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Balneário Camboriú
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Carmen Wegner: proprietária da clássica padaria Tuti’s compartilha memórias do turismo e rotina de Balneário

Corridas de carro na Brasil?…de cavalos na Rua da Raia hoje Rua 2300? e a Pedra da Vaca, perto da Ilha das Cabras…

Não há moradores de Balneário Camboriú que não conheçam a Tuti’s Pão, padaria e café mais famosa da cidade, localizada na Avenida Brasil há quase cinco décadas. O case de sucesso tem história iniciada em 1972, quando foi fundada pelo casal Edgar Wegner (falecido) e sua esposa, Carmen Wegner, a Dona Carmen. 

Inauguração da Tuti’s, ainda com a placa de PANIFÍCIO (Arquivo Pessoal)

Aos 87 anos com uma memória e uma energia extraordinárias, Dona Carmen recebeu a reportagem do Página 3 para esta entrevista especial sobre o aniversário de Balneário Camboriú, dividindo suas histórias (receitas de sucesso, como as tortas de queijo e de granola) e visão de futuro desta cidade que a encantou há tantos anos, quando se mudou para cá vinda do Mato Grosso, com os filhos Ingrid, Gilson, Ewerton e Edgar.

Acompanhe:

(foto Renata Rutes)

Do Mato Grosso para Santa Catarina 

Meu nome é Carmen Wegner, tenho 87 anos, 
Nasci em julho de 1934, Campo Grande, 
Hoje é Mato Grosso do Sul, mas naquela época 
Era Mato Grosso só. 
Vim pra cá em 1963, 58 anos morando aqui, 
Por isso eu não me considero mato-grossense e sim 
Catarinense! E digo para todo mundo 
Que aqui é o melhor lugar para se morar. 
Nós viemos para cá porque o meu marido estava 
Um pouco adoentado, a pressão estava alta, 
e o médico falou que ele precisava morar no nível do mar. 
Como a mãe dele já morava aqui, 
Nós viemos pra cá. 


Casa na Rua da Raia 

Nós viemos de mudança, compramos uma casa 
Na Rua da Raia. O que que é uma raia, é onde tem 
corrida de cavalo! Hoje é a Rua 2.300, mas antes era 
A Rua da Raia. Domingo à tarde tinha corrida. 
Tinha o trilho para os cavalos correrem, e quem corria 
Eram os pescadores, os nativos daqui. Isso foi em 63. 
Depois compramos onde hoje é a padaria, a Tuti’s Pão. 
Ali morei 17 anos e o comércio continua 
Nesse endereço até hoje. 
São 48 anos de padaria. 

Avenida do Telégrafo 

Ali onde é a padaria, a Avenida Brasil, 
se chamava Avenida do Telégrafo. 
Se chamava Telégrafo porque o telégrafo passava 
O fio nessa avenida, a Brasil. 
Ela então passou a se chamar Avenida Santa Catarina, 
E depois Avenida Brasil. 
Nós não éramos município, éramos da 
Comarca de Camboriú. 
Chamávamos de Praia de Camboriú.


Primeiro, loja de móveis 

Nós tínhamos uma loja de móveis,  
Quando passamos a ser município (em 1964),  
Muitos comércios se firmaram aqui, veio banco, cartórios, 
Começou uma vida aqui, mas a nossa loja não ia bem, 
Porque tinham lojas grandes em Blumenau e Itajaí que faziam parcelamento, 
E nós não tínhamos ‘cacife’ para fazer parcelamento, 
E para comprar à vista eram poucas pessoas. 
Abrimos parcelamento, mas não foi legal, as pessoas 
Compravam os móveis, mobiliavam seus apartamentos, 
E nunca mais apareciam. 


Uma das primeiras padarias 

Meu marido tinha umas terras no Paraná, 
Resolveu vender e aí 
Começamos a padaria. 
A Tuti’s foi fundada em 72, 
No começo foi bem puxado! 
Não fomos a primeira padaria, mas uma delas. 
Tinha na época a Superpão, do sr. Sérgio Laus, 
E uma outra para trás, que era só uma peça para vender, 
Acho que era mais ou menos perto de onde hoje é Havan. 
E antes dessas duas, tinha um padeiro de Itajaí, que vinha de carrocinha 
Vender pão aqui. 
Hoje nossos filhos tocam, 
Meu marido já faz 28 anos que faleceu. 
Hoje estou aposentada e vivendo os ‘percalços’  
Da velhice, mas muito bem e feliz. 


A primeira equipe de funcionários, junto com a família (Tuti, que deu o nome à padaria, aparece no canto direito, ainda criança) (Arquivo Pessoal)

Trabalhava na confeitaria 

Eu trabalhei na Tuti’s, viu? 
Era na confeitaria! 
Naquele tempo não tinha internet, então eu comprava 
Livros, revistas, sempre procurando receitas, para aprender. 
Mas também tinha muita receita da minha avó, da minha mãe, da minha sogra. 
A cuca, por exemplo, é da minha avó! Que veio da Alemanha. 
Essa é a receita original, até hoje, multiplicada por 2, por 10, por 20. 
Até hoje tento olhar na cozinha, digo para as confeiteiras pesarem 
Ingredientes, cabelo solto, limpeza, todas com máscara, 
Ainda mais agora na pandemia! 
Essa é a minha profissão até hoje. Fiscalizo, sempre de olho. 



Referência até hoje 

Graças à Deus fomos e somos um sucesso, 
Uma referência na cidade, né? 
Família trabalhando junto. 
Tuti é o apelido da minha filha, que hoje mora no Mato Grosso. 
O nome dela é Ingrid, mas lá poucas pessoas conhecem por Ingrid, 
É a Tuti! A Dona Tuti. Às vezes até me chamam de Tuti (risos). 
Na época quando fomos para inaugurar, fizemos uma votação 
Na família, sugestão de nome. 
Minha mãe tinha sugerido Pão de Açúcar.  
Meu filho mais velho, o último nem tinha nascido ainda, 
Falou assim ‘Coloca Tuti’! Para homenagear a única filha, 
Ela era a rainha da casa. 
E colou, ficou muito bom. Um nome que gravou fácil. 
Hoje tem padaria dentro de supermercado, 
Nós somos panifício! O que significa? 
Fábrica de pão! 
Hoje dois dos meus filhos trabalham na padaria.

Receitas famosas 

A famosa torta de granola (Arquivo Pessoal)

A não menos famosa torta de queijo (Arquivo Pessoal)

Há mais de 40 anos nós não tínhamos café, 
Era só a venda de pães e alguns doces mesmo. 
Sabe qual foi a nossa primeira torta famosa? A de queijo! 
Mas não essa cheese cake de hoje, que ficou famosa nos EUA, 
Com queijo e gelatina, 
A nossa é feita com ricota, receita da minha sogra,  
Que era colona! 
E a cuca, claro! Primeiro a de banana e farofa, 
Hoje tem maçã, morango, uva… vai evoluindo. 
Outro marco foi a torta de granola,  
Que foi e ainda é muito famosa, sai muito. 
Temos uma confeiteira que deve estar há quase 30 anos com a gente, 
E ela sempre teve muito interesse em aprender, estudar e fazer! 
Pagávamos cursos para ela, em Curitiba, ela ficava 3, 4 dias lá, 
Para aprender e trazer para a Tuti’s, era a Fermento Fleischmann que dava. 
Eu incentivava que outras também faziam, mas ela tinha uma visão diferenciada, 
Realmente queria evoluir, e ela que trouxe a torta de granola! 
Nosso carro-chefe, a ponto de fazermos 10, 20 por dia. 
Você derrete o chocolate, aí coloca a granola, sucrilhos, 
Faz o fundo da forma e então vai para o freezer, e você vai montando! 
Creme, chocolate, morangos… 
Em feriados e datas especiais, como Dia das Mães, fazemos muitas. E sai tudo…. 


Compras eram em Camboriú 

Logo que a gente chegou aqui, 
Quando ainda não era município, 
Tudo era em Camboriú! Se precisasse algo 
De banco, era lá! 
Mas roupas era Blumenau, aqui tinha o mínimo, o essencial. 
Mantimentos também era Camboriú. 
Tinha um açougue, que era da Companhia Jensen, de Blumenau. 
Você tinha que fazer teus pedidos durante a semana e sexta vinha o caminhão, 
Que trazia iogurte, leite, carne, costelinha de porco, vinha tudo de lá. 
Precisávamos nos programar de uma semana para a outra. 
Em Balneário tinha a Dona Muchi, que tinha uma loja ali na Avenida Central, 
Vendia secos e molhados, roupas de banho, toalhas, cadeiras… 
Umas cadeiras que quando fechava cortava o dedo! 
Depois que passou para município, melhorou bastante. 

Estudantes ajudaram no movimento 

Não lembro bem quando começou a Univali, 
Ela funcionava primeiro no Colégio Salesiano de Itajaí, 
E então começou a vir muito estudante pra cá! 
Antes às 20h a gente podia fechar a padaria, porque não tinha 
Ninguém na rua. Hoje fechamos 21h30. 
Os estudantes que vieram pra Univali, eram clientes fortes, 
Compravam pão todos os dias, e foram eles que nos incentivaram 
Também a abrir o café!  
No começo tinham só 4 mesas. 
Foram grandes movimentadores, abriram lojas de roupas, calçados.

Turismo:
crescendo aos poucos 

Nos anos 60 ainda era pouco, mas foi crescendo.
No começo eram mais turistas de perto, os alemães de Blumenau, 
Londrina, Curitiba. Um turismo diferente. 
Não tinha os Réveillons, não tinha luz na ilha, 
Tinha uma iluminação bem pequena. 
}Os turistas alugavam casas, tinha o camping do Tedesco na Barra Sul. 
Tinha o Baturité também, que no começo era um rancho de pesca, 
Até que estruturaram, virou a balada. 
A Macarronada Italiana também começou pequena, 
A Dona Nela fazia uma massa muito boa, na casa dela mesmo, 
E ficou famosa! Aí eles fecharam e abriram comercialmente. 
Sempre tinha uma frase: “Macarrão sem queijo, 
É como o amor sem beijo”. Era uma plaquinha. Lembro bem. 
Tinha só um prato: macarrão com carne picadinha, tipo uma bolonhesa, 
Mas era picada e não moída. Um ninho, com macarrão e esse molho. 
E deu certo! Hoje eles têm o restaurante enorme. 

Argentinos:
‘época de ouro’ 

Os argentinos começaram a vir nos anos 80, 
Vinham em massa! 
Não era o ‘fino’ da Argentina, esses iam para Angra dos Reis, RJ, Nordeste. 
Para nós vinham muitas excursões. 
Lembro que eles faziam muita sujeira (risos), 
Piquenique aqui na frente da praia. 
Mas eles trouxeram grandes benefícios para nós, 
Dólar também!
Não sei se alguém ficou rico 
Com os argentinos aqui, mas fazem falta. 
Trocávamos o dólar no caixa, quando viajava com esse dinheiro 
Era outro valor.
Viajei muito com esse dólar deles. 
Chamávamos de época de ouro, eles realmente 
Traziam muito movimento! 
O turismo diminuiu bastante, né… 
Essa temporada de verão da pandemia foi a pior, tivemos que tirar mesas também.

Futebol na Brasil: areião 

Era um areião danado! 
Meus filhos jogaram muito futebol ali na frente da Tuti’s. 
Quando começaram a investir na cidade, foi a  
Canalização de água… e como entrar na nossa loja? 
Era areião para dentro, com tábua, para poder entrar. 
E quando a gente fechava a loja, lá por 17h, 18h, 
Eles iam jogar bola. Isso era a Avenida Brasil! 
Na Central também, a praia vinha até um certo pedaço e era areia pura. 
Não tinha calçamento nenhum. 
Mas fizeram, há fotos dos meus filhos marchando no 7 de setembro e aí já tinha. 
Na Tamandaré também tinha lagoa, meus filhos pescavam siri ali. 
Perto da Tuti’s, onde hoje é a Carmen Calçados, passava um riozinho também. 
Ia até o mar! 
Aí eles canalizaram ali. Mas tinha muita água, entupia… não sei o que aconteceu 
Com esses riozinhos. Eram uns riachos e corria água. 
Minha filha tinha uma tartaruga e catava umas piavinhas do riozinho (risos). 

Pedra da vaca 

Não tinha prédios quando a gente mudou, não. 
Eram só casas na orla! Casas de madeira, de pescadores. 
Tinha espaço para eles colocarem a canoa. 
Comprávamos peixe direto com eles na praia. 
Há uma pedra perto da Ilha das Cabras, que quando a maré tá mais baixa, dá pra ver.
Chama Pedra da vaca! 
Os pescadores me contaram a história, porque eles quando ficavam 
Na praia, na época da tainha ou na farra do boi, não lembro, 
faziam churrasco aqui na praia! 
E não sei quem doou uma vaca para fazer churrasco,  
Eles não conseguiram, a vaca fugiu, entrou no mar 
E nadou até a pedra! Por isso chama 
Pedra da vaca.


Corrida de carros na Brasil 

As corridas de carro na Brasil (Divulgação Arquivo Pessoal)

(Divulgação Arquivo Pessoal)

Tinha corrida na Brasil, sim, sim! 
Era famosa, vinha pessoal de Blumenau com os carros. 
Uma vizinha minha, o pai dela, corria. 
Era um sucesso, domingos de muito movimento e alegria. 
Muita gente vinha para assistir. 
Uns 10 carros faziam a corrida, todos carros originais.
Faziam a volta rápido, jogavam um monte de areia para cima! 
Era divertido. Muito. 
Aqui tinha pouca coisa, o primeiro cinema foi o Cinerama. 
Um senhor antes passava filmes, tinha um projetor bem antigo, 
Mas não era sempre que ele vinha. Era precário. 
Tinha em Itajaí, mas eram salinhas pequenas. 
Hoje estamos no céu. 


‘Adoro dançar
desde moça’ 

Se você me pergunta ‘o que você gosta de fazer?’, 
Eu gosto de dançar! 
Sempre gostei, desde moça. 
Ainda no Mato Grosso, eu trabalhava em uma loja, e a gente 
Tinha uma turma, de moças e rapazes, e a gente 
Dizia que era arroz de festa! (risos) 
Íamos para batizados, casamentos, 
bailes longes, voltávamos com o sapato pendurado 
Na mão, a pé mesmo, porque não tinha carro, não tinha nem ônibus. 
Isso foi em 53, 54. 
Meu marido não gostava de dançar.

Voltou a dançar com 80 anos 

No meu aniversário de 80 anos, a minha filha 
Disse para eu abrir a minha festa com uma coreografia. 
Mas eu achava que meus filhos eram todos pernas de pau (risos), 
E olha que eu tenho 3 filhos homens! 
Aí meu filho, o Ewerton, contratou o Waldir Coral. 
Começamos a fazer as aulas e no dia do meu aniversário  
Também chamei ele, e ele já levou a companhia de dança dele, 
Levou os dançarinos, fez uma apresentação, foi o meu presente de aniversário! 
Aí eu me empolguei e comecei a fazer aula toda semana, uma vez por semana. 
Hoje não faço mais por conta da pandemia e também tenho  
Problema de coluna, não estou muito 100%. 
Mas eu adoro música, fico com uma caixinha de som ligada pelo celular, 
E quando a música está gostosa, bonita, 
Eu danço na cozinha, na sala! Uma gingadinha pra cá, pra lá (risos), 
Esse é o meu hobby para extravasar o estresse! 


Trabalho solidário 

Eu ajudo, tento! 
Faço um trabalho artesanal, portas-guardanapos, 
Para cada cesta básica que eu ganho, eu dou meia dúzia de presente! 
Levo as cestas para a Igreja Luterana, e eles distribuem para quem precisa. 
Ano passado, quando fiquei fechada na pandemia,  
Rodei o prédio onde moro, levando os portas-guardanapos para meus vizinhos e  
Pegando cestas em troca. Pode ser pouco, mas tento ajudar! 
Sempre penso sobre essa desigualdade, fico sentida com isso. 
Aumenta a cada dia isso. 
Tem muito em Balneário. Rico na Atlântica, passou da Terceira…  
É outra situação. Cada um precisa fazer a sua parte. 
Infelizmente tem muita gente egoísta…. 

Futuro de Balneário 

Fui contra o alargamento da faixa de areia porque penso que a
Praia de Camboriú é mansa, você entra aos poucos, para crianças e idosos.
Não consigo tomar banho no Estaleiro, em Taquaras, porque são praias de tombo,
E tenho receio que a central fique assim também.
Dizem que é o recomeço, mas recomeço para que?
Me preocupo com a falta de água, esgoto…
Mas tudo é o progresso, né? Tudo tem que crescer.
O melhor lugar para morar é aqui. Sempre vou defender isso.
Somos privilegiados por morar em Balneário,
Tem gente que paga caro por estar aqui 15 dias, e nós estamos o ano inteiro!

Por: Renata Rutes

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