosa decepção, ou conforme a pessoa, a perda do sentido de vida (como foi o caso do Priano). 

E fica ainda a questão de um amor desenraizado, sem compromissos futuros, mutante ao sabor do vento, como o do conquistador (no caso, Théo). E quantos outros tipos de amor devem existir? No entanto, movem meio mundo.

O lugar com nome de São Roque ficava no antigo distrito de Rio da Várzea, atual município de Vargem; a denominação da localidade São Roque aparece na década de 1940, com a instalação das serrarias. 

Por ter altitude de 930 metros e ser plana, sempre a região foi sujeita à presença dos ventos. Com certeza o título da obra é referência a esse fato.

4.9 A Gripe da Barreira – Causos do Ermo – 1999

Essa obra apresenta várias histórias algo pitorescas, pelas circunstâncias e acontecimentos inusitados e pouco previsíveis. São dezoito histórias curtas, misto de contos e crônicas, os cronicontos, como alguns autores chamam. 

A capa traz uma foto feita por outro escritor e pesquisador da história, famoso na região, Fernando Tokarski, intitulada “Sinais do Outono”, uma árvore com poucas folhas, num cenário de mato quase seco.

Além da narrativa fluente da linguagem do “ermo”, ressaltam nessa obra certas atitudes e costumes de então: a realização de uma visita festiva; o modo como o fazendeiro paciente ouve, consola e atende a coronela, sua esposa, quanto à montaria; como uma senhora de origem germânica cria gatos na coleira, dentro de casa, apesar do forte odor; como participam de um velório; como os pobres sentam-se confiantes à soleira da porta das casas e aguardam um prato bem cheio de comida, e depois se afastam de leve; como um fofoqueiro frequentador de bodega comenta tudo que vê, em geral, com maledicência, até que o alvo de seu grupo seria sua mulher; o provocador de pendengas e processos na justiça; a violência em família; a moça apaixonada não correspondida; o heroísmo e técnica para matar uma onça; a resiliência e tristeza ante as chuvas, frio, barro, doença e morte; o carroceiro em dia de chuva e lama com seu respeito ao bispo, pedindo licença para xingar as mulas… 

Esse livro, como os outros que já estão esgotados, precisa ser reeditado, para que não se rompa a cadeia histórica do tempo…É a região, o país, a humanidade, sendo retratada sob a lupa literária do autor.  

4.10 O Cavalo Inveja e a Mula Manca – 2001

Destaco, nessa obra, o conto “Como casei-me com a filha do Coronel”. É um texto narrativo-descritivo, cheio de peripécias, com diferentes nuances emocionais, até que, após uma série de trabalhos árduos, o protagonista vence o desafio de apresentar um dote de um milhão de cruzeiros. O narrador relata, de forma bem-humorada e metafórica, os trabalhos e situações difíceis por que passou até voltar a visitar sua amada. 

Dessa vez cheguei pisando firme, falando grosso, exigindo a presença imediata do fazendeiro. Com a pasta preta numa das mãos, puxando o carneiro com a outra, atravessei destemido o deserto do pátio, indiferente aos ‘inimigos’ e me postei na porta. Surpreso, assustado, o Coronel compreendeu de pronto que eu tinha vencido o desafio (p.64).

Impressionante também é “O Natal de seu Berilo”, um administrador carioca, sempre mal-humorado e rude, que se transformava, em dezembro, preparando uma festa natalina para toda a comunidade. 

Era uma vila calma, sem movimento. Apenas o trem misto do Norte fazia o povo afluir. 

Nessa vila ficava a maior madeireira da região. E seu Berilo era o administrador carioca, “exilado naquela biboca arredia de civilização, como ele não se fartava de repetir (p.65).

No Natal ele era tomado de alegria e generosidade. Ia com sua esposa, Malvina, ao Rio de Janeiro comprar os preparativos para a festa: luzes, presentes, roupa de Papai Noel para ele. O responsável pela usina devia estocar madeira serrada para alimentar a caldeira. “Na véspera de Natal a luz deveria varar a noite, sem apagar pelas dez horas, como de costume.”(p.66) 

Bancos, mesas, lugar para assar o churrasco, carne da melhor, e o convite a todos. 

No dia da festa ele se realizava, primeiro como Papai Noel, ao toque do “Jingle Bell’ ele aparece. Malvina recebia a todos. Todos comiam e bebiam “gasosa de framboesa’’ e ganhavam seu presente. Aos poucos iam indo embora. “No céu límpido e sem nuvens a lua brilhava e as estrelas piscavam. Pareciam alegres com a transformação daquele homem.”(p.69)

Como bom carioca realizava-se com a multidão festiva, com que, ao menos no Natal, podia conviver e manifestar-se feliz, nessa vila em que o silêncio e a rotina dominavam, além das responsabilidades como administrador. As ilustrações desses contos são sugestivas e favorecem a imaginação do leitor. 

4.11 O Mundo Índio – 2003

O segundo conto desta obra relata o batizado de um indiozinho, Tipoti-Mirim. Muito comovente essa história, que revela todo o peso da discriminação do indígena, e de sua pobreza, e sobre o orgulho do pai, ao levar o filho, batizado, nos braços. 

“Com o filho nos braços, Tipoti-Guaçu abanou para os compadres antes de descer o coxilhão no rumo do toldo, agora levando um cristão novo.” (p.77)

Em “Indiologia Militante”, no artigo “Donos da Terra”, Enéas narra como ela (sua mãe) e seu padrasto se tornaram compadres do cacique Caigangue, Tipoti. 

Sabemos que o autor tem estudado e publicado artigos sobre a indiologia, como na obra Indiologia Militante, em que declara: “Nós não apenas estudamos o índio, em especial o guarani, mas estamos lutando por ele. Praticamos uma ‘indiologia militante’ e esse é o espírito que nos anima” (p.39). Aqui o autor se refere a ele e a Marco Marques e outros, que fundaram a associação cultural Nheçuanos, com o jornal chamado Nheçuano, liderado por Marco Marques (p.47).

Nessa obra Athanázio resenha e explicita a importância da indiologia e indica autores que trouxeram à luz questões diversas, referentes ao relacionamento do branco europeu com os povos originários e qual a mentalidade que os impulsionava a agir com preconceito, crueldade e autoritarismo.  

4.12 O Campo no Coração – 2012

Dos 22 contos dessa obra, três foram reunidos a outros que compuseram Mundo Apartado: “A Primavera”. São eles: “A Reconvença”, “O destino da Primavera” e “Promessa vã e mirabolante”. 

O conto “A Reconvença” tem muito suspense. O protagonista conta, em primeira pessoa, sua viagem da fazenda de seu patrão, Nhô Pré (Elísio Leite Preto) até a fazenda do amigo do patrão, desviando a estrada, para não ser percebido. Ia levar um comunicado ao fazendeiro Siô Jardo, de que estavam preparando uma cilada para ele. Ele devia se preparar para se defender. Mas a viagem difícil, pelo mato, em território íngreme e desconhecido, demorou. Quando chegou perto e avistou a fazenda, sofreu o baque da realidade: “Meu coração se apertou e senti vontade de gritar contra os amaldiçoados que praticaram aquela judiação. A reconvença de Nhô Pré não adiantou. Cheguei tarde demais.”(p.13)

Tudo tinha sido devorado pelo fogo criminoso.

Esse conto revela bem a linguagem do homem do interior, naquela região. A descrição precisa e minuciosa, na linguagem sertaneja de então, dão ao conto uma característica especial, permitindo visualizar as pessoas, os animais e o cenário. Uma riqueza de expressão da região sul, onde se podem perceber influências diversas, vindas do espanhol, do italiano e do português, por ser uma parte do trajeto dos tropeiros de São Paulo ao Rio Grande do Sul e vice-versa, surgindo ali o povoamento com esses e outros grupos dessas origens. 

Como exemplo:

E meu compadre Jardo está no paiol, lidando com as roças, lá nas terras do Entre-Rios. Ele não sabe de nada, é sojeito de ser pegado de supetão, sem tempo de armar defesa. Por isso mandei lhe chamar: você tem que levar prele uma reconvença avisando. Isso tem que ser feito na moita, porque podem ter bombeiros vigiando. Você carece de viajar pelo meio […]. (p.7)

A obra Campo no Coração foi criteriosamente analisada pelo ensaísta, crítico literário, cronista, tradutor, colaborador de jornais e revistas, membro efetivo da Academia Brasileira de Filologia e da União Brasileira de Escritores, Francisco da Cunha e Silva Filho (2018). Segundo esse autor, os textos são: dez contos, dez crônicas e dois híbridos entre conto e crônica.

Muito interessante a observação de Cunha e Silva: “[…] Pois Aristides, o narrador protagonista toma as rédeas da linguagem da sua condição cultural e daí eu haver acentuado que, neste primeiro conto do livro a linguagem literária joga um papel privilegiado na urdidura do conto” (p.14).

Quanto ao costume de cumprimentar com as pontas dos dedos, em especial entre homens, diz Athanázio (2024): “Creio que é uma atitude machista. Não pega bem dois homens apertarem muito as mãos.”

Outro costume era o de as famílias mais pobres entregarem um ou mais filhos para serem criados por famílias mais abastadas. Esses filhos adotivos (crias da casa), em geral meninas, depois, dedicavam-se aos serviços domésticos. Se menino, viria a ser um peão de confiança. Alguns ficavam a vida toda com essa família, outros, saíam para se casar. Neste caso, recebiam presentes que favoreceriam sua nova vida (Athanázio, 2024).

 Um exemplo, neste excerto do conto “Maná João, Melancieiro”, em que a família se prepara para um passeio à fazendo vizinha: “Em pouco tempo a casa se movimentava. Tanto a fazendeira como as duas filhas e a Ceição, cria mais velha da família, se entregavam à aprontação para o passeio programado e pelo qual tanto ansiavam” (Gripe da Barreira, 1999, p.7).

4.13 Mundo Apartado: A ‘Primavera’ – 2014

O título: Mundo Apartado: A ‘Primavera’ refere-se ao distante e imenso espaço ocupado pelo fazendeiro Nhô Pré, onde tudo ficava sob suas ordens, até a política.

“Fazendão desguaritado de grande, que ocupava quase todo o Fundão. Principiava no Portão do Alto, num cotovelo da geral, e rumava por ela até o Pito Aceso. Pela outra banda, beiradeava a estradinha estreita e curva, até os fundos do Aranha.” (p.07)

Essa obra tem a estrutura de um romance, cujo núcleo é a formação e crescimento da Fazenda, até a mudança do proprietário. 

Cada capítulo (conto) traz sua trama: o crescimento devagar dos domínios da Fazendo, a ponte feita às pressas por motivo político, o suicídio do capataz desesperançado durante uma viagem, a comunicação frustrada com o amigo de Nhô Pré (compadre Jardo), os bugres na fazenda e os sobressaltos, a prisão do assassino de Nhô Jardo, a transformação da vida de Aristides. 

Tudo mudou: Nhô Pré, arrependido de mandar matar os bugres, foi para a cidade; a propriedade de Nhô Jardo foi destruída; Arestides começa vida nova e a Fazenda Primavera tornou-se uma vasta lavoura de plantação mecanizada de soja.

Como os personagens principais de cada conto se repetem, os núcleos narrativos se cruzam em harmonia, dando à obra toda a atmosfera, cenário e suspense necessários a um romance. 

Pode-se indicar como protagonista o Nhô Pré, e como antagonistas os políticos adversários a ele, os bugres, o suicídio do Siô Borges, a atuação destruidora na fazenda do amigo, o insucesso da reconvença; a crença em assombração, o arrependimento de Nhô Pré por ter contratado o bugreiro Martinho; a venda de Fazenda Primavera, já em decadência. 

4.14 O Reduto de Nhô Ná – 2015

A primeira parte da obra é constituída de crônicas: a primeira, sobre o conhecimento das aroeiras, de muito humor; depois vem a tristeza da perda de um amigo de infância; a presença de um bisbilhoteiro leva-e-traz na cidade; a viagem a uma cidade de portas fechadas.

Depois dessas, vêm cinco, referentes ao Contestado: em Irani, Matos Costa, Calmon. Em Calmon ficava uma das sedes da Southern Brazil Lumber Colonization Company, que explorava as madeiras da região, afastando os moradores, deixando-os sem suas terras, causando grandes conflitos pelos caboclos, conhecidos como jagunços, revoltados com a empresa e dispostos a acabar com tudo que a ela pertencesse. 

Em cinco e seis de abril de 1914, chegou a vez de Matos Costa e Calmon. A primeira […] foi atacada e incendiada com rara violência, sob o comando de Venuto Baiano. Todos os homens adultos foram mortos e o fogo lavrou, nada restando da vila e das instalações ferroviárias. Em Calmon, a serraria Lumber, símbolo do poder estrangeiro, foi reduzida a cinzas (p.45-46).

Esse interesse histórico pelo Contestado é devido ao autor ter vivido a sua infância naquela região e ter ouvido relatos aterradores sobre a cruenta destruição daqueles locais.

Na segunda parte da obra, estão os contos. O primeiro, “O Amigo Velho”, descreve o personagem Rio Iguaçu, com quem o narrador conviveu desde criança, depois como adolescente e, mais tarde, como adulto, visitando Porto União e rememorando suas aventuras. É a melhor descrição desse curso d’água já cantado em prosa e em versos.

Esse conto também está incluso na obra “O pó da estrada, vol.2”.

O segundo conto traz “A Curta e Sangrenta Estória do Reduto de Nhô Ná” (Genoval Campolim). Nhô Ná viera de Entre-Rios, local de muita violência, onde ferira uma pessoa e era procurado pela família e pela polícia. Fundara, com capricho, a Fazenda do Taboão, muito bem cercada como uma fortaleza: Por que tanta segurança? “Aquele cercado fechado, de rachão […]. É um madeirame tão grosso que não passa nem bala de mosquetão.” (p.64) Aí começa o suspense. Por um tempo, estava quieto e ninguém o perseguia. Mas teve logo vontade de ir a lugares onde houvesse cerveja, muita conversa, mulheres… e levava peões como segurança, bem trajados, e começou a chamar a atenção dos frequentadores que passaram a evitá-los. 

Apesar de o delegado aconselhá-lo a ser mais discreto, ele fazia o contrário. Diversas vezes a justiça tentou prendê-lo, mas seus olheiros o avisaram e ele se escondia no mato, em cabanas. Os policiais estavam saturados pelo fracasso.  

Até que, certa vez, cercaram o local de suas extravagâncias festivas, o Buraco Quente, e quando ele saiu para buscar mais cerveja em outra casa, foi baleado e morto. “Foram quatro anos dessa curta e sanguenta carreira, do general Campolim, apelidado Nhô Ná.”(p.72)

É comum o valentão desafiar as autoridades com sua astúcia ou artimanhas.

4.15 A Conquista: novela e crônicas – 2017

A novela “A Conquista” apresenta a vida de um advogado, desde o início de seus trabalhos, em pequena comarca, até que decide ir para a capital, e ali vai conquistando espaço, numa rádio, depois na Câmara de Vereadores, por fim, vereador combativo e eficiente. Com o golpe de 1964: “Nas sessões da Câmara, protestava com veemência contra a situação.” Perseguido e cassado de seu cargo, inscreve-se para participar da guerrilha de Caparaó, junto com vinte combatentes treinados. Porém foram denunciados por alguns moradores do lugar e ninguém mais ouviu falar de J. J. Mourão. “A noite escura do obscurantismo e da intolerância recaiu sobre o país” (p.33).

Como ele e seus companheiros, muitos outros jovens cultos brasileiros foram retirados da vida, sem deixar marcas: mortos, presos, torturados, exilados… uma sem-fim de sofrimentos pela perda da liberdade

Os demais textos dessa obra são crônicas, das quais destaco “7 de Setembro”, que revela o preparo com esmero, dos estudantes para que o colégio superasse os concorrentes, seja pela banda, pelo uniforme, pelo garboso desfile em si.

O narrador lembra que no primeiro ano de estudos teve de usar sapatos novos, que machucavam os pés. “E se isso não bastasse, o quepe não cessava de girar na minha cabeça. Além de ser o último do último pelotão.”(p.51)

Experiências doloridas e inesquecíveis, mas cheias de civismo. 

Com esta obra Athanázio completa cinquenta livros.

4.16 Dinarte de Entre-Rios & Outros Viventes – 2018

No conto Dinarte de Entre-Rios “sojeito Maleva”, o próprio Dinarte relata sua vida desde criança, até que, de pequenos a maiores maus-feitos com as más companhias, de crianças, mais tarde de adultos, como o Bonifácio, que o levam a substituir o trabalho honesto pelo ganho criminoso, como assassino pago para matar, até que dele se vingaram, deixando-o fraco e “paralítico, sem cura, nem remédio”.(p.26) 

Esse conto é mostra de como surgem as pessoas sem ideais elevados, sem gosto pelo trabalho, sem princípios morais norteadores. 

Nos demais contos sobressaem: disputas político-partidárias violentas; marido e mulher sempre assustando a vizinhança com suas brigas; um médico de costumes estranhos que se instala na cidade; um fazendeiro bem-sucedido, que cai em depressão total; um advogado que recebe do cacique do Toldo do Quati, como presente, uma de suas filhas e mais uma pedra valiosa; o desespero do senhor apelidado Cacaco, que subitamente perde sua capacidade de ler e escrever; entre outros temas. 

Mas o grande destaque vem da linguagem, aqui comentada em capítulo especial. É um valioso repositório de expressões populares manifestantes de seu modo de ser e de viver. 

4.17 Livro sobre livros vol.4 – 2023

Como estamos apreciando apenas a produção de literatura stricto sensu (crônicas, contos, novelas), destacamos a parte I dessa obra, que traz seis contos, todos muito interessantes. O primeiro “A Honra da Família”, tem como tema uma atitude comum no passado, quando o pai da namorada ficava sabendo que ela estava grávida antes de se casar. 

Quanta moça foi mandada embora de casa pelos pais, ao saberem da gravidez… 

No interior, em caso de dúvida, o namorado corria risco de morte. Agora, a maioria das famílias aceita a liberdade dos namorados, e a própria lei ampara os casais que tenham vínculo comprovado, mesmo sem os documentos do cartório e da igreja. 

“No dia seguinte, muito cedo, o capataz e mais quatro homens escolhidos entre os peões mais valentes, encilharam as montarias para uma jornada até a cidade. […] todos armados de revólveres, partiram no cumprimento da missão determinada pelo patrão” (p.15). 

O restante da obra traz artigos preciosos sobre a obra e vida de Humberto de Campos, Gilberto Amado, Guimarães Rosa, Vargas Vila, Stefan Zweig e Georges Simenon. 

  1. Linguagem nos contos

Como leitor apaixonado por bons livros, Enéas descobriu mil e tantas possibilidades linguísticas e criou um estilo todo seu de escrita, que reflete, de certo modo, seu temperamento: poucas palavras e equilíbrio emocional.

O texto flui translúcido como um pensamento, com matizes de humor sagaz e complacente, pouco explícito, como quem ri apenas com os olhos. 

Com os detalhes, frutos de observação atenta e de uma memória sinestésica extraordinária, constrói, com imaginação e criatividade, todo seu mundo ficcional em que realidade e fantasia se tornam um só elemento do conto.

Não existem compartimentos: descrição, narração, ação. São concomitantes e dinâmicos. 

Os personagens são conhecidos por apelidos, em geral, bem mais sintéticos que seus nomes e são capazes de surpreender: Nhô Pré (Elísio Leite Preto); Nhô Jardo (Jardelino Procópio); Major Lica (Policarpo Vieira); Nhá Derfa (Delfina); Nhá Zabé (Isabel); Nhô Rico (Henrique Paiva); Nhô Ná (Genoval Campolim); Siô Godó (Artulino Godinho); Tio Tino (Juventino) e assim por diante. 

Chamam a atenção, também, certas expressões de indignação, crítica ou desapreço, frequentes entre alguns personagens, como revelando seu estado de espírito: 

“Aquilo é um calavêra!”

“Gente Maléva aquela…” (Mundo Apartado: “A primavera”.) 

“É um sojeito malacara esse meu cunhado Jango.”

“Este mundão seria muito melhor se não tivesse tanta gentinha malacara.”

“Alapôtcha!” (Dr. Bicas dizia sempre)

“Ara ara! Reunião de política, excogitou. Não há nada mais aborrido.”

“Ele vorta, ara se vorta!” é pura embusterícia.

“O casal se fiadeputiava aos berros…”

“Que leve a casqueira! O caipora que me justou bebia, andou tramelando demais no bar e eles descobriram.” (Dinarte de entre Rios e outros viventes)

“Sojeitinho Jaguara! Hominho sem fiança!” (Tempo frio)

A obra Dinarte de Entre-Rios & Outros Viventes emprega a linguagem coloquial popular, eivada de termos próprios do interior catarinense, gírias, termos antigos e derivações. Exemplos: “gente à toa, que véve percurando quem inventou o serviço…”; “entregaram prele; ficou tiririca; cheguemos; viajemos” (no tempo presente do indicativo), o que é comum em muitas regiões do País; “me dava um impre (ímpeto) de chorar.” Acréscimo de “a” em frente aos verbos: aprocheguei, achegando, arrecebi, aperseguiram, amontava. Uso especial de haver, indicando suposição: “eu havera de contar uns 8 anos…”; expressões como: “para móde encher os dias…”; “bispando pelo vão da cerca” (observando sigilosamente); “não pode tramelar para ninguém (não pode tagarelar, falar)”; “umas pelegas na minha algibeira”; uso do sufixo “ote” para indicar pequena quantidade, diminutivo “um tantote”.

Mas a obra como um todo tem termos muito presentes no contexto social de então, da qual segue uma amostra: queimor do Sol; um rastaquera (rude, ignorante); piazada pobre suja e malacafenta (doente); aquilo é uma rafuagem; eu le exprico, le exprico; o tchô (derivado de tchê) foi o maior guaju (algazarra); chasquearam (zombar) da minha fala; um cuéra (valente); um ventana (malandro sem juízo); um virado no quéaquilo;  desdali; inconvidou. 

Costumavam chamar de “tio” as pessoas íntimas ou queridas, “Tio Tino”, Tio Liba. 

Enéas explica em entrevista (18/11/ 2023): Reconvença (recado, mensagem, aviso urgente, e também um presente); Nhô e Siô eram facultativos. Mas parece que Nhô era para pessoas de nível social mais elevado: Nhô Gaspar, Nhô Marco; “Senhoreante” quem ocupava a terra passava a ser “senhoreante” não era dono nem posseiro. A Constituição de 1891 declarou devolutas as terras desocupadas ou sem dono.

  1. Considerações Finais 

Após o estudo minucioso e atento das obras literárias do autor Athanázio, podemos destacar como a aparente simplicidade das tramas e dos fatos narrados oculta um mundo difícil, cheio de peripécias e de perigos, devido ao momento de início da colonização: em que as pessoas se aventuravam a ali fazer sua vida, mesmo sem contar demais com um grupo social já estabelecido, podendo encontrar os agressivos, os arrogantes, os traidores, os assassinos, além das famílias pacatas e seus peões e criados de sua confiança. 

Lutavam valorosamente para progredir com suas fazendas de lavoura e criação de gado, num tempo de pouca tecnologia aplicada a esses setores produtivos. Possuíam sua fé e frequentavam a igreja e suas festas. Divertiam-se também com as corridas de cavalos. 

A casa grande do fazendeiro, bem no alto, a cumplicidade e atenção total dos peões com seus patrões, que, em geral, os tratavam bem, mas com força de autoridade. A mulher também submissa ao seu marido, embora reconhecendo, muitas vezes, que ele estava enganado em seu ponto de vista e modo de agir, tentando convencê-lo a ter diferentes formas de resolver os problemas. 

A política partidária transformava os coronéis fazendeiros em cabos eleitorais, sempre sujeitos a promessas, segundo as reivindicações do seu domínio. Com isso se estabelecia a liderança dos proprietários maiores sobre toda a região, como aconteceu por todo o país, conforme a história. 

Como nem todos os contos referem-se a um passado muito distante, do início do povoamento, mas a momentos posteriores ou até atuais, ou puramente ficcionais, estabelecer limites temporais para as narrativas seria pouco plausível. O próprio autor, em entrevista a mim concedida (2024) afirma: “Mas, apesar das mudanças impostas pelo progresso, tudo está do mesmo jeito.”

Isto é, são dois movimentos simultâneos da História: o que faz permanecer e o que faz mudar. 

Amor, humor, fé, política, trabalho, fracassos, decepções, crendices, medos e mistérios, tudo que é humano, vamos descobrindo com a leitura-fruição e a releitura-estudo. Leituras muito gratificantes, em que o leitor se perde na fantasia, na linguagem, nas emoções, e se encontra, de volta, feliz pelas descobertas, pela vivência athanaziana incorporada à sua. 

As obras athanazianas repercutem por todo o Brasil, nas competentes vozes de escritores, jornalistas, críticos literários, e mesmo, de leitores assíduos. Pedro Alberice da Rocha, Doutor em Letras, Professor da Universidade Federal do Norte do Tocantins, dá um exemplo de atuação pedagógica construtiva: deu a seus acadêmicos de Geografia, em 2021, a atividade de cada um fazer breve resenha de uma obra do autor Enéas. Com as resenhas, organizou e publicou um livro. (Rocha, 2021) Dessa forma, Santa Catarina se aproxima dos tocantinenses.

 Dutra, em seu Lunário do Farol (24/10/23) afirma, e eu endosso, que, mesmo depois de cinco décadas, as narrativas de Peão Negro (1973) – bem como toda a obra de Enéas Athanázio – continuam literariamente atuais, dignas de serem lidas e relidas, estudadas e divulgadas

Sua obra abre janelas para a Antropologia, para a História, para a Geografia, para a Linguística, para a Literatura, entre outras áreas do saber. Basta saber apreciá-la.

              Athanázio põe nas palavras um poder, que lhe é peculiar como escritor: torna visíveis e sensíveis os cenários e tramas relatados… Daí provém todo o encantamento de sua obra, que merece ser reeditada em seu todo.

Fahena é professora universitária da UNIUV, escritora e reside em Florianópolis.
  (Divulgação)
  1. Referências

ATHANÁZIO, Enéas. Peão Negro. São Paulo: Ed. Do Escritor, 1073.

__________, O Azul da Montanha, São Paulo: Ed. Do Escritor, 1976.

__________. Meu Chão. São Paulo: Ed. Do Escritor, 1980.

__________. Tapete Verde. São Paulo: Ed. Do Escritor, 1983.

__________. Sete Causos Nanicos. Ed. Sanfona, 1985.

__________.  Erva-Mãe. São Paulo: Ed. Do Escritor, 1986.

__________. Tempo Frio. São Paulo: Ed. Do Escritor, 1988.

__________. São Roque da Ventania. Novela. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 1993.

__________. Rosilho Velho. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 1994.

__________. Solidão, Solidão. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 1995.

__________. Vida Confinada. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 1997.

__________. A Gripe da Barreira. Causos do Ermo. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 1999.

__________. Cavalo Inveja e Mula Manca. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 2001.

_________.   Mundo Índio. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 2003.

_________.   José Athanázio, meu pai. Balneário Camboriú, SC: Minarete, 2009.

_________.   O Campo no Coração. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 2012.

__________. Mundo Apartado “A Primavera”. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 2014.

__________. O Reduto de Nhô Ná. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 2015.

__________. A Conquista – Novela e Crônicas. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 2017.

__________. Dinarte de Entre-Rios & Outros Viventes. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 2019.

__________. Livro sobre Livros. Vol.4. Balneário Camboriú, SC: Ed. Minarete, 2023.

__________. Enéas Athanázio, vida e obra. [Entrevista concedida a] Fahena Porto Horbatiuk, de novembro de 2023 a maio de 2024. 

__________. Eneida Ribas. A família Athanázio. [Entrevista concedida a] Fahena Porto Horbatiuk em 18 de outubro de 2023.

BLASI, Paulo. Campos Novos. Um pouco de sua História. Florianópolis, SC: EDEME, 1994.

CANTONI, A. Calendário. Petrópolis, RJ: Vozes, 2024 (Dia do Humorista)

CAVALCANTE, Rodolfo Coelho. Enéas Athanázio: Filho Ilustre de Santa Catarina, que honra e glorifica as Letras de seu País e o Ministério Público. Literatura de Cordel n.º 767, 1ª ed. Salvador, Bahia: Odeum, 1986.

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