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Balneário Camboriú

‘Seu Moreno’ divide memórias da pesca, política e turismo: “Não troco isso aqui por lugar nenhum”

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Hildo Agostinho dos Santos, 72 anos (nascido em 15 de dezembro de 1948), mais conhecido como Moreno, apelido que ganhou na infância, é nativo de Balneário, ‘onde antes chamavam só de Camboriú e Praia de Camboriú’, assim como seus pais, irmãos e toda a família. 

Desde cedo se envolveu com a pesca e é proprietário de uma das peixarias mais antigas da cidade, a Peixaria do Moreno, localizada na Avenida Marginal Oeste, no Bairro Vila Real. 

É casado com Zilma dos Santos, é pai de Hildo Junior, e é avô de dois netos. 

Hildo (Moreno), com a esposa Zilma e os netos Matheus (de azul) e o menor, Bruno. (Arquivo Pessoal)

Tanto a esposa Zilma, que conhece desde os tempos de juventude e dois sobrinhos trabalham com ele na peixaria. O filho, Hildo Junior tem uma empresa de drones e faz fotos e vídeos para o mercado imobiliário.

Com saudade e emoção, ele revisita algumas de suas memórias de uma cidade que não existe mais.

(foto Renata Rutes)

Moreno: apelido de infância 

Meu nome é Hildo Agostinho dos Santos 

Desde criança, meus pais botaram, e me chamam de Moreno 

Não sei porque, mas sempre chamaram ‘Moreno, Moreno’ 

E todo mundo sempre me conhece por Moreno.

Avenida Camboa 

Antigamente aqui era Camboriú, nasci aqui 
Nós morávamos aqui na Quinta Avenida, e aqui não tinha nada 
Não era Quinta Avenida, antigamente chamavam de Avenida Camboa. 
Começava na Dom Afonso e ia até a Dom Henrique. 

A esquerda, Francisco da Conceição, era conhecido como Seu Tico, sogro de Hildo, pescador e morador antigo da Vila Real, com o neto e filho de Moreno, Hildo Junior. (Arquivo Pessoal)

Família toda daqui 

Meu pai era nativo daqui, filho de português com italiano 
Minha mãe também, todo mundo daqui 
Minha esposa, meu filho… todo mundo mora aqui. 
Minha esposa nasceu bem onde hoje passa a ponte, 
Os pais dela moravam ali. Ela é 10 anos mais nova do que eu, 
Eu já tinha 20 anos e ela ainda era criancinha (risos), eu sempre conheci ela. 
Todo mundo andava junto. Eu andei por aí e casei com ela. 

Na Praia de Camboriú, em cima do barco salva-vidas da época Hildo (esquerda), com os amigos Júlia e João, de Lages – em 1965. (Arquivo Pessoal)

Tranquilidade 

Era muito diferente… tinha muita tranquilidade! 

Oito hora, dez hora, a gente tinha que estar em casa 
Mas a gente vivia tranquilo aqui 
Estrada era de chão, onde a gente morava era uma rua de gramado. 
Não tinha luz, não tinha nada. 
A gente brincava ali, jogava bola com a criançada, 
Andava de bicicleta. 
Tinham poucas casas, poucas famílias. 
Todo mundo conhecia todo mundo. 
Era vila de pescador, era bom. Tinha aqui, Barra, Nações, 
E o Bairro dos Pioneiros, que a gente chamava de Canto da Praia. 
Hoje tem pouco nativo, é todo mundo de fora. 

Avião do João Goulart pousava ali 

Na época, tinha um estradão 
E o avião do João Goulart pousava ali! 
Nós brincava com ele ali, 
O avião do Jango, do Brizola. 
Ele (o Jango) tinha casa onde hoje é o Canto da Sereia, 
a gente sabia quem era ele, amarrava o avião pequeno dele, 
Fica ali uns 10 dias, ganhava dinheirinho pra cuidar do avião dele (risos).
Foram asfaltar a estrada de chão só em 93, 
Na época do Pavan. 
Era muita poeira. 

Praia: carros na areia 

A gente adorava e ia muito na praia também, brincava lá. 
Carros passavam pela areia. 
A entrada da cidade era lá na Avenida Central, 
Perto da Casas D’água. 
Entrava lá ou então no Marambaia, e aí tinha que descer na praia 
Para ir pra Barra Sul, e subia lá onde hoje é a entrada da Passarela. 
Tinha que andar na areia mais firme, porque se pegasse na areia fina, 
Aí atolava. E tinha que passar com a maré baixa. 
Agora vão alargar a areia, né 
A gente reza que fique bom, que fique bonito, 
É bom pra todo mundo, vamos ter uma cidade 
Que todo mundo gostaria de morar. 

Escolinha em Camboriú 

Eu estudei em uma escolinha ali em Camboriú 
Não lembro mais do nome 
Mas tinha aqui também uma escola que na época era a professora Silneide, de Camboriú 
Perto da ponte, ali 
Depois escola tinha lá embaixo, perto da Casas D’água, a professora era a Dona Joana. 
Mas eu não estudei lá 
Naquela época só estudei até o 3º ano de escola 
Eu ia a pé e descalço! Hoje a criançada anda de tênis, lá era descalço, até no frio.

Cuidados com os materiais 

Os pais compravam caderno, tinham que comprar 
Hoje as crianças ganham tudo, na época tinha que cuidar de tudo 

A situação era difícil, tinha que escrever pensando no outro lado da folha 

Estudavam bastante criança 
E assim era a vida. 
Estudava de manhã e à tarde ia trabalhar com o pai.

A sobrinha de Hildo, Eliane (esposa do músico Maurício Simas, o Escova) com Hildo Junior no colo, mostrando como era a Marginal no início dos anos 90. (Arquivo Pessoal)

Pai construiu muitas casas na época 

Ele construía casas pequenas, fez muitas casinhas de moradores ali na praia 
O pessoal vinha de fora, esses ‘alemão’, e contratavam a casinha. 
Inclusive até pouco tempo tinha uma ali na Dom Henrique que ele construiu, 
Mas desmancharam.

Mãe ficava em casa 

Minha mãe ficava cuidando da casa 
Ela plantava as coisinhas em casa 
Plantava hortaliças, verduras né, para o consumo da casa 
Criava galinha, porquinho, vaquinha de leite. 
Todo mundo tinha. 
Pescava pra comer também, tinha muito camarão, a gente se virava. 
Tinha o camarão salgado, não era descascado, e a gente comia muito camarão. 

Hildo com os colegas de trabalho do Hotel Camboriú, Ilda, Daniel e Norma – em 1963. (Arquivo Pessoal)

Tudo em Itajaí 

Se você ficava doente, corria pra Itajaí 
A gente ia de ônibus, já tinha a Viação Praia, 
Que antes era do Seu Baturité, que tinha o rancho, ele comprava peixe dos pescadores e levava pra Itajaí, tinha restaurante ali também, depois ficou famoso, virou balada. 
Mas era tudo em Itajaí, até se precisava comprar roupa, era em Itajaí. 
Mas quando começou turismo aí fizeram hospital, 
Comércio, hotéis, supermercados…

Trabalhou na padaria 

Quando eu tinha 12, 13 anos eu trabalhei na 
Padaria Vitória, era do seu Irineu Linhares. 
Bem na frente da Havan, era ele e a padaria do seu Néli padeiro, 
Eram só as duas, a gente entregava pão com aqueles carrinhos de cavalo. 
Ia na Barra, Camboriú… 
Eram bastante gurizões, naquela época podia trabalhar, né 
Hoje não pode mais.

Peixaria do Moreno no início dos anos 90. (Arquivo Pessoal)

Hildo (Moreno) e Antônio Carlos, em frente a peixaria em que eram sócios (Peixaria Real), que ficava onde hoje passa a Quinta Avenida, onde fizeram uma rótula, nas proximidades da Rua Dom Afonso. (Arquivo Pessoal)

Envolvimento com a pesca 

A pesca só eu parti pra ela 
Ninguém da família, só eu. 
Eu trabalhava com o meu pai antes, e depois quando completei 18 anos 
Eu parti pra pesca. 
Aqui tinha turma de pescador, um amigo meu de infância me convidou 
Pra pescar camarão, eu gostei. 
Trabalhei embarcado um tempo, numa firma chamada Bom Frio, uns 6, 8 anos. 
Trabalhei em barco grande, e depois parti pro ramo de peixaria e fui embora. 
Abri minha peixaria em 85, nesse local, 
Antes eu tinha na Quinta Avenida com o meu cunhado, Antônio Carlos, já falecido.

Muito peixe, rio limpo 

Tinha bastante peixe, mas o consumo era pouco, né 
A praia nossa aqui era muito rica de peixe! 
Dava muita tainha, lembro de uma muito bonita quando o Meirinho foi prefeito, 
Foi lá na Barra Norte. Foram 15 mil tainhas na rede do seu Mané Germano, 
Todo mundo ajudou, ganhou um peixinho. 
E depois mataram nas Taquaras, bastante também, e depois nunca mais deu tanta tainha. 
O nosso rio era muito limpo, né, dava muita tainha também e um camarão chamado camarão pulador 
A gente tomava banho também, 
Esse rio era muito limpo, água clara, 
E hoje está nesse estado que a gente vê. Mas era lindo. 
Essa Vila Real antes era só a Rua Dom Afonso e era só pescador, aqui e na Barra. 
A gente pescava à vontade, todo mundo se conhecia! 

Festa do Pescador 

E tinham as festas, né 
Aqui na igreja da Vila Real faziam a Festa de São Pedro 
E tinha a procissão do Santo, pegavam a balsa do Seu Mané Firmino 
E faziam a procissão nesse rio 
Era uma festa grande,  
Era muito bom. 

Rios pela cidade 

Tinham vários rios pela cidade 
Ali na Tamandaré tinha uma lagoa, 
E tinha o Restaurante San Remo, atrás dele 
Passava um rio, que hoje é a Avenida da Lagoa, 
E saía lá no Marambaia. Era tudo um lagoão, um banhado. 
Dava camarão, robalo, tudo. 
Tinha uma lagoa na 3.300 também. 
É uma época que deixa saudade.

Baleia encalhada é lembrança importante 

Lembro muito da baleia, levei meu filho pra ver 
E tem foto dela ali ó, registrada na peixaria (ele tem quadros com fotos do momento) 
Foi na Barra Sul, perto do Hotel Fischer 
Fez parte da cultura da cidade 
Ela ficou ali 3 ou 4 dias, mas já veio doente 
Tentaram salvar, mas não deu.

Diversão dos jovens eram os bailes 

Tinha muitos bailes bons nessa época, 
Tinha ali no Barranco, na Barra, lá perto do Bairro das Nações, 
Perto da Casas Bahia, ali tinha o Salão do Ralf, eu dançava ali. 
Eram bailes bons, de respeito, era até meia-noite e tchau. 

Turismo começou a se desenvolver 

Lembro quando começou a vir turista 
Tinha muita casa do pessoal de Curitiba, Blumenau,  
Rio do Sul, Florianópolis, de perto.
O turismo começou mesmo depois que a BR começou a passar aqui. 
Aí começou mesmo! 
Hotéis já tinham mais antes que eu, 
Fischer, Marimar, o Balneário!  
No Balneário eu trabalhei lá, em 64, trabalhei lavando copo (risos). 
Tinha o Hotel da Dona Inês, perto do edifício Londrina, 
E o Marambaia… prédios tinham muito poucos, 
O Albatroz, Punta del Leste e Itapoá. 

O resto, só casa. 
Dos anos 80 pra cá começou, 
Vinham bastante ‘gringo’ né, os argentinos, 
E deixavam dólar aí e começou a expandir. 
Eles vinham de dezembro até o Carnaval, 
E aí ficava a cidade normal nossa. 
Foram fazendo hotéis, o Pavan investiu muito, 
Ele divulgou muito a cidade! Chegou a ir 
no Sílvio Santos divulgar a nossa Balneário. 
Chamavam de Praia de Camboriú,  
Depois, de 64 pra cá, Balneário. 
Mas a gente tinha que falar que era Praia de Camboriú, 
Perto de Itajaí. E depois a cidade desenvolveu bastante. 

Futuro: bom por uma parte 

É outra cidade, uma selva de pedra, 
Mas é bom por uma parte 
Porque gera bastante turismo, que é a nossa ferramenta de trabalho 
E a construção civil, que também ajuda 
Mas a gente não anda mais à vontade como antigamente, 
Sabendo viver aqui é uma cidade muito boa para viver. 
Aqui é bom, eu não troco isso aqui por lugar nenhum! 
Acho que tinha que cuidar mais com a natureza,  
Avançaram muito em lugar que não deveria ser avançado, 
Essa beira de rio aí…  
Devia ter mais respeito, porque tá faltando.  
Hoje quem tem, manda mais, né?


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