O mês de junho é conhecido internacionalmente como o Mês do Orgulho LGBTQIAPN+ (lésbicas, gays, bissexuais, transgêneros, queer, intersexo, assexuais, pansexuais e não-binários; o + serve para abranger a pluralidade de orientações sexuais e variações de gênero).
Em países da Europa e Estados Unidos, é comum que as tradicionais bandeiras do arco-íris dominem prédios públicos e comércios, mas no Brasil (e em Balneário Camboriú) isso ainda precisa avançar. Para lembrar a importância do Dia e do Mês (junho é o Pride Month) o Página 3 ouviu membros da comunidade e apoiadores. Acompanhe abaixo.
“Chegou a hora de revidar”
Jocineia de Jesus, uma das coordenadoras do movimento Mães pela Diversidade em Balneário Camboriú e Santa Catarina

“Vejo que o cenário em Balneário Camboriú é uma prévia das eleições de 2024. Vamos ter um cenário complicado, penso que não estamos evoluindo, não. E com eleições, o cenário tende a ficar ainda mais complicado. Algumas dessas criaturas já estão se posicionando. Teve um vereador, Anderson Santos, que falou sobre, que teve mais de uma fala homofóbica. Tem deputado que também persegue os nossos filhos diariamente. Tem muita ação, muita fala criminosa e chegou a hora de revidar, nos defender.
Falei para as mães – temos que revidar e nos defender, os nossos filhos estão muito machucados, têm cicatrizes profundas, têm mães que não têm mais filhos aqui.
Essas criaturas que perseguem diariamente a comunidade LGBT, mesmo nós pagando o salário deles [políticos] e eles não trabalham.
Temos que começar a agir, a processar essas pessoas e aqui em Balneário vamos fazer isso. Em Balneário sabemos que alguns vão atacar, vai ser um ano difícil.
É absurdo usar a tribuna para falar de caso de SP [a foto que repercutiu com a placa ‘crianças trans existem’] como se Balneário não tivesse problemas.
Por isso, vamos começar a campanha do ‘revida’ – contra discurso de ódio, preconceito, homofobia.
Não vamos aceitar mais. Não podemos esmorecer. Não é posicionamento, é discurso de ódio e isso é crime. Isso faz com que os nossos filhos sejam mortos.
O discurso deles se torna ação e nossos filhos sofrem na carne, na rua. Deu de a gente ficar vendo nossos filhos sendo agredidos, mortos.
É um caminho difícil, às vezes eles tem a máquina, a mídia, o dinheiro a favor deles, mas é uma bolha que precisamos tentar furar.
O Mês e o Dia do Orgulho são importantes para enfatizarmos com a população sobre a importância do combate a homofobia, porque não basta você não ser homofóbico, você precisa ser antihomofobia, acabar com gestos, piadinhas… para assim termos uma sociedade mais justa e igualitária. Temos orgulho, sim, porque sempre recaiu nos nossos filhos a vergonha, e temos orgulho sim… para entenderem que não tem nada de errado com nossos filhos e temos muito orgulho de ter filhos LGBT e que não tem problema nenhum, que nunca foram uma vergonha, que tem que se orgulhar de quem são, com todas suas particularidades e características.
Eu não sei se nessa minha existência vou ver o fim da homofobia, principalmente aqui no Sul, mas a Constituição é muito clara sobre direitos, apesar de ser muito difícil na prática e ainda ser difícil ocupar lugares.
Sonho com isso, é o mundo ideal não haver exclusão e nem apontamentos pelo gênero, mas também pode-se levar bastante tempo ainda, infelizmente.
Em Balneário infelizmente não teve nada para lembrar o Mês do Orgulho, mas santo de casa vai fazer milagre, sim, e em 2024 faremos uma ação bem abrangente.
Acabamos sendo omissos, acabamos recuando, nos comprometemos com municípios vizinhos (em Navegantes houve ações na Câmara de Vereadores da cidade), foram muitas demandas, que deixamos nossa cidade ‘de fora’, mas até para mostrar que cidade é de todos, temos todos os direitos de ocupar qualquer espaço dessa cidade, porque não tem a ver com credo, crença ou religião, temos direito de ocupar sim, com pessoas torcendo o nariz ou não.
Por isso, ano que vem vai ter uma festa bem legal, já decidimos isso. Ninguém mais vai nos fazer voltar para o armário.
Já aproveito para contar que vai ter Parada da Diversidade no dia 5 de novembro em Balneário Camboriú”.
“Existimos e resistimos”
Gustavo Ribeiro é um dos organizadores da Parada da Diversidade de Balneário e filho de Jucineia

“Ainda é extremamente importante termos essas datas para comemorar e relembrar o que passamos, brigas que precisamos travar, vitórias que tivemos. Já avançamos, mas precisamos avançar mais na garantia de direitos, ainda mais em Balneário, que é tão conservadora.
Precisamos avançar bastante na parte de saúde ainda, porque muitas pessoas LGBT não conseguem acessar os serviços de saúde, e quando conseguem, não se sentem seguras, porque na maioria dos casos sofrem preconceito, principalmente pessoas trans que buscam atendimento.
A data é extremamente necessária para mostrar que existimos e resistimos. Ela tem como objetivo celebrar o orgulho de sermos quem somos, das conquistas que já tivemos, mas também para relembrar o que ainda temos muito para avançar, para trabalhar essas pautas e difundir informações.
Eu, em conjunto com as Mães Pela Diversidade e outros coletivos, temos várias frentes de ações. Fazemos participações em eventos, palestras, mas também temos os grupos de acolhimento e as redes de apoio, onde ajudamos com cestas básicas.
A Parada deste ano já está sendo organizada com todo o cuidado necessário, sempre em diálogo com o município para que seja feito tudo dentro da legalidade, entregando um evento tão incrível e lindo quanto o de 2022″.
“Se colocar no lugar do próximo, antes de querer criticar ou ter preconceito”
Myrella Rodrigues Linhares, voluntária na causa animal através da ONG Bravos Amigos, é mulher trans e traz consigo a luta pelo espaço e respeito na sociedade

“Eu vim de Santa Maria/RS, mas já moro em Balneário Camboriú há 14 anos. Desde Santa Maria eu fui muito ligada à causa animal, envolvida com isso, e aqui em Balneário eu conheci o meu companheiro, que também é da causa animal, e foi através dele que eu conheci as ONGs que ajudam animais e sou atuante nisso.
Sobre o Mês do Orgulho, eu vejo que é um mês que deveria ser importante ter uma programação maior, com eventos voltados para este nosso Mês da Diversidade porque o que não falta é a população LGBTQIAPN+, mas faltam pessoas que direcionem e pensem em eventos.
Muitas vezes as pessoas nem sabem da existência do outro, que tem alguém ali que está necessitando da sua ajuda, ou uma palavra de apoio… seria bem importante se todos fossem engajados nisso.
Acredito que, em relação ao que precisa avançar em prol da comunidade, é exatamente isso – que há muitas pessoas que podem estar precisando de apoio e não necessariamente financeiro, é apoio emocional. Seria bacana se pudessem fazer um grupo de apoio nesse sentido.
Eu acho que a gente tem que se colocar no lugar do próximo, antes de querer criticar ou ter preconceito, e o mais importante é que cada um se ame, se goste – a pessoa sendo educada, não ser desrespeitosa com a gente é o que queremos; a gente tem a obrigação de respeitar a todos, independente da sua orientação sexual ou outra coisa do gênero.”
Os dois vereadores de Balneário Camboriú citados pela comunidade LGBTQIAPN+ que apoiam e defendem suas causas foram Juliana Pavan e Eduardo Zanatta, que também emitiram suas opiniões sobre o Mês do Orgulho, reproduzidas abaixo:
“Quem somos nós para selecionar esse ou aquele?”
Juliana Pavan

“Precisamos combater o mal da discriminação, em todas as suas esferas.
Amor e respeito são as principais ferramentas de mudança. Eu quando entrei para a vida pública, entrei porque gosto de gente, gosto de ouvir as pessoas, gosto de me colocar à disposição das pessoas e é de todas as pessoas.
Quem somos nós para selecionar esse ou aquele? Infelizmente, o Brasil é recordista no ranking de países que mais matam LGBTI+ no mundo. Respeitar as escolhas e o modo de vida de cada um é que faz do mundo um lugar melhor”.
“Uma coisa é defender pautas conservadoras, outra coisa é manifestar homofobia”
Eduardo Zanatta

“O dia 28 de junho (Dia do Orgulho) e o mês de junho são muito importantes porque marcam a luta pelos direitos de parte da população, para celebrar diversidade e inclusão. Balneário e o Legislativo não podem ficar de fora disso.
Falando de Balneário – me preocupo muito quanto à parada da Diversidade, que vem sendo construída há 8 edições e precisa acontecer por determinação judicial, porque articulações políticas tentam inviabilizar.
Não levam em consideração o turismo e a comunidade – a Parada 2022 colocou 15 mil pessoas na Avenida Atlântica, pessoas de outras cidades e estados que ficaram hospedados, consumiram… e é direito da comunidade estar na rua e ainda gira a economia da cidade.
Sobre o vereador que se pronunciou de forma homofóbica [Anderson Santos] vale lembrar que ninguém está acima da lei, homofobia é crime no Brasil, opinião e crime são coisas diferentes – um vereador não está acima da lei, independente de sua formação política ou religiosa, tem que respeitar a todos.
Hoje temos uma Câmara muito conservadora, mas uma coisa é defender pautas conservadoras, outra coisa é manifestar homofobia e isso temos que enfrentar.
Enquanto Poder Legislativo, não podemos permitir isso. Tenho feito inclusive construção dessa pauta com movimentos e coletivos da cidade, estamos com minuta que institui a Semana da Diversidade de Balneário Camboriú – ainda não protocolei, mas pretendo fazer em breve, para que coloquem a Parada da Diversidade no calendário oficial do município. Não tenho dúvida que Balneário tem característica para ter a maior Parada do sul, mesmo não sendo uma das maiores cidades em população, temos condição para fazer Parada maior que Floripa e até Porto Alegre.
Nossa cidade se diz tão à frente, se coloca como referência em diversas pautas e setores, mas ao mesmo tempo tem postura provinciana quando é para discutir promoção de diversidade, igualdade e inclusão dos diversos setores da nossa sociedade. Balneário tem essa contradição de se colocar como cidade do mundo, mas que muitas vezes tem postura pequena e provinciana e é isso que precisamos debater na Câmara, é o que tenho feito desde que assumi meu mandato. Ano que vem tem eleição e acredito que temos que seguir nessa linha para ampliar a bancada na Câmara para que façamos a defesa das políticas da diversidade. Acredito que a Câmara precisa mostrar que ela não é homofóbica”.