- Publicidade -
26 C
Balneário Camboriú

Em busca de um modelo de vida pública!

- publicidade -

Leia também

Por Robson Ramos

É possível encontrar alguém que seja um modelo de vida pública?

- Continue lendo após a publicidade -

William Wilberforce (1759-1833) é um exemplo de político que deixou um legado para a posteridade. Tendo iniciado a vida pública em 1780, com 21 anos de idade e com o apoio da Igreja Anglicana, liderou uma campanha no Parlamento Inglês contra o comércio de escravos, do qual a Inglaterra detinha o monopólio.

Durante décadas lutou pela proibição da escravidão. Como resultado da sua dedicação, o Ato Contra o Comércio de Escravos foi finalmente aprovado em 1807, colocando um ponto final naquele capítulo na história da Inglaterra e em todas as regiões do mundo que faziam parte do Império Britânico.

Felizmente não existe mais um sistema escravagista institucionalizado naqueles moldes, e daquele que marcou a história do Brasil até 1888, que chegou ao fim graças à Lei Áurea, e que foi também o pivô da Guerra Civil nos Estados Unidos, que só teve fim em 1865. 

- Continue lendo após a publicidade -

Porém o mundo de hoje, supostamente mais civilizado, abriga males tão nefastos quanto os de alguns séculos atrás. Um deles é justamente uma versão daquele combatido por Wilberforce: o tráfico de pessoas.  Essa é uma das atividades ilegais que mais se expandiu no século XXI. “Segundo estudos feitos pela OMT (Organização Mundial do Trabalho) o tráfico humano movimenta cerca de 32 bilhões de dólares por ano, em que 79% das vítimas são destinadas à prostituição, em seguida ao comércio de órgãos e à exploração de trabalho escravo em latifúndios, na pecuária, oficinas de costura e na construção civil.” (1)

Mesmo sendo uma atividade das mais rentáveis, junto com o tráfico de drogas e de armas, vitimizando especialmente mulheres, crianças e adolescentes, essa realidade parece não interessar aos políticos e autoridades nos dias de hoje. Por que será?

A resposta mais evidente a essa pergunta, é a que ouviríamos de qualquer pessoa com um mínimo de conhecimento: “isso não dá voto”. 

As regiões do mundo mais vulneráveis ao tráfico de pessoas e à exploração sexual, são marcadas notadamente pela desigualdade econômica. Em especial países que não oferecem perspectivas de futuro para os jovens. Aliás, não deve nos surpreender o fato do Sul do Brasil fazer parte das rotas usadas para essa terrível prática (2).

Outra razão menos óbvia que ajuda a explicar o desinteresse dos nossos políticos por questões dessa natureza, está relacionada ao fato de fazermos parte de “uma sociedade líquida” – conceito criado pelo sociólogo polonês, Zygmunt Bauman – marcada pelo individualismo, a fluidez e a fragilidade das relações. Nesse contexto, os mais privilegiados e bem instalados no stablishment sócio-econômico – incluindo políticos e governantes – tendem a, paradoxalmente, fechar os olhos para questões mais complexas, que impliquem um compromisso maior e deem mais trabalho.

A palavra de ordem nessa sociedade líquida, é “cada um por si e Deus por todos”. Lealdades outrora assumidas são descartadas sem o menor constrangimento.  Basta que haja uma vantagem a ser auferida. Em outras épocas os compromissos entre pessoas honradas eram firmados “no-fio-de-bigode”. Deixar de honrar a palavra significava perder a honra e carregar o peso da vergonha pelo resto da vida. 

Isso é facilitado pela falta de compromisso de eleitores que não cobram qualquer tipo de prestação de contas dos seus candidatos. Raramente alguém se interessa em saber se os seus candidatos eleitos a vereador e a prefeito, por exemplo, estão fazendo um trabalho digno e de valor perante a municipalidade.

Via de regra instituições eclesiásticas, ou até mesmo grupos de bairro, que elegem um determinado candidato seguindo o comando do líder, sem o menor entendimento quanto aos reflexos éticos e econômicos decorrentes da presença de alguém com uma atuação irrelevante. Além de ser um coadjuvante que pouca diferença faz, o político eleito nas condições acima acaba sendo motivo de chacota, trazendo descrédito para a classe política e para a igreja que ele representa e que lhe serve de base eleitoral. 

Apesar da incoerência, líderes religiosos, eleitores com o perfil de “maria-vai-com-as-outras” e políticos, ligados entre si, seguem a vida como se nada tivessem a ver com esse ciclo vicioso. Mas, todos sabem que alguém – e não é apenas uma pessoa – sai ganhando alguma coisa nesse jogo.

Na prática, verifica-se que o ato de votar num candidato apresentado pelo líder da igreja está desvinculado de um compromisso ético que deveria se estabelecer entre o eleitor que cede seu voto sem saber quais acordos podem estar por trás dessas ligações.

O incidente ocorrido no ambiente de uma igreja em nossa cidade durante a campanha eleitoral do ano passado, serve de ilustração. Conforme relatado ao Blog do Pepa, por um candidato a vereador que alegou ter sofrido constrangimento dentro da igreja da qual é frequentador. Ele diz (2): 

 “Outro dia a candidata a vereadora apoiada pela igreja foi convidada para proferir uma palestra, então decidi pedir também uma oportunidade ao bispo. Ele respondeu negativamente e esclareceu que a igreja apoia uma única candidata. Isso é revoltante. Afinal, todos os frequentadores devem ter as mesmas condições ao invés de sofrer constrangimentos, provocações e humilhação.”

Ainda que esse tipo de ocorrência tenha se tornado lugar comum em época de eleição, não podemos deixar de chamar atenção para a responsabilidade e papel que os líderes religiosos têm nisso tudo. Afinal, eles também desempenham uma função pública importante.

É digno de nota o que está acontecendo com um vereador em Balneário Camboriú, apontado como traidor pelo voto contrário à orientação do seu Partido. Será que seu pastor e seus eleitores estão refletindo sobre a repercussão e desdobramentos desse imbróglio? No momento em que escrevo essa matéria está sendo noticiado que a sua expulsão do Partido deverá ser decidida num prazo de 8 dias. (3)

Deveriam os eleitores e líderes eclesiásticos, estar atentos ao que está acontecendo, ou será que estão seguindo sua vida de forma desinteressada? Seria salutar se os eleitores e pastores ligados a esse vereador se pronunciassem a respeito, ao invés de ficarem em silêncio.

Qualquer situação que implique uma exposição e compromisso com uma causa maior leva essas mesmas pessoas a tirar-o-corpo fora jogando no ralo a ética e compromissos assumidos. Isso, por si só, representa uma incoerência, afinal uma comunidade cristã deveria pautar sua atuação e influência na sociedade pelas palavras do Mestre, que em seu famoso Sermão da Montanha em Mateus 5:13, disse:

“Vocês são o sal da terra. Mas se o sal perder o seu sabor, como restaurá-lo? Não servirá para nada, exceto para ser jogado fora e pisado pelos homens”.

O legado deixado por William Wilberforce, parlamentar britânico cuja contribuição foi abordada na abertura desta matéria, nos leva a refletir sobre a qualidade das figuras públicas que desejamos ter, sejam elas políticas, governamentais, religiosas e da sociedade civil organizada, dentre outras. Homens e mulheres com caráter, ética e compromisso acima de tudo com o bem-comum, e com causas que tenham relevância, seja na esfera municipal, estadual ou federal.

Esse é o modelo de vida pública que buscamos.

Notas:

Robson Ramos é advogado, consultor na área de Compliance e Programas de Integridade. Membro da Academia de Letras de Balneário Camboriú e autor de 4 livros. Seu último livro – Cidadania Compartilhada, aborda temas relacionados com Compliance, Medidas Anticorrupção, Violência Doméstica e Direitos da Pessoa Idosa

- Publicidade -
- Publicidade -
- publicidade -
- Publicidade -
- Publicidade -
- Publicidade -
- Publicidade -