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Caminho do Peabiru em SC: “Um turismo cheio de enganos”

Henrique Schmidlin/Pesquisador – Dois estudiosos do Caminho do Peabiru – que também tem histórias interessantes que se passaram na Foz do Itajaí – em Santa Catarina, com vários livros e filmes realizados, estão apontando graves erros em um projeto turístico anunciado há alguns meses por um grupo de empresários do nordeste do Estado. Isso porque “apresentaram informações que podem levar o público turístico, incluindo crianças e jovens escolares, a terem conhecimentos enganados sobre os atrativos destacados”, dizem os estudiosos.

A preocupação é da jornalista Rosana Bond, de Florianópolis, autora de cinco livros sobre o Peabiru, considerada uma das maiores especialistas brasileiras no tema, e do pesquisador Fábio Krawulski Nunes, de Jaraguá do Sul, grande compilador de historiografia e dados arqueológicos peabiruanos catarinenses.

O milenar Peabiru foi uma rede indígena de caminhos, com cerca de 4 mil km, unindo o oceano Atlântico ao Pacífico, ou vice-versa. Saía (ou chegava) do litoral de Santa Catarina, Paraná e São Paulo. Foi tido pelo respeitado professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) Reinhard Maack, em 1959, como a mais importante via transcontinental (ou interoceânica) da América do Sul pré-colombiana. Passava pelo Brasil, Paraguai, Bolívia, Peru, Argentina e Chile.

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Mesmo não passando pela Foz do Itajaí, o Caminho do Peabiru era muito perto, e há histórias que também envolvem a região. Segundo Fábio Nunes, “está mais que provado que a entrada do Caminho do Peabiru no continente era pela foz do Itapocu (Barra Velha/Araquari), porém existe uma curiosidade histórica (inédita até recentemente) envolvendo o rio Itajaí-Açu e a trilha milenar. O fato ocorreu em 1543. Foi quando os padres franciscanos B. de Armenta e A. Lebron estavam descontentes com o governo de Cabeza de Vaca no Paraguai e resolveram, às escondidas, vir ao litoral de SC, andando pelo fácil Peabiru, trazendo cartas contrárias ao governador, para serem enviadas à coroa espanhola.

Deu tudo errado! Eles foram perseguidos e presos ainda dentro no Paraguai, no rio Monday. Um dos homens que prendeu os padres, chamado Sebastian Gonzalez, descreveu no seu testemunho em junho de 1543 que a intenção dos freis, ao chegar na costa catarinense seria procurar certas naus no porto em um “río que se dize Tayayrbe (Itajaí-Açu) a 3 leguas de Ytabun (Itapocu, rota peabiruana por onde os padres chegariam no litoral). ”

ENGANO

O principal engano do projeto turístico, que “contamina” todo o restante, dizem Bond e Nunes, é apresentar a chamada Escadaria (de pedras) do Monte Crista/Caminho Colonial Três Barras, no município de Garuva, como trecho de entrada do Peabiru no continente. “Isso é um erro grave”, dizem os dois. E adicionam: o Caminho não entrava por ali e sim, comprovadamente, pelo rio Itapocu, mais ao sul, no litoral de Barra Velha, conforme a historiografia.

“Sendo pelo Itapocu, portanto é engano também apresentar a rota peabiruana indo por Joinville (Baía da Babitonga) e alcançando os Campos do Quiriri”, afirmam os pesquisadores.

Ambos negam que existam obras incas em Garuva ou Joinville, como vem divulgando o grupo turístico. Eles se referem a declarações feitas a diversos veículos da mídia, jornais e sites de notícias, em setembro e outubro de 2021, tais como: “Parte do percurso tem nitidamente a engenharia dos incas”; “Acredita-se que (a trilha catarinense) faça parte do Qhapaq Ñan (rede inca de estradas)”.

“Os lugares envolvidos no projeto turístico de Garuva e Joinville são belíssimos, e por si só valem a pena ser visitados. Portanto, não é preciso criar um turismo cheio de enganos para atrair o público”, lamentam os estudiosos.

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Eles informam que existem várias provas documentais de que os trabalhos no Monte Crista/Três Barras não foram feitos por incas e sim por equipes nacionais (tempos do Brasil colonial e imperial), desde a abertura da primeira picada ali, no século XVII, quando o império incaico já fora destruído pela Espanha há mais de 100 anos.

Um informe de 1845 do Instituto Histórico e Geográfico Brasileiro acaba com toda dúvida: “A subida da serra geral de São Francisco para os campos de Curitiba nunca teve estrada (…) abriram uma picada pela era do ano 1600”.

A colocação de pedras na Escadaria aconteceu após 1852, quando o presidente da Província de SC João José Coutinho pede verba ao governo central para fazer a obra, conforme documento encontrado no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro pelo historiador Gleison Vieira, autor de “Porto Barrancos – Berço de Garuva”, de 2007, pela Editora Letradágua.  

Sobre a verba, em uma prestação de contas, Coutinho menciona duas quantias: 7:745$047 réis e 2:000$000 réis.

Mas antes desta construção maior houve melhoramentos parciais com pedras, como o de 1848, comandado pelo militar João Francisco Barreto, de engenharia muito interessante por ter envolvido uma calçada em zigue zague num trecho de subida e implantação de 30 esgotamentos (com pedras) transversais para água, como cita o artigo “A Estrada Três Barras e a Integração do litoral norte catarinense com o Planalto de Curitiba”, do professor Alcides Goularti Filho, na Revista Territórios e Fronteiras, em 2019.   

De acordo com Fábio Nunes, até que se prove o contrário, com alguma fonte documental primária fidedigna, “tudo isso não passa de meros achismos e especulações sobre um outro velho caminho pelo Monte Crista/Quiriri”. Nunes acrescenta que existem quase 30 fontes quinhentistas e seiscentistas citando claramente que a entrada no Peabiru se fazia pelo rio Itapocu.

Entre estas fontes estão a Carta de Pedro Dorantes ao Rei, escrita em Assunção em 1543. Este documento relata em pormenores como foi a entrada dos 250 homens da expedição de Cabeza de Vaca no Itapocu a partir de 2 de novembro de 1541; nesta mesma Carta o próprio Dorantes confirma que Aleixo Garcia, o náufrago descobridor do império inca, havia entrado também pelo Itapocu alguns anos antes.

Outra importante fonte primária é a obra de Ruy Díaz de Guzmán de 1612 (conhecida popularmente como La Argentina Manuscrita), onde se descreve as viagens de Cabeza de Vaca e do grupo de Mencía Calderón de Sanabria, em 1555, esta saída de São Francisco do Sul e entrando em canoas pelo Itapocu em direção ao Paraguai.

Documento histórico que comprova a tese dos pesquisadores.
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