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Uma enchente que transformou vidas

Foram dias cinzentos que se sucediam e teimavam em persistir, chuvosos e intermináveis naquele fatídico ano de 1983. A princípio, significavam apenas um incômodo na rotina dos habitantes de dezenas de cidades. Afinal, foram nebulosos meses de água descendo do céu e encharcando a terra, morros, encostas e até a alma.

Porém, semana após semana, aos poucos o rio Itajaí-Açu e seus afluentes enchiam, elevando as águas a níveis preocupantes. Findava a primeira quinzena de junho e o perigo de uma enchente de grandes proporções já se mostrava inevitável. E assim foi. A tragédia anunciada após o longo período de chuva quase intermitente se revelou com toda a sua incontrolável força nos primeiros dias de julho.

O desespero era visível no semblante de toda a gente. E não era para menos. A grande enchente de julho de 1983 acabou devastando o Vale do Itajaí e atingiu 135 cidades em Santa Catarina, deixou quase 200 mil pessoas desabrigadas e pelo menos 50 mortos. Durou 32 dias, tornando-se a mais longa e destruidora da história de Itajaí.

Os municípios mais castigados foram Rio do Sul, Blumenau e principalmente Itajaí, onde 40 mil pessoas ficaram desabrigadas. Cinco mil animais morreram afogados, a grande maioria bois e vacas, encurralados nos pastos na terrível agonia das águas que subiam, subiam e transformavam a verdejante paisagem num fatal e impiedoso rio.

O então prefeito Arnaldo Schmitt Júnior, em início de mandato, movia céus e terras em busca de ajuda dos governos estadual e federal e de quem mais pudesse aliviar o sofrimento da população. Sensivelmente abalado, não suportou ver a cidade ilhada, a água subindo cada vez mais, e chorou. Mas não esmoreceu em momento algum. Persistiu incansável trabalhando dia e noite.

O resultado foi a solidariedade de todo o Brasil. Empresas, instituições, governos e cidadãos, todos comovidos com a atroz tragédia, não relutaram em auxiliar. Campanhas humanitárias se sucederam de Norte a Sul, de Leste a Oeste. Algo surpreendente. Até outros países sensibilizaram-se e colaboraram.

Caminhões abarrotados de mantimentos, roupas, calçados, água potável e medicamentos chegavam às dezenas em Itajaí. Não lembro, em toda a minha vida, ter visto tamanha mobilização, e a minha crença de que o senso de humanidade persiste acima do egoísmo, me fez acreditar que a miséria do mundo tem solução. Pensei comigo: – que bom não é, nem tudo está perdido! Basta querer e agir, todos, unidos e em sintonia. Ilusão? Talvez. Mas voltemos aos trilhos!

Profissionalmente, eu participei de todo o desenrolar da tragédia. Era repórter do Jornal de Santa Catarina e estava trabalhando na cobertura da enchente, percorrendo várias cidades da região atingida em companhia do fotógrafo blumenauense Jandir Nascimento, destacado pelo jornal para produzir as imagens das inúmeras reportagens que realizei na cobertura jornalística da enchente.

O nosso empenho não foi em vão. Eu, ele e todos os profissionais que trabalharam para levar aos leitores as informações necessárias sobre a calamidade, fomos agraciados com o cobiçado Prêmio Esso de Jornalismo, o mais importante na área da comunicação em todo o Brasil.

Eu morava no bairro Cordeiros naquela época. Logo no início, quando soube que a água subia rapidamente naquela região da cidade, de imediato dirigi-me para lá, chegando a tempo de retirar minha esposa, grávida de 3 meses, já com a água alcançando-lhe na mesa da cozinha, onde havia subido para se abrigar.

Infelizmente, sobreveio-lhe dias depois a rubéola, doença que determinou que nossa filha, Carolina, nascesse sem o maravilhoso sentido da audição. Maldita enchente! A água ultrapassou o teto da casa. Nunca mais voltei lá e a casa foi a leilão.

Só fomos descobrir a surdez de nossa filha no aniversário de um aninho dela. Som alto, muito barulho e ela dormindo docemente em seu berço. Estranhei e a levei ao médico no dia seguinte. E veio o diagnóstico atroz. Nunca mais fui o mesmo. Certos revezes da vida marcam para sempre!

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