Por Robson Ramos
Depois de ter ficado por quatro horas à beira da estrada tive que reconhecer, mais uma vez, que certas coisas na vida não funcionam do jeito que eu quero ou com base apenas naquilo que eu desejo ou espero.
Há alguns anos, arrumei uma nova companheira de estrada. Embora a conhecesse pouco, foi amor à primeira vista. Aprendi o básico sobre ela, aquilo que “eu” julgava importante e suficiente. Mera presunção.
Pegamos a estrada juntos, minha companheira, cujo nome não sabia pronunciar e eu. Tudo estava indo às mil maravilhas: eu gostando dela e ela de mim. Casamento perfeito. Manhã ensolarada, vento batendo no rosto. Orgulhoso e feliz, eu curtia aquele momento de prazer. Sonho antigo concretizando-se. E ela, deslizando suavemente com seu brilho prateado, levando-me sem reclamar de nada. O vento e o sol também lhe faziam bem. De repente ela começou a falhar. E foi falhando, falhando, falhando até que precisei encostar.
Chequei tudo na expectativa de encontrar algum cabo solto ou qualquer coisa assim. Olhei o que achava importante e tudo parecia em ordem. Além disso, o combustível era de procedência confiável. Não podia ser sujeira no carburador. Com isso descartei qualquer problema nessa área.
O mostrador de combustível digital indicava dois quadradinhos dando a entender que o problema não podia ser falta de combustível. Quando o tanque estava cheio seis quadradinhos daqueles ficavam acesos. Portanto, pensei, dois quadradinhos representam ainda praticamente a terça parte do tanque, o que é mais do que suficiente para rodar bastante ainda.
Finalmente o “socorro” chegou. Um rapaz franzino, bem atencioso e educado, chegou de moto. Depois de fazer algumas perguntas girou a chave, deu a partida, e nada. E aí ele me fez aquela perguntinha chave, da qual nunca vou me esquecer: “você virou a torneirinha?”
Ele deu um sorriso maroto, ao ouvir minha resposta em forma de pergunta: “Que torneirinha?” Em menos de dois minutos meu problema estava resolvido. Tudo o que ele fez foi virar a “torneirinha” e dar a partida. E a minha companheira voltou a funcionar.
Antes de ir embora explicou-me a função da tal “torneirinha” – coisa que, ninguém havia me explicado antes. “Você pode rodar ainda uns 40 km com o que tem na reserva”, disse-me ele. “Mas pare no próximo posto e abasteça. Lembre-se de que quando o marcador do combustível marcar esses dois quadradinhos você precisa virar a torneirinha e usar o combustível da reserva. Isso só vai funcionar se você virar a torneirinha. Não se esqueça!”
Lá fomos nós de novo, eu e minha companheira. Aprendi a lição. Pelo menos acho que aprendi: na vida sempre estamos começando coisas novas e andando por novos caminhos. Em toda nova situação há uma dessas “torneirinhas”. Por isso, aprendemos muito e nos pouparemos de algumas dores de cabeça se criarmos o hábito de fazer perguntas para quem tem mais experiência.
Se desconhecer o funcionamento de uma engrenagem mecânica pôde me fazer perder quatro horas na estrada, imagine o estrago que o desconhecimento de uma ‘torneirinha’ dessas não fará quando o assunto for uma tomada de decisão importante: uma negociação ou o início de uma nova etapa na vida pessoal ou profissional?
Não convém ser presunçoso e achar que já sabemos tudo, ou que estamos no controle de todas as coisas e situações ao nosso redor. Não é suficiente apenas desejar que tudo dê certo e esperar que o mundo funcione de acordo com a nossa vontade.
Depois da lição aprendida, minha companheira e eu não tivemos mais problemas. Continuamos nos dando muito bem. E eu até já aprendi a pronunciar o seu nome!
Robson Ramos, advogado, atuante na mediação de conflitos familiares e consultor em Implantação de Programas de Integridade e Compliance. Atuou por mais de 20 anos em multinacionais americanas, nas áreas de gestão de pessoas e desenvolvimento estratégico. Membro da Academia de Letras de Balneário Camboriú. Seu quarto livro – Cidadania Compartilhada – está com lançamento previsto para Outubro.
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