Arqueólogos subaquáticos portugueses vem se esforçando em realizar um levantamento preciso da quantidade de naufrágios daquele país em suas águas territoriais. Este mapeamento tem como prioridade, os navios naufragados no ano de 1500 d.C. em diante, momento no qual eles passam a ser registrados e documentados oficialmente pelo governo português que na época vivia sua expansão ultramarina.
Alexandre Monteiro, mergulhador e arqueólogo português, estuda a questão dos naufrágios a mais de 25 anos. Ao longo deste período, mapeou a localização de 8.620 naufrágios portugueses em águas territoriais: costa de Portugal, Açores e ilha Madeira. Só na costa continental são mais de 7 mil naufrágios. Destes, ao menos 250 navios possuem imensos tesouros em seus porões. Muitos deles carregavam fortunas em metais preciosos com o objetivo de financiar guerras e conflitos armados na Europa. Segundo Monteiro, “esses navios não são apenas cofres submersos; eles são testemunhas da expansão marítima e dos grandes acontecimentos que moldaram a história”, afirma o pesquisador do Instituto História, Territórios e Comunidades da Universidade Nova de Lisboa.
Alguns casos marcantes de importantes naufrágios encontram ecos em nomes como o de Nossa Senhora da Luz, que soçobrou nas proximidades da ilha de Faial em 1615. O naufrágio consumiu quatro anos de pesquisa em arquivos históricos para a identificação de seu ponto exato de sepultamento. Mesmo assim ele continua lá, aguardando verba para seu estudo. Monteiro menciona dois casos emblemáticos e recentes de descobertas subaquáticas que ainda não foram devidamente exploradas. O primeiro deles está no Nossa Senhora do Rosário, um galeão espanhol que encontrou seu destino em 1589, e cujos porões estarão 22 toneladas de ouro e prata. Este naufrágio espanhol encontra-se próximo a restinga arenosa de Troia, na freguesia de Carvalhal, no Concelho de Grândola (Portugal), e foi devidamente divulgado no artigo “O naufrágio da Nau Nuestra Señora del Rosário – Troia, 1589” (Revista Al-Madan, 17 de junho de 2012).
Outro caso emblemático foi o do galeão São Jorge, pertencente a expedição de Vasco da Gama e que soçobrou a mais de 500 anos em Malindi, no litoral do Quênia. Monteiro explica que vestígios deste naufrágio foram identificados em 2007 por Caesar Bita, um pesquisador ucraniano. A investigação e escavação do São Jorge é de profunda importância para a história portuguesa, pois seria um dos mais antigos já estudados, com potencial para a compreensão de sua construção, uso de materiais e estratégia logística da expansão ultramarina. Mas assim como o Nossa Senhora do Rosário, o São Jorge aguarda investimento para um efetivo projeto de pesquisa.
A preocupação que paira sobre essa infinidade de ricos naufrágios não recai apenas na depredação causada de forma indiscriminada por caçadores de tesouros. Recai também nas necessidades modernas de ampliação de infraestrutura portuária e construção de oleodutos que podem destruir esses sítios arqueológicos submersos, fazendo perder uma rica e inigualável informação histórica que jaz debaixo de bancos de areias e corais.
Monteiro e outros arqueólogos pressionam o governo português a preservar esse patrimônio subaquático, transformando algumas áreas em santuários marinhos que poderiam aguardar assim, de modo um pouco mais seguro, a oportunidade de um estudo de resgate de seus tesouros.
Dalton Delfini Maziero é historiador, escritor, especialista em arqueologia e editor da revista Gilgamesh. Pesquisador dos povos pré-colombianos e história da pirataria marítima. Visite a página: (https://www.revistagilgamesh.com.br)