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Balneário Camboriú
Raul Tartarotti
Raul Tartarotti
Engenheiro Biomédico e cronista.
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Não há nada mais simples

Santo Antão (Santo Antônio) foi um famoso santo dos anacoretas, santos que foram para caverna, e passaram quase uma vida inteira no deserto, jejuando, comendo gafanhotos e mel.

Morreu aos 105 anos, foi atacado diariamente pelo demônio, que o elegeu como meta corporativa para perseguir, porque precisava desviar Antão de seu propósito de tornar-se santo.

Esse demônio se concentrou no Antônio por quase oito décadas, e quando ele rezava era carregado no ar, tema que inspirou Michelângelo a pintar a tela intitulada “Tormento de Santo Antônio”, que mostra o santo atacado por demônios.

Quando ele olhava para o crucifixo, via uma mulher nua ao invés de Cristo, quando ele decidia comer, aparecia sobre a mesa, a comida mais extraordinária possível. Antão resistiu a tudo, era um homem excepcional, praticamente um não humano.

Oscar Wilde, poeta dos anos 1870, disse que se suportamos a tentação, é porque ela não foi intensa suficiente para nos tirar de nosso eixo.

Segundo uma tradição apócrifa, o demônio desistiu de Antão, quando esse chegou aos 105 anos. E disse ao seu alvo de tormento: – você venceu, pela primeira vez na história, alguém foi mais forte do que eu.
O demônio foi embora e Antão agradeceu a Deus com uma simples oração: – muito obrigado, agora me tornei um santo.

Antão decidiu sobre sua vida e a própria morte, porque depois desse calvário só lhe restou padecer, já que o inimigo arrefeceu os ataques.

Decisão semelhante nos foi apresentada no filme “A Despedida”, onde a atriz Susan Sarandon interpretou a personagem Lily, que sofre de uma doença degenerativa, e decide colocar fim à própria existência, antes que a enfermidade a impeça de tomar qualquer rumo sozinha.

O filme não é apenas sobre o direito de escolher o momento da própria morte, mas principalmente, sobre o direito de viver com dignidade e autonomia, até o fim de seus dias. A frase que a protagonista mais repetiu no filme é: “Eu consigo”. É quase um grito para preservar sua liberdade de tomar decisões e manter sua independência, únicos substantivos que a tornam uma criatura viva.

Enfrentar a si mesmo é singular e solitário e de proporções únicas. E quase como eu é um outro, o que implica aceitar um estranho em “mim”, certo estranho já sentido e inseparável de mim – o estrangeiro dentro do próprio corpo. Sendo assim, sempre amamos estar só de um modo novo, “sem mim”, e mesmo assim, na incerteza angustiante, nos reinventar sempre.

Fernando Pessoa nos deixou um poema para pensar sobre esse viver durante: “Se depois de eu morrer, quiserem esquecer a minha biografia, não há nada mais simples. Tem só duas datas – a da minha nascença e a da minha morte. Entre uma e outra, todos os dias são meus”.

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