Memória & Histórias 30 anos JP3
(Equipe de funcionários e colaboradores)
Durante esses 30 anos de jornalismo do Página3, passaram pela redação dezenas de funcionários e colaboradores, esse relato é de um deles.
Comecei a aprender o que era jornalismo impresso fora dos bancos da faculdade no Jornal Página 3. Isso foi em 2004, se não me engano. Sim, faz tempo. Na época o jornal era semanal, saía todas às sextas-feiras, e cada edição trazia uma matéria especial, com duas páginas do tamanho standard. Ô saudade!
A Especial de Natal
Uma das minhas primeiras “especiais” foi relativa ao Natal. Eram mais de 30 mil caracteres sobre a comemoração típica, escritos por alguém que estava, literalmente, no início da carreira e nem havia deixado a universidade ainda. Eu tinha apenas alguns dias de Página 3 e mal sabia direito qual o fluxo da redação..
Bem, essa introdução toda é pra tentar justificar o fato de a matéria ter ficado uma bosta.
Na época, ao finalizar os textos, costumávamos salvá-los no drive em rede para avaliação dos editores. E a minha matéria, adivinhem, caiu justamente na fiscalização do Waldemar, o Marzinho.
Sujeito truculento, ele chamava a minha atenção desde o primeiro dia. Não apenas por ser o editor chefe, mas porque era absurdamente destemido e franco em suas abordagens com os entrevistados.
“Ah tá, e tu queres que eu acredite que isso é verdade?” – foi uma das primeiras frases que ouvi ele falar no meio de uma ligação com um secretário do governo municipal da época.
Achei o máximo!
Pois bem … ao analisar minha reportagem a respeito das celebrações natalinas não deu outra. Waldemar se virou da cadeira e perguntou em alto e bom som pra redação inteira ouvir (até a Suzi do Financeiro deu um pulo na cadeira):
“Quem escreveu esta merda desta matéria?”
Quase sem voz e com o pingo de coragem que me restava, respondi bem baixinho:
Eu.
O diálogo a seguir foi bruto, mas de uma franqueza ímpar:
“Guria, vou te dar um dicionário de sinônimos e antônimos. Escrevestes umas 60 vezes a palavra “Natal”, nesta merda. Pega esse texto de volta e conserta, porque ficou uma bosta.
E levantou da cadeira pra ir fumar um cigarro.
Completamente constrangida, contive as lágrimas, pelo menos até chegar ao banheiro. Lavei o rosto e voltei decidida: além de deixar a reportagem sobre as festividades religiosas e comemorativas de dezembro palatável aos leitores, iria dobrar aquele turrão. Ele ainda ia curtir o meu texto. Ah se ia…
Logo depois de voltar pro meu lugar, a Lisi, uma das pessoas mais doces e acolhedoras que já tive a oportunidade de conhecer, veio em minha direção com um chocolatinho e um sussurro:
Você consegue, Laine.
(Meu nome é estranho, eu sei, mas o Página 3 é o único lugar do mundo inteiro onde as pessoas me chamam de Laine.. hehehehe)
Entreguei a matéria sobre as comemorações do nascimento de Jesus, que passou pelo crivo do Waldemar e foi pra edição especial do final de dezembro.
Maus tratos

Algum tempo depois, saí a campo para investigar uma denúncia que havíamos recebido sobre maus tratos contra animais em um circo que havia chegado na cidade.
Pulei a cerca do terreno, invadi o acampamento da atração e fotografei os bichinhos amarrados em cordas curtas, mal alimentados e maltratados. Só depois fui ouvir o dono da atração que, inutilmente, tentou negar em palavras o que eu havia registrado em imagens. Pra piorar a situação, atrações com animais haviam sido proibidas em Balneário Camboriú. Prato cheio pra reportagem!
No fechamento da edição semanal, o dono do circo ligou pro editor chefe do jornal e descascou. Disse que iria processar a jornalista que invadiu a tenda, acabar com o jornal e o escambau.
Acompanhei a ligação apreensiva e pensei: “pronto, agora o Marzinho me mata”.
Ao desligar o telefone, ele afastou a cadeira da bancada e soltou:
Agora sim, hein guria? Jornalismo é isso mesmo. Bom trabalho!
Finalmente, eu havia me redimido daquela matéria natalina infeliz e seguia aprendendo todos os dias a fazer jornalismo.
Obrigada, Página 3!

Nota da Redação: Depois de trabalhar como repórter no Página3, Laine fez assessorias e atualmente é produtora e apresentadora do Expresso da Manhã, na Trans99fm, e produtora audiosivusal.