O jornalista, filósofo, escritor e professor na área de Ética da Escola de Comunicações e Artes da Universidade de São Paulo, Clóvis de Barros Filho, esteve em Balneário Camboriú na quarta-feira (23), onde encerrou o Conecta 23, evento de empreendedorismo, capacitação e network, promovido pela Associação Empresarial de Balneário Camboriú (Acibalc) em parceria com o Sebrae, realizado no Hotel Sibara.
Prazer corporal e prazer superior
O Página 3 esteve presente na palestra de Clóvis, que falou sobre valores que devem ser seguidos para uma boa qualidade de vida.
A fala do professor foi dividida em ‘capítulos’, e o primeiro deles foi o prazer, onde fez uma alusão ao prazer corporal (sexual, comida e bebida) x prazer superior (vivências que envolvem a vida do espírito).
O professor usou de exemplo comer só arroz, algo que é julgado e que normalmente a pessoa é questionada do por que também não come uma carne ou feijão.
“As pessoas que não conseguem ter o prazer com o mais simples, que é mais fácil de encontrar, como ter prazer com uma brisa fresca, por exemplo – isso é o hedonismo, a filosofia da simplicidade. Quanto mais sofisticado o prazer, mais raro será. O prazer superior é o que envolve a vida do espírito, que na filosofia é a inteligência, o uso da razão, a atividade pensante. Ter prazer superior é ter prazer diante de ideia, narrativa, de uma leitura, degustação de uma sinfônica… tudo o que cobra de nós o uso da inteligência, e isso será superior ao prazer do corpo. O prazer superior pode se estender por dias enquanto você discutir ideias, pensar e falar sobre o assunto”, explicou.
Talentos
Outro ponto tratado pelo palestrante foi o talento – salientando que há pessoas que têm muito ou pouco, mas que todos têm algum talento.
O professor dividiu a experiência que teve com o pai, que dizia que ele ‘precisava descobrir qual era a sua praia’, quem ele era. Então ele fez aula de flauta, equitação, origami e não se encontrou em nada disso, até o dia em que pediu para ir mais cedo para a aula, porque iria ajudar colegas com uma matéria.
“Foi aí que meu pai descobriu que a busca tinha acabado e que eu era um bom explicador/professor. Eu sou um explicador, esse é o meu ‘diamond’ e serei explicador até o fim da minha vida. Sempre haverá lugar para quem faz bem o que gosta de fazer. É melhor abraçar quem você é e ter a chance de lutar para que o seu ofício deixe de ser indigente e passe a ser aplaudido e reconhecido. Essa chance você tem se você não se acovardar”, afirmou.
Dentro do capítulo sobre talentos, Clóvis dividiu o quanto lamenta que o ‘talento professoral’ é desprezível quando comparado com o de jogador de futebol, citando Neymar. “Como também o talento para o basquete. Se você encestar uma bola, pode virar o Michael Jordan, mas se encestar o ovo na boca de alguém que esteja bocejando, pode ir preso”, comentou arrancando risadas da plateia.

Excelência
Sobre excelência, Clóvis citou a importância de sempre fazer o máximo e também sobre a necessidade de ‘aprender a tirar 10’ e de não ser medíocre, ‘aceitando um cinco’.
Para ilustrar esse capítulo ele contou que foi operado por um médico que atuava em uma clínica reconhecida de oftalmologia, mas que era o filho do médico excelente, que estava participando de um curso.
O filho, que seria ‘um médico medíocre’, causou a cegueira de um de seus olhos e de forma amadora, porque teria usado um molde errado na hora da operação, algo que se aprende no ‘manual’.
“Devemos sempre perseguir o melhor de nós, ser excelentes. Excelência é patrimônio da vida porque assegura autoestima. Nem todo talentoso é excelente e vice-versa, mas quando acontece de ser os dois, a pessoa diferencia-se”, pontuou.
Liberdade
Outro ‘capítulo’ abordado na palestra foi a liberdade e a necessidade de ‘ser senhor de sua trajetória’, citando que o homem vai além da natureza – na natureza cada um é o que é, usando de exemplo que o gato gateia (Clóvis possui um gato chamado Epaminondas, que inclusive já foi um ‘alter-ego’ seu, no livro ‘Epaminondas: O gato explicador’).
“O homem não é instintivo, é deliberativo. Não há regulamento da espécie, a vida é uma escolha e será trilhada pela vontade e pela inteligência, que sugerem caminhos. A vida vem antes da identidade (nos animais é o contrário). Gatos não se arrependem, não tem dilemas éticos, dúvidas ou ansiedades, gatos gateiam e nós temos tudo isso porque nossa vida é feita pelas decisões, que podem se mostrar profundamente equivocadas. Liberdade é patrimônio porque ninguém de bom grado a entregaria”, salientou.
Estar a serviço e alegria
Os dois últimos capítulos foram linkados um no outro – primeiro, Clóvis abordou o valor inestimável que é se colocar pelo outro, pontuando que a sua grande conquista sendo professor é o que consegue ensinar e entregar para seus alunos. Então, falou sobre a alegria, que definiu como ‘a potência de agir em alta’.
“Ninguém espera isso, mas eu me alegro com novelas antigas. Neste momento estou assistindo ‘Senhora do Destino’. Perguntam se eu não vou assistir as atuais – só quando passarem no canal Viva (canal da TV Globo que passa reprises de novelas). Me alegro também com a literatura e com comer. Já o que me entristece é saber que a nossa educação fundamental é pobre e que nós não nos indignamos por isso, mas nos indignamos por perder a Copa do Mundo do Futebol; mas que não nos entristecemos e nos acostumamos com a injustiça e o deboche com o qual os governantes lidam com o patrimônio de todos”, completou.