RIO DE JANEIRO, RJ (FOLHAPRESS) – A bandeira tarifária amarela deve aliviar as contas de luz no Brasil em novembro, mas não afasta o risco de estouro da meta de inflação em 2024, dizem economistas.
A possibilidade de o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo) fechar o ano com alta acima de 4,5% -o teto da meta- se mantém devido a uma combinação de fatores.
A carestia de alimentos como as carnes, a pressão do dólar mais alto e a eventual aplicação de uma bandeira tarifária mais cara em dezembro fazem parte dessa lista.
“Está difícil fechar o ano dentro da meta”, afirma o economista-chefe da consultoria MB Associados, Sergio Vale, que espera IPCA de 4,7% no acumulado do ano.
O centro da meta de inflação é de 3%, e a tolerância é de 1,5 ponto percentual para mais ou para menos.
Isso significa que o objetivo será cumprido pelo BC (Banco Central) caso o IPCA fique no intervalo de 1,5% (piso) a 4,5% (teto) no acumulado dos 12 meses até dezembro.
Vale diz que o preço das carnes é uma das ameaças à inflação na reta final de 2024, pois o produto passou a subir após período de trégua no Brasil. Isso, segundo ele, deve contribuir para uma alta maior do que a esperada inicialmente para os alimentos consumidos em casa.
Na visão do economista, o cenário para a inflação, com possível estouro da meta neste ano, traz desafios para o BC na condução da política monetária em 2025.
“Temos uma economia crescendo com intensidade, câmbio pressionado, seca que afetou energia e, agora, alta das carnes. São pressões grandes.”
A economista Juliana Inhasz, professora do Insper, também vê possibilidade de o IPCA fechar 2024 acima do teto. Apesar do alívio com a bandeira amarela na conta de luz, um dos pontos de atenção que permanecem no radar é o possível impacto da estiagem dos últimos meses sobre os alimentos, conforme a professora.
“Se tudo der muito certo, se chover bastante onde tem de chover, inclusive melhorando a agricultura, pode ser que a gente consiga ficar dentro do limite superior estabelecido pela meta [4,5%]. A perspectiva hoje ainda é que a gente fique muito próximo desse limite ou estoure a meta.”
Na quinta (24), economistas demonstraram preocupação com o cenário de inflação no país, após o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) divulgar os dados do IPCA-15 (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo – 15).
O índice, que sinaliza uma tendência para os preços no IPCA, acelerou a 0,54% em outubro, acima da mediana das projeções. Com o resultado, passou a acumular alta de 4,47% em 12 meses.
Por ora, Andréa Angelo, estrategista de inflação da Warren Investimentos, projeta IPCA de 4,75% para o ano. Segundo ela, a estimativa até pode subir caso dezembro tenha bandeira vermelha patamar 1, que pressiona as contas de luz na comparação com a amarela, confirmada para novembro.
A definição das bandeiras depende das condições de chuva no Brasil.
“O risco do IPCA neste ano é ainda mais próximo de 5%. Ainda é um desafio grande, não só pela hidrologia, que está se mostrando melhor, mas pelos desafios com preços de alimentação, principalmente de bovinos, e câmbio”, afirma.
Na mediana, a previsão do mercado financeiro para a inflação de 2024 subiu a 4,5%, justamente o teto da meta, conforme a edição do boletim Focus divulgada pelo BC na segunda (21), antes do IPCA-15.
O economista André Braz, do FGV Ibre (Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas), afirma que a bandeira amarela alivia “bastante” o cenário para o IPCA, embora o índice caminhe para fechar o ano acima de 4%.
Braz prevê alta entre 4,2% e 4,5%, dentro do teto. De acordo com ele, a desvalorização do real ante o dólar e o impacto do mercado de trabalho aquecido sobre a demanda por bens e serviços são fatores de pressão que continuam no cenário.
“O desemprego está baixo, está abaixo de 7%. A massa salarial está crescendo, e isso tudo vira consumo. O juro alto não vai impedir que as pessoas consumam”, afirma.
“Elas vão gastar, isso vai aquecer a atividade e vai fazer com que os preços também fiquem maiores. A gente está vendo uma persistência maior da inflação em serviços”, completa.
Quando a inflação fica fora do teto da meta, o presidente do BC precisa escrever uma carta explicando os motivos.
Desde a criação do sistema de metas, em 1999, já foram escritas sete cartas. Duas foram de autoria do atual presidente do BC, Roberto Campos Neto.
Ele será substituído no ano que vem por Gabriel Galípolo, indicado pelo presidente Lula (PT). O IPCA fechado de 2024 será divulgado pelo IBGE em 10 de janeiro de 2025.
O ano de 2024 será o último do sistema de metas com base no chamado ano-calendário, de janeiro a dezembro.
Em 2025, o BC passará a perseguir a meta de forma contínua, sem se vincular ao ano-calendário.
No novo modelo, a medida de referência será considerada descumprida quando a variação dos preços em 12 meses ficar por seis meses seguidos fora do intervalo de tolerância.