As atuais fronteiras entre países da América do Sul costumam camuflar uma realidade perdida no tempo: nosso continente foi, em tempos pré-colombianos, muito mais densamente ocupado do que imaginamos. Regiões hoje tomadas pela floresta foramhabitados por estados, cacicados e povoados com densa vida comercial e social. Recentes achados arqueológicos indicam que a região de Riberalta – no norte da Bolívia – foi um desses locais.
Alguns anos atrás, uma equipe da Universidade de Helsinki (Finlândia), liderados pela arqueóloga Sanna Saunaluoma investigou a região realizando um levantamento geral de sítios arqueológicos nas proximidades de Riberalta. Foram encontrados ao menos 10 locais de interesse – El Círculo, Dos Palmas, Tumichucua, Candelaria, entre outros – que comprovam o antigo povoamento daquela região. Os resultados preliminares foram publicados no artigo “Construcciones de Tierra PrecolombinosenlaregiónRiberalteña de laAmazonía boliviana” (2010).
Recentemente, ganhou destaque um dos sítios da comunidade de LasPiedras, conhecido popularmente como La Fortaleza Victoria. Trata-se de um enorme muro – hoje bastante deteriorado – que circunda um espaço de 10 ha, contendo outras construções em seu interior. O conjunto foi identificado por terra e também pela técnica LIDAR, que consegue detectar formações não naturais abaixo da camada de vegetação, muito utilizada para a exploração na Mesoamérica. O muro ocupa a confluência dos rios Madre de Dios e Beni; e em escavações de prospecção, revelou cerâmicas de boa qualidade, sofisticadas, datadas entre 700 e 400 anos passados.
Embora a cerâmica pareça distinta de outros povos regionais – ou seja, um estilo original – muitos se perguntam ainda hoje se as ruinas não fariam parte de um posto avançado da civilização Inca, assim como existe em Samaipata, na mesma Bolívia, nas proximidades da atual Santa Cruz de laSierra. Em 2004, o governo de Carlos Mesa Gisbert baixou a Lei 651, na qual a região de La Piedra e suas ruinas foram declaradas Patrimônio Histórico Cultural. A mesma lei incumbia o Governo boliviano – através de seu Ministério de Educação – de investir na preservação do lugar, coisa que nunca foi feita.
Os sítios arqueológicos apontados por Sanna Saunaluoma até o momento, foram pouco pesquisados e trazem mais indagações do que resultados. É possível que se trate de comunidades subjugadas pelos Incas? Ou foram estados autônomos vinculados aos povos da floresta amazônica? Estiveram eles ligados ao gigantesco sistema de caminhos pré-colombianos, que comercializavam seus produtos através dos diferentes pisos ecológicos? Seja como for, apenas o investimento em pesquisas arqueológicas será capaz de responder estas e outras questões sobre essa misteriosa região. Dalton DelfiniMaziero é historiador, escritor, especialista em arqueologia e explorador. Pesquisador dos povos pré-colombianos e história da pirataria marítima. Visite a Página do Escritor (https://clubedeautores.com.br/livros/autores/dalton-delfini-maziero)