SÃO PAULO, SP (FOLHAPRESS) – A queda na popularidade do presidente Lula (PT) apontada pelo Datafolha animou o mercado financeiro, que já antecipa suas previsões para o cenário eleitoral de 2026, torcendo para ver o governador de São Paulo, Tarcísio de Freitas (Republicanos), na disputa presidencial, mas o petista ainda é forte e assim deve chegar na campanha, avalia o banqueiro Ricardo Lacerda, fundador da BR Partners.
“Goste-se ou não dele, Lula é a maior liderança política da história do Brasil republicano. Ele é o único nome da esquerda em condições de chegar competitivo em 2026. Creio que será candidato e será competitivo. Mas precisa trabalhar o eleitor de centro, que fez a diferença em favor dele na última eleição. O país continua dividido, e a centro-direita terá um candidato forte. Devemos ter mais uma disputa acirrada e imprevisível”, diz ele.
Pesquisa Datafolha divulgada na semana passada mostrou que a aprovação do petista desceu de 35% para 24% em dois meses, atingindo patamar inédito para Lula em suas três passagens pelo Palácio do Planalto.
Lacerda atribui o tombo na aprovação do presidente à inflação, que ele considera o principal motivo, mas diz ver falta de ação e de bandeiras do governo em diversas áreas, especialmente na segurança pública.
“A população quer ver um governo mais objetivo e efetivo nas políticas públicas e menos intervencionista nas questões econômicas”, afirma.
*
PERGUNTA – A quais fatores, especificamente, o sr. atribui a atual queda na popularidade de Lula?
RICARDO LACERDA – O principal motivo é a inflação. Temos números muito positivos de crescimento e emprego, mas a população não sente melhora em seu padrão de vida porque está tudo caro. É um cenário semelhante ao dos Estados Unidos, onde a despeito de uma economia pujante o presidente Biden viu sua popularidade derreter.
O segundo motivo é a falta de ação do governo, a ausência de bandeiras em diversas frentes, principalmente na segurança pública. A população quer ver um governo mais objetivo e efetivo nas políticas públicas e menos intervencionista nas questões econômicas.
P – Alguns empresários dizem já ter perdido a esperança de que o governo Lula solucione o impasse fiscal e estimam que isso só acontecerá com uma troca de governo em 2027. O sr. concorda com essa visão?
RL – O Brasil tem um problema fiscal conjuntural e outro estrutural. Em relação ao conjuntural, o governo errou ao promover a maior expansão fiscal da história no início de seu mandato. Gastou muitas fichas precocemente e agravou a situação fiscal, ficando agora sem margem de manobra.
Já o problema estrutural não é culpa deste governo ou de qualquer outro governo individualmente. Assim como outros países, o Brasil tem tido um aumento progressivo de gastos com o envelhecimento da população e o tamanho do estado. Tivemos a Constituição de 1988, que estabeleceu uma série de benefícios sem contrapartidas, engessando o estado e a economia. É preciso uma ampla reforma para corrigir isso. Eu acho que o presidente Lula, com sua habilidade política, precisa abraçar essa causa e buscar um ajuste fiscal efetivo.
P – O sr. acha que o governo pode dar alguma guinada na economia para tentar reverter esse quadro?
RL – Quais são os riscos ou quais seriam os instrumentos? A única guinada viável é no sentido de uma maior disciplina fiscal. O governo precisa mostrar com clareza e convicção que não teremos um descontrole da dívida pública. Só isso pode viabilizar uma queda de juros e uma volta de investimentos estrangeiros e do setor privado doméstico. Temos um desequilíbrio entre políticas fiscal e monetária que não pode mais ser corrigido só com aumento de juros. Ou resolvemos isso ou virá mais inflação e, provavelmente, uma recessão.
P – O sr. receia que o Lula, de olho em 2026, adote medidas eleitoreiras, com aumento de despesas e drible em limites fiscais?
RL – Essa tem sido a regra de conduta de todos os governos em ano de eleição. Mas o que preocupa agora é que estamos no limite, com um índice muito elevado de dívida pública sobre o PIB e déficits fiscais altos e recorrentes. Estamos perto da gota que pode fazer o copo transbordar. Por outro lado, a margem de manobra do governo é baixa, pois possíveis medidas teriam que passar pelo Congresso.
P – Como o sr. avalia a possibilidade de Gleisi Hoffmann no radar da reforma ministerial?
RL – Todo partido tem sua dinâmica interna. Gleisi é um nome muito relevante dentro do PT e tem bastante proximidade com o presidente, portanto, não seria uma nomeação surpreendente. Mas não é algo que ajude numa aproximação com o setor privado, que ela sempre combate com críticas muito ácidas. É algo que fortalece o lado ideológico do governo em detrimento do pragmatismo que deveria estar sendo perseguido.
P – Pelas suas previsões, Lula tem condições de chegar a 2026 como um candidato competitivo?
RL – Goste-se ou não dele, Lula é a maior liderança política da história do Brasil republicano. Ele é o único nome da esquerda em condições de chegar competitivo em 2026. Creio que será candidato e será competitivo. Mas precisa trabalhar o eleitor de centro, que fez a diferença em favor dele na última eleição. O país continua dividido, e a centro-direita terá um candidato forte. Devemos ter mais uma disputa acirrada e imprevisível.
P – O que pensa o mercado financeiro sobre 2026 no horizonte? Quais são os nomes de possíveis candidaturas que têm circulado nas conversas na Faria Lima?
RL – A partir das últimas pesquisas o mercado financeiro passou a antecipar a sucessão presidencial do próximo ano. E se animou um pouco com isso. Seja através de um novo governo, ou de uma guinada do presidente Lula rumo ao pragmatismo, o mercado passou a ver uma luz no fim do túnel. Com isso, temos visto uma recuperação do real e das Bolsas.
Em termos de nomes, acho que ainda é cedo, mas evidentemente que o mercado gostaria de ver o governador Tarcísio de Freitas na disputa.
P – Com a chegada de Galípolo ao BC, acha que Lula vai manter o tom mais brando que adotou na última subida da Selic?
RL – Eu acho que tudo vai depender do quanto os juros ainda terão que subir. A gestão anterior do Banco Central, com o apoio do próprio Galipolo, deixou três altas de um por cento contratadas antecipadamente. Se forem suficientes para controlar a inflação, creio que haverá uma trégua por parte do presidente Lula. Mas o Banco Central vai sofrer uma enorme pressão se tiver que subir os juros acima de 14,25%. Teremos uma dinâmica muito importante para observar, e o mercado estará atento a ela.
P – A chegada do novo comando no Congresso em um momento de baixa popularidade do presidente traz risco de travar a agenda legislativa?
RL – Creio que não. Acho inclusive que os novos presidentes do Senado e da Câmara dos Deputados têm perfil para empurrar uma nova agenda legislativa no vácuo deixado pelo governo. A sociedade brasileira quer atitude, quer reformas que destravem a economia, e o legislativo estar atento a isso.