O Hospital Municipal Ruth Cardoso, de Balneário Camboriú, há anos enfrenta desafios que vão além do atendimento à saúde. Apesar de ser municipal, a unidade atende também as cidades vizinhas como Camboriú, Itapema, Porto Belo e Bombinhas, o que historicamente sobrecarregou sua capacidade e ainda abriu precedentes sobre a injustiça de somente Balneário pagar a conta.
A situação melhorou com a abertura do Hospital de Itapema e melhorias no atendimento em Camboriú, além do reforço de verbas para sua manutenção, mas a estrutura ainda sofre com problemas que comprometem a qualidade do serviço.
Em 2024, o hospital enfrentou graves denúncias de negligência médica após o falecimento de bebês, manchando sua reputação e evidenciando a necessidade de uma gestão mais eficaz.
Com a posse da prefeita, Juliana Pavan, a enfermeira Andressa Hadad assumiu, no dia 30 de dezembro, a diretoria da unidade.
Em entrevista, Andressa revelou o cenário encontrado e os passos para transformar o Ruth Cardoso em referência de saúde pública.
Acompanhe o relato:
Uma estrutura gigante e desorganizada
“Quando assumi, no dia 30/12, foi um susto muito grande. Sabíamos que haviam muitas inadequações e falta de processos. A percepção dos primeiros dias é que estava sem gestão, de todas as áreas – não havia execução de processos, de acolhimentos, de práticas, técnicas e normativas.
São 700 pessoas, entre elas 69 enfermeiros, fora os técnicos de enfermagem, que são em número muito maior. É uma estrutura gigantesca, se for mapear há cerca de 110 a 120 áreas internas, mas completamente desorganizada”.
Ao assumir, ela se deparou com um ambiente sem gestão
“Os processos de acolhimento, práticas técnicas e normativas simplesmente não existiam. Cada um fazia o que sabia, mas sem um comando, o que gerava fluxos instáveis e insegurança para os pacientes. Percebi também um grande desgaste da equipe, que estava desmotivada e temerosa, acreditando que seriam perseguidos ou demitidos em massa com a nova gestão municipal”, disse, acrescentando que percebe um esforço muito grande dos funcionários querendo fazer atendimentos acontecerem, mas que por falta de gestão havia muita dificuldade”.
Outro problema: falta de reuniões
“Na quinta-feira (9) fiz a primeira reunião com os enfermeiros, e eles comentaram que nem lembravam a última vez que tiveram esse tipo de encontro. Sem isso, como alinhar processos e garantir qualidade no atendimento?”.
Estrutura física precária e falta de gestão de espaços
Andressa descreveu o estado precário das instalações: paredes quebradas, chão rachado, sanitários com problemas, pias quebradas e salas desativadas, que se tornaram depósitos de arquivos (papelada misturada, de RH, prontuários, etc) e equipamentos quebrados.
“Descobrimos 10 macas ainda na garantia que estavam paradas porque ninguém pediu conserto”, comentou.
Esses problemas impactam diretamente o fluxo do hospital. O Pronto-Socorro (PS), que deveria ter uma área de medicação rápida e observação, é praticamente inteiro com espaços para clínica médica. O local onde os pacientes deveriam estar sendo medicados e em observação para saber se precisam ir para a internação é uma área onde ficam em poltronas, pois os demais leitos são todos para clínica médica.
“Chegamos a ter pacientes relatando que ficaram até três dias em cadeiras, porque não havia leitos disponíveis. Isso é inadmissível e reflete a falta de gestão de processos”.
Reestruturação e planos para o futuro
Uma força-tarefa foi montada para organizar os arquivos e liberar espaços para novos leitos, pensando em acomodar a clínica médica do PS e então abrir espaço para atender os pacientes da área de medicação rápida e observação.
“Estamos ajustando documentações e readequando locais para abrir mais leitos na clínica médica. Só assim conseguiremos aliviar a superlotação do PS e garantir que os pacientes tenham o atendimento adequado”. Ela afirmou que essa é a ‘primeira prioridade’ da atual gestão do hospital.
A equipe de gestão também passou por reformulações. Hoje, possuem uma equipe técnica e capacitada.
“Nosso diretor é médico, com 10 anos de experiência no Ruth Cardoso, e outros coordenadores possuem especializações em seus respectivos setores. Isso é fundamental para seguir as diretrizes do SUS e garantir uma gestão eficiente”, comentou.
Resultados iniciais e perspectivas
Os primeiros 10 dias da nova gestão já trouxeram mudanças significativas, segundo Andressa – os funcionários estão mais contentes, sentindo-se acolhidos e acreditando que a transformação é possível. Andressa também relatou ao jornal os números de atendimento – quando ela foi secretária da Saúde, na época da pandemia de Covid-19, o volume de atendimento era enorme, mais de mil/dia, e hoje por conta da abertura do Hospital de Itapema e também melhorias em Camboriú e ainda as UPAs dos bairros Barra e Nações, houve diminuição – de quinta para sexta (9 para 10) o PS do Ruth Cardoso fez 183 atendimentos no PS Adulto e 53 no Pediátrico – enquanto isso a UPA do Bairro das Nações chega a 700 atendimentos/dia agora durante a temporada.
“O que de fato é o fluxo correto porque a UPA é para casos de menor complexidade e os maiores para o Ruth. Nos primeiros cinco dias do ano atendemos 711 pessoas no PS Adulto e 229 no Pediátrico. Números de parto que eram 350/mês também diminuímos – em dezembro foram 150, por conta da abertura do Hospital de Itapema. Também estamos conseguindo atender mais moradores de Balneário, que sempre foi o nosso foco – na última noite (quinta-feira, 9) foram 105 moradores de Balneário atendidos, 46 de Camboriú, quatro de Itapema, quatro de Porto Belo, três de Bombinhas, cinco de Itajaí e 16 de outras cidades”, acrescentou.
Luz no túnel
Apesar das dificuldades e desafios, Andressa mantém uma visão otimista e diz que vê luz no fim do túnel e afirmou que aceitou o cargo por amor o Ruth Cardoso e o SUS, que descreve como uma ‘ferramenta maravilhosa e totalmente possível de ser colocada em prática’.
“Meu objetivo, junto com a equipe e a prefeita, é transformar o Ruth Cardoso em um ambiente onde as pessoas se sintam seguras e acolhidas. Toda vida importa, e nossa missão é salvar vidas. Vejo que hoje quando as pessoas falam ‘preciso ir para o Ruth Cardoso’ é com medo, e nós vamos trabalhar para mudar isso. O sol vai voltar a brilhar no nosso hospital. E não apenas com melhorias estruturais, mas com vidas sendo salvas. Esse é o nosso principal objetivo”, completou.