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Uma aventura com Pablo Neruda

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Pablo Neruda. Tenho um exemplar do grande poeta chileno que consegui de um amigo que conheci em Santiago, numa viagem de mochila que fiz, pedindo carona, por vários países sul-americanos. Para sair com este livro do Chile tive que me arriscar. Neruda era um escritor proscrito em seu país e a leitura dos livros dele tinha que ser feita às escondidas. Ser flagrado com um livro dele era prisão na certa.

Corria o ano de 1981, oito anos após a instalação da ditadura sanguinária do general do exército Augusto Pinochet, que depôs e levou ao suicídio o presidente eleito Salvador Allende, socialista e considerado um perigo para a hegemonia imperialista norte-americana no sul do mundo.

Os Estados Unidos temiam que o vírus comunista pudesse se alastrar pelo continente. Já bastava Fidel Castro e sua Cuba. O golpe que surpreendeu pela rapidez e violência, se deu em 11 de setembro de 1973. Depois de três horas de luta e bombardeio com aviões da força aérea o Palácio de La Moneda foi tomado pelo exército.

Pinochet governou o Chile com mãos de ferro até 1990. A estimativa é de que cerca de 50 mil opositores ao regime tenham sido mortos ou desaparecido neste período. Os intelectuais e formadores de opinião foram o alvo principal no início do novo governo. Militante comunista, Neruda morreu em 23 de setembro de 1973, 12 dias após a instalação da ditadura de Augusto Pinochet. Ele sofria de câncer de próstata. Havia a desconfiança de que um agente da CIA travestido de médico teria inoculado nele um veneno fatal. Exames recentes desmentem esta versão. A dúvida, entretanto, permanece.

Mas voltando a 1981, quando permaneci por mais de um mês em Santiago, a resistência à ditadura ainda era grande e uma intensa campanha publicitária se desenvolvia nos meios de comunicação para convencer a população de que aquele era o melhor regime, tudo com o apoio ‘velado’ de Richard Nixon e a inteligência norte-americana.

Mas a oposição à ditadura se mantinha, embora fraca em função da avassaladora violência dos militares nos anos que se seguiram ao golpe. Bombas de baixa repercussão explodiam ali e acolá. Uma delas, inclusive, tive a oportunidade de presenciar. Estava próximo de uma livraria e, de repente, aquele barulho ensurdecedor, muita fumaça, pessoas gritando e restos de ferro e cimento voando pelos ares. Felizmente, baixada a poeira, apenas alguns feridos sem gravidade.

E o livro de Pablo Neruda? Como vou conseguir sair do país com ele? Alguns amigos chilenos tentaram me dissuadir da ideia. Mas não tinha como, resisti e fui até o fim. Coloquei-o nas costas, dentro das calças, botei a mochila e segui para a fronteira. O livro parecia queimar, mas fui em frente, encarei um oficial militar que fazia uma espécie de averiguação de quem entrava e saía do país.

Fui obrigado a tirar a mochila, ele me apalpou e, não sei se tive sorte, mas quando ele me dispensou ainda tive a coragem de me voltar, muito temeroso, olhar para o rosto dele e perceber um indelével e malicioso sorriso em seus lábios.

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